
Até o convite formal para a viagem, enviado pelo correio e
por e-mail e que ela deveria confirmar, não
chegou. "Mas, ela era muito teimosa e disse que, aonde houvesse missão,
iria". Há cerca de cinco anos, no dia 12 de janeiro de 2010, Zilda Arns
morreu enquanto discursava, vítima do terremoto que atingiu o país.
Não foi a primeira vez que a médica abriu mão dos próprios
interesses para se colocar a disposição dos demais. Decorridos cinco anos de
sua morte, prazo mínimo para que seja aberto processo de beatificação, milhares
de fiéis pedem que o processo, que é um passo para que ela se torne santa, seja
aberto. As moções de apoio somam 260 mil assinaturas.
A médica sanitarista e pediatra Zilda Arns Neumann é reconhecida
nacional e internacionalmente por ter fundado a Pastoral da Criança e
posteriormente a Pastoral da Pessoa Idosa. Ela desenvolveu um trabalho de
prevenção com famílias carentes e ensinando muitas mães a preparar o soro
caseiro. Por meio desta e de outras ações, ela ajudou a combater a desnutrição
no Brasil.
Para dom Aldo, o objetivo não é apenas reconhecê-la como santa,
"fazer uma estátua e colocar no altar". "É pedir que se comece o
reconhecimento das virtudes que tinha. Ela salvou milhares de vidas, não só
combatendo a mortalidade infantil, mas trabalhando na prevenção de doenças que
são curáveis, passando saberes a gestantes e mães muito pobres", diz.
A entrega oficial da moção que solicita a abertura do processo de
beatificação de Zilda ocorreu no dia 10 de janeiro, durante celebração no
Estádio Arena da Baixada Clube Atlético Paranaense, à Arquidiocese de Curitiba,
que deverá conduzir o processo. Uma equipe que contará com um postulador e um
historiador, entre outros integrantes, deverá reunir fatos que comprovem as
virtudes heroicas de Zilda. Posteriormente, o trabalho será remetido ao
Vaticano, que dará o veredito para a beatificação.
Para tornar-se beata, é necessária a comprovação de um milagre por
sua intercessão. Após a beatificação, segue o processo de canonização, que
reconhece a pessoa como santa. Não há prazo para que isso ocorra. Canonizada,
Zilda se juntará ao Santo Antônio de Sant'Ana Galvão, o primeiro nascido
no Brasil.
"Muitos que nos encontravam diziam que rezavam e pediam muito
para ela. O mais curioso é que não pediam coisas para si. As pesssoas pediam
pela comunidade, pelas crianças, pela vida dos vizinhos. Isso que mais me chamou
atenção", disse o coordenador nacional adjunto da Pastoral da Criança,
Nelson Arns Neumann, filho de Zilda, sobre os depoimentos colhidos na
celebração do dia 10.
Médico, Neumann seguiu os passos da mãe. Sobre a profissão diz:
"O comentário dela em família era que a opção deveria ser pelo que
trouxesse satisfação pessoal e condições de sustentar a família. Mas que seria
incompleta se não servisse a comunidade". Uma lembrança que guarda de
Zilda é dos atendimentos que ela fazia quando a família ia para a chácara no
final de semana. "Muitas pessoas procuravam [minha mãe] no sábado e
domingo com os filhos doentes. Depois de atendidos, perguntavam qual era o
pagamento. Ela respondia que deveria rezar três Ave Marias e um
Pai-Nosso."
Pelo seu trabalho, Zilda Arns recebeu o título de Cidadã Honorária
de 11 estados e 37 municípios brasileiros, 19 prêmios nacionais e
internacionais e dezenas de homenagens de governos, empresas, universidades e
outras instituições, pelo trabalho feito na Pastoral da Criança.
Hoje, a pastoral está presente em todos os estados brasileiros e
em mais 21 países da África, Ásia, América Latina e do Caribe. No Brasil, conta
com quase 200 mil voluntários e atende a 45 mil comunidades.
Perguntada por que Zilda deve ser beatificada, a religiosa Rosangela Maria
Altoé, da Congregação das Irmãs de Nossa Senhora da Imaculada Conceição, que
viajou com ela para o Haiti, disse: "Porque foi uma mulher que em sua ação
não excluiu ninguém. A pastoral beneficia a todos, não importa religião, sexo,
etnia, política.Todos estão incluídos."
Entre as características da médica, Rosangela destaca a
simplicidade, “sua capacidade de transformar o conhecimento científico de
maneira simples para que fosse compreendida pelas pessoas que não tiveram
oportunidade de estudar. Sua simplicidade ousada em um sorriso fácil, nas
relações que estabelecia”.
Ela conta que Zilda não parou de trabalhar desde o momento em que
chegaram ao Haiti, no dia 11 de janeiro de 2010. No mesmo dia, ela começou a
dialogar com os religiosos presentes que a conheciam. No dia seguinte, a
primeira ação foi conhecer e conversar com gestantes e outras tantas mulheres
haitianas que aguardavam por alimento para seus filhos. “Sua morte se deu em
pleno momento de uma missão que assumiu com entusiasmo, responsabilidade e ao
mesmo tempo profissionalismo e que foi o motivo de grande entusiasmo e luta em
favor da vida”, explicou.
Em seu último discurso, Zilda ressaltou que, para que haja uma
transformação social, é necessário o investimento máximo de esforços para o
desenvolvimento integral das crianças, ação que deve começar ainda na gravidez.
“Não existe ser humano mais perfeito, mais justo e mais solidário
e sem preconceitos que as crianças. Como os pássaros que cuidam dos seus filhos
ao fazer um ninho no alto das arvores e nas montanhas longe dos predadores,
ameaças e perigos, e mais perto de Deus, devemos cuidar de nossos filhos com um
bem sagrado, promover o respeito a seus direitos e promovê-los”, disse a médica
na ocasião. (Ag. Brasil)
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