Em meio ao avanço
do risco de febre amarela, o governo federal iniciou uma campanha emergencial
de vacinação com o objetivo de imunizar cerca de 20,6 milhões de pessoas nos
Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia, novas áreas de concentração da
doença, entre janeiro e março.
No entanto, diferentes grupos -
como gestantes, idosos, pessoas em quimioterapia e em determinados tratamentos
de saúde - não devem receber a vacina por causa dos riscos de reações graves.
Para esses indivíduos, a
orientação é evitar picadas de mosquitos por meio do uso de camisas de mangas
longas e calças compridas, mosquiteiros e repelentes - grávidas e mães de
recém-nascidos, contudo, devem buscar orientação sobre possíveis reações
alérgicas a essas substâncias. Se possível, é recomendado ainda buscar telas
antimosquitos para os cômodos da casa.
A febre amarela causa sintomas como dor de
cabeça, febre baixa, fraqueza e vômitos, dores musculares e nas articulações.
Em sua fase mais grave, pode causar inflamação no fígado e nos rins,
sangramentos na pele e levar à morte.
Transmitida pelos mosquitos dos gêneros
Haemagogus e Sabethes, a forma silvestre da doença é a variedade que ainda
provoca surtos no Brasil. O país não registra casos de febre amarela urbana,
transmitida pelo Aedes aegypti, desde 1942. A BBC Brasil conversou com
diferentes especialistas sobre quem pode e quem não deve se vacinar - e por
quê. Confira.
Por que há contraindicação para algumas
pessoas? - A vacina contra a febre amarela é
considerada altamente segura. Segundo o Centro de Controle e Prevenção de
Doenças (CDC, na sigla em inglês), dos EUA, eventos adversos sérios, que põem
em risco a vida do paciente, ocorrem em 1 a cada 250 mil pessoas vacinadas.
Mas em determinados grupos de
pacientes, como aqueles que estão com o sistema imunológico debilitado ou que
têm alergias a elementos do ovo, a imunização pode causar problemas graves. Esses efeitos ocorrem porque o
imunizante contra a febre amarela possui o vírus vivo atenuado, que desaparece
do organismo três semanas após a vacinação, em média.
Em um paciente com um sistema
imunológico sadio, a vacina irá provocar as células de defesa para que criem anticorpos
contra a doença. Isso significa que esse paciente, ao ser eventualmente picado
no futuro por um mosquito infectado, terá os anticorpos necessários para
combater o vírus.
"Quando a pessoa é vacinada, o vírus
inoculado passa a se multiplicar no organismo do paciente. O sistema
imunológico então identifica a atividade do vírus e começa a produzir células
de defesa para combatê-lo", explica André Siqueira, pesquisador do Laboratório
de Pesquisa Clínica em Doenças Febris Agudas do Instituto Nacional de
Infectologia Evandro Chagas (INI), da Fiocruz.
No entanto, se o sistema imunológico do
paciente estiver enfraquecido por doenças sérias, como o câncer, a vacina pode
criar um quadro semelhante ao da febre amarela em si - a chamada doença
viscerotrópica aguda. Por isso é importante realizar uma triagem antes de tomar
a vacina, para garantir que não há contraindicações.
Doadores de sangue - Pessoas que pretendem
doar sangue devem esperar 30 dias após a vacinação para o procedimento. O objetivo é evitar que o vírus vivo
inoculado, circulante na corrente sanguínea do doador durante as três primeiras
semanas após a vacinação, não acabe em um paciente que esteja com o sistema
imunológico debilitado e cause reações adversas.
"É uma ação de prevenção que
faz parte dos protocolos internacionais", afirma Regiane Cardoso de Paula,
diretora do Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Estadual de Saúde
de São Paulo.
Ela pede que o doadores procurem
os hemocentros do município no qual residam antes do início da campanha de
vacinação fracionada no Estado de São Paulo, que começará no dia 29 de janeiro.
É importante lembrar que o risco
está para o paciente debilitado que receberá o sangue - e não para o doador. "Pedimos que as pessoas doem
sangue antes do Carnaval, período em que precisamos de doações. Os estoques dos
hemocentros já estão baixos, porque janeiro é um período de férias em que as
pessoas geralmente estão em viagem", afirma a diretora.
Gestantes e mulheres que amamentam - Grávidas e mulheres que estejam
amamentando um bebê com menos de seis meses devem buscar orientação médica
antes de tomar a vacina. A cautela é para evitar a possibilidade de reações
alérgicas graves.
