Os ultrarricos do
Brasil continuam aumentando sua distância em relação aos mais pobres, segundo
relatório da ONG britânica Oxfam divulgado nesta segunda-feira.
O relatório será apresentado durante o Fórum Econômico Mundial (WEF, na
sigla em inglês), que se reúne em Davos, na Suíça, a partir desta terça-feira.
Segundo a Oxfam, o país ganhou 12 novos bilionários (considerando o patrimônio
em R$) no ano passado, e conta agora com 43 desses ultrarricos.
Em 2017, o patrimônio total dos bilionários brasileiros cresceu 13% e
somou R$ 549 bilhões, aponta o levantamento. Já a economia
brasileira como um todo (medida pelo PIB do país) avançou apenas 1,1% em 2017,
segundo a última estimativa do projeto Monitor do PIB, da Fundação Getulio
Vargas (FGV).
Segundo a Oxfam,
existem hoje no mundo todo 2.043 bilionários, e 90% deles são homens.
O ano passado registrou o maior aumento do número de bilionários da
história, com quase um novo bilionário no mundo a cada dois dias. E, nos
últimos 12 meses, o patrimônio dessas pessoas avançou em US$ 762 bilhões. Com
menos de 1/7 dessa quantia, já daria para acabar com a pobreza extrema em todo
o mundo, diz a organização.
De todo o valor
produzido pelo mundo no ano passado, 82% ficaram com o 1% mais rico da
população, enquanto a metade mais pobre da humanidade não teve qualquer aumento
no seu patrimônio, segundo a Oxfam.
Na versão de 2018 de
seu relatório, a ONG também revisou um cálculo do ano passado: segundo a
entidade, 61 bilionários detêm a mesma riqueza que os 50% mais pobres, e não
oito pessoas, como foi divulgado em 2017.
O relatório da Oxfam usa diversas fontes de informação, incluindo a
lista de bilionários elaborada pela revista mericana Forbes. A principal,
porém, é uma base de dados do banco Credit Suisse.
Segundo a organização, a atualização no número (de 8 para 61 bilionários
com a mesma renda que os 50% mais pobres) se deve ao fato do Credit Suisse ter
revisado, para cima, os cálculos sobre o patrimônio dos habitantes mais pobres
de Rússia, Índia e China. Com isso, cresceu o número de bilionários cujo
patrimônio somado é igual ao dos 50% mais pobres no mundo. Já no Brasil, cinco indivíduos possuiriam o mesmo patrimônio que os 50%
mais pobres da população (cerca de 100 milhões de brasileiros).
A organização reconhece que há limitações nos dados, mas diz que eles
são suficientes para retratar a realidade. Mas a forma como faz os cálculos
também não é unânime entre os economistas.
Medir desigualdade:
tarefa complexa - Mas afinal, como é possível contabilizar a renda e o patrimônio de mais
de 7 bilhões de pessoas como propõe a Oxfam?
Essa é uma das principais críticas feitas por economistas ao relatório
da entidade: para muitos países, simplesmente não existem dados suficientemente
precisos, de modo que o estudo precisa se basear em aproximações.
"Uma das coisas
que o Credit Suisse (fonte de dados usada pela Oxfam) diz é que é preciso
cautela, pois a maioria dos países não têm dados completos sobre o patrimônio
das pessoas. Só alguns países ricos fazem estimativas completas sobre o
patrimônio", diz o economista Carlos Góes, do Instituto Mercado Popular.
"E isso acontece
porque os governos geralmente tributam renda (como no IR brasileiro), e não
patrimônio. Então, o incentivo que eles têm é para saber a renda das pessoas,
não o patrimônio", acrescenta. É por isto, diz Góes, que os dados mais
completos disponíveis na maioria dos países são sobre a renda.
Segundo Carlos Góes, os estudos sobre desigualdade disponíveis hoje
mostram que o fosso entre ricos e pobres está diminuindo, quando se considera o
mundo como um todo. "Isso ocorre porque a renda têm crescido mais rapidamente em países
pobres do que nos ricos", afirma ele, mencionando lugares como Índia e
China. Na sua avaliação, essa diminuição global acontece mesmo com a
desigualdade aumentando dentro das nações mais ricas.
Em resposta, a Oxfam reconhece que existem limitações nos dados, mas diz
que as informações disponíveis já são suficientes para traçar um retrato
consistente da realidade.
"Não existe nenhum dado perfeito. Sempre há limitação. Mas com a
quantidade de dados que a gente tem hoje sobre patrimônio, como agregado pelo
Credit Suisse, a gente consegue ter uma fotografia da situação", afirma
Rafael Georges, coordenador de campanhas da Oxfam Brasil. "Se o banco
(Credit) não visse qualquer valor nos dados, não os publicaria", diz.
"Além disso, a
história que os dados contam bate com a realidade. Nos países ricos a
desigualdade aumenta a olhos vistos, e nos países pobres a gente vê a realidade
da massa de pessoas que não têm qualquer patrimônio", completa Georges.
O representante da ONG
explica que o relatório da Credit Suisse classifica a qualidade dos dados de 1
(pior) a 5 (melhor). O Brasil têm nota 3 (razoável) nessa escala.
Incluir ou não
dívidas? - Há ainda outra controvérsia sobre os relatórios da Oxfam: o critério
utilizado pelo Credit Suisse é o de "patrimônio líquido", isto é,
descontando as dívidas.
Carlos Góes usa um exemplo para explicar o tipo de distorção que isso
pode criar. "Um estudante que acabou de se formar em Harvard (universidade de
elite dos EUA), ganha 200 mil dólares por ano e toma uísque 18 anos todo fim de
semana, mas tem uma dívida estudantil, seria considerado mais pobre que um
camponês da índia que só tem uma bicicleta, mas não tem dívidas", diz ele.
Para Góes, isso mostra que são os dados sobre renda (e não sobre
patrimônio) o melhor indicativo para tratar de pobreza e riqueza. "A Oxfam recebe recomendações de especialistas desde o primeiro
levantamento. E a recomendação que temos é para manter as dívidas",
defende Rafael Georges.
"Se as dívidas fossem excluídas, a distorção seria maior ainda. A
parte mais pobre das pessoas aparentaria ter mais do que tem. Esse efeito seria
maior do que o de eventuais estudantes americanos endividados, embora isso
exista de fato", completa o representante da Oxfam. (BBC)
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