O tema da
redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deste ano - Manipulação do
comportamento do usuário pelo controle de dados na internet - não foi novidade
para estudantes da Escola Estadual Raymundo Sá, em Autazes, no Amazonas.
Na semana
antes da prova, eles tiveram uma aula sobre o poder da internet. O professor
que ministrava a aula não estava na sala com os alunos, mas a mais de 100 km de
distância, em Manaus.
A aula de
Tecnologia foi transmitida pelo Centro Nacional de Mídias da Educação (CNME)
apresentado hoje (13) pelo governo federal. “O Enem
estava cansativo, mas a gente sabia os conteúdos”, afirmou a estudante do 3º
ano do ensino médio da escola, Karine Meireles, 17 anos. Ela participa das duas
aulas que são oferecidas na escola pelo CNME - Tecnologia e Mundo do Trabalho.
“Fico com mais
vontade de sair da sala para vir para cá porque aqui a gente interage mais. Na
sala, é só estudo e caderno, não pode conversar. Aqui é diferente, a gente
conversa e troca ideias sobre o que está sendo ensinado”, disse.
O CNME foi
criado pelo Ministério da Educação (MEC) para ajudar na implantação do novo
ensino médio, lei aprovada em 2017. Pela nova
lei, os estudantes passarão por uma formação comum a todo o país, definida pela
chamada Base Nacional Comum Curricular e por uma formação específica, que poderá
ser em linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas ou ensino
técnico.
A oferta da
parte diversificada do currículo é um problema, sobretudo, para municípios
pequenos que às vezes contam apenas com uma escola. O CNME surge para, com o
uso da tecnologia, complementar o ensino.
O projeto
leva TV, câmeras, microfones e outros equipamentos necessários para
interatividade a escolas de ensino médio. As aulas são transmitidas ao vivo, de
Manaus.
Nas salas de
aula, elas são acompanhadas por professores, que auxiliam também no aprendizado
dos alunos presencialmente. Ainda na
fase piloto, as aulas são transmitidas desde agosto a 150 escolas em 17 estados
e no Distrito Federal, que aderiram ao programa.
Na escola
Raymundo Sá, a sala de transmissão na escola é diferente. Os alunos não sentam
em carteiras enfileiradas, mas se dividem em quatro mesas redondas.
Participam
estudantes do 1º ao 3º ano do Ensino Médio, que aprendem juntos. A televisão,
equipada com câmera e microfone, ocupa posição de destaque.
Antes de
começar a aula, a professora Lourdes Cunha define os estudantes que serão
responsáveis por fazer um resumo da aula, aqueles que farão uma avaliação ao
final de como foi a aula, os que se encarregarão que as tarefas pedidas sejam
executadas e aqueles responsáveis pela socialização - momento inicial de
descontração, transmitido para as todas as escolas participantes.
Iinteratividade - A escola é
conhecida por se destacar na interatividade. As aulas acontecem simultaneamente
nas 150 escolas e a plataforma permite que os alunos se comuniquem.
“Ninguém
interagia e a gente começou a se comunicar com outros estudantes. Criamos
um meme e mostramos na câmera, daí as outras escolas se
soltaram e criaram também memes”, conta Nyeslly Nascimento, 17
anos, do 3º ano.
A primeira
pergunta feita na aula acompanhada pela Agência Brasil foi:
“Para pensar sustentabilidade, precisamos usar a estatística? Expliquem”. Os
estudantes tiveram alguns minutos para discutir em grupo e elaborar uma
resposta. A escola foi a escolhida para dar a resposta. Quem pegou o microfone
foi Maria Luiza Gomes, 17 anos, estudante do 2º ano.
Com as
aulas, ela perdeu a timidez. “Antes desse curso eu praticamente não tinha
amizade, eu não falava com ninguém aqui e olha que a gente estuda na mesma
escola. Com o curso, a gente se fala mais, se comunica”, disse.
Das aulas
que teve, Maria Luiza destaca a de casas sustentáveis, na qual tiveram que
projetar uma casa que agredisse minimamente o meio ambiente, com cartolinas e
outros materiais, e a aula de moedas virtuais: "Foi uma novidade para nós
pensar que lá na frente não precisaremos mais usar dinheiro", revelou a
estudante.
"Tentamos
sempre trazer temas inovadores, contemporâneos", disse a professora de
Mundo do Trabalho, Edivânia Barros. Antes de chegar a Manaus para fazer parte
da equipe de 15 professores responsáveis pelas aulas transmitidas, ela
lecionava em Salvador, na Bahia.
Todos os
professores são de redes estaduais de educação e têm, portanto, experiência em
sala de aula no ensino médio. Edivânia contou que eles recebem formação para
dar aulas com o auxílio da tecnologia, o que era novidade para ela.
Experiência
Nacional - O CNME é
inspirado no Centro de Mídias
de Educação do Amazonas, criado em 2007 para atender a comunidades
indígenas e ribeirinhas isoladas no estado.
O Centro do
Amazonas recebeu prêmios nacionais e internacionais. Tornar a experiência
nacional é um desejo antigo do ministro da Educação, Rossieli Soares, que já
foi secretário de Educação do Amazonas.
A intenção,
segundo ele, é oferecer uma possibilidade a mais para as escolas. Elas e as
redes têm autonomia para decidir como as aulas integrarão o currículo, podendo
ser ofertadas, por exemplo, no contraturno, no horário oposto ao das aulas
regulares. Os cursos
ofertados inicialmente foram demandados pelas secretarias estaduais de
Educação: Mundo do Trabalho e Tecnologia.
O ministro
da Educação disse que não se trata de um ensino a distância, em que os
estudantes escolhem o horário que estudarão e o fazem sozinhos, mas de um
ensino presencial mediado por tecnologia.
“Acho que é
uma boa oportunidade para avançarmos no novo ensino médio. Têm municípios que
só têm uma escola. O Centro de Mídia pode ser boa oportunidade, uma discussão
necessária para o Brasil. Trata-se de tecnologia adequada para o ensino na
escola. É diferente de simplesmente jogar tecnologia dentro da escola. Com tecnologia,
por si só, os resultados dos estudantes caem”, disse o ministro.
As aulas
podem ser acessadas por aplicativo e
também estão disponíveis na Plataforma MEC de Recursos
Educacionais Digitais.
Continuidade
do projeto - O CNME é um
projeto do MEC e do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), com
implementação apoiada pela TV Escola e Fundação Roberto Marinho.
O ministro
espera que, mesmo com a troca de governo, o Centro Nacional seja mantido. “O
novo governo já sinalizou que quer usar tecnologias. Vamos apresentar o
projeto. As perspectivas são gigantes. A gente pode falar de formação de
professores, de debate de professores com essa ferramenta”, afirmou.
O ministro
da Educação acrescentou: “Quando se conhece as experiências nas escolas e a
funcionalidade [da ferramenta], não encontramos