A orientação geral é que essas
mulheres só sejam imunizadas se estiverem em área de risco de transmissão da
doença. "O médico vai fazer uma
conta de risco e benefício", diz Cardoso de Paula. "Se a grávida
tiver mais de três meses de gestação e estiver próxima do foco da doença, a
recomendação é que tome a vacina. Se puder se deslocar para um outro local em
que a doença não seja endêmica, podemos avaliar se a vacina é
dispensável."
Bebês com menos de 9 meses - O Ministério da
Saúde recomenda a vacinação apenas para os bebês acima de nove meses de idade.
Para aqueles em áreas de alto risco da doença, a recomendação é a partir dos
seis meses.
De acordo com Expedito Luna, médico
epidemiologista e professor do Instituto de Medicina Tropical da Universidade
de São Paulo, a razão está na maior probabilidade de efeitos colaterais para
crianças nessa faixa etária.
"Nesse grupo, há mais
eventos adversos neurológicos e menor imunogenicidade da vacina, o que
significa que ela protege menos. Você aplica em cem crianças e vai haver menos
proteção e mais efeitos colaterais", explica.
Idosos acima de 60 anos - Atualmente, a
vacina está recomendada para aqueles entre nove meses e 59 anos de idade. Idosos acima dessa faixa etária
precisam passar pelo médico para avaliar o estado do sistema imunológico e se o
risco de serem contaminados pela doença é alto ou não.
De acordo com Luna, desde 2000
foi identificado no Brasil e em outros lugares do mundo que uma pequena
proporção daqueles que tomavam a vacina podiam desenvolver um quadro grave,
semelhante ao da própria febre amarela.
"No estudo desses raros
casos de eventos adversos, identificou-se que era comum entre aqueles acima de
60 anos, com doenças do timo e doenças autoimunes. Isso levou a uma restrição
maior no uso da vacina nesses casos."
Pessoas com doenças autoimunes - Pacientes em radioterapia,
quimioterapia ou fazendo uso de corticoide, portadores de doenças autoimunes,
como lúpus, doença de Addison e artrite reumatoide, são contraindicados a
receber a vacina.
Como estão com o sistema
imunológico suprimido pelas condições citadas acima, a vacina contra a febre amarela
- assim como de outras em que há o vírus vivo atenuado, como caxumba, varicela,
catapora - pode trazer efeitos colaterais graves.
"Em condições normais, o
vírus inoculado da vacina não causará nenhum problema - ao contrário, ele irá
estimular a criação de anticorpos contra a doença. Mas se houver problemas com
a imunidade, pode ocorrer desse vírus atenuado se multiplicar e causar reações
adversas", explica Siqueira, da Fiocruz.
Diabéticos - Diabéticos com os níveis de
glicemia controlados não têm contraindicação para a vacina. No entanto, aqueles
com altos níveis de açúcar no sangue precisam se consultar com um médico antes
de se vacinar. "A vacina pode afetar o sistema imunológico, debilitado
pelos altos níveis de glicemia", afirma Siqueira.
Quem pode tomar - Todas as pessoas não
pertencentes aos grupos citados acima e que vivem em área de risco para a
doença, conforme determinado pela Secretaria de Saúde de seu Estado, devem
procurar postos de saúde para tomar a vacina.
Pessoas que viajarão para essas regiões também
precisam se imunizar - nesse caso, dose deve ser aplicada no mínimo dez dias
antes da chegada. Nos postos, é necessário passar
por uma triagem antes da imunização para definir se há ou não contraindicação.
Entre os dias 29 de janeiro e 9
de março, os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia irão realizar uma
campanha de vacinação fracionada - o que significa que a dose de febre amarela,
de 5 mg, será dividida em cinco partes para ser aplicada em mais pacientes.
De acordo com o Instituto de
Tecnologia em Imunobiológicos (Biomanguinhos/Fiocruz), a dose fracionada
protege contra a doença por até oito anos. A dose integral, segundo a
Organização Mundial de Saúde, vale para a vida toda.
Confira as datas de vacinação dos
Estados:
-
São Paulo: 29 de janeiro
a 17 de fevereiro
-
Rio de Janeiro: 19 de
fevereiro a 9 de março
-
Bahia: 19 de
fevereiro a 9 de março
O Ministério da Saúde divulgou
nesta terça-feira as cidades nos três Estados com risco de infecção pela doença
e que têm recomendação de vacina. A lista completa está no site do órgão.
Entre dezembro de 2016 e junho de
2017, foram 777 casos confirmados no país - um surto que a pasta declarou
encerrado em setembro. Do meio do ano passado até o último dia 14, foram 35 -
os números podem crescer, já que vários casos suspeitos estão em investigação.
A pasta ainda analisa se
classifica o quadro atual como um surto. Oficialmente, trata a situação como um
aumento atípico de casos. (BBC)
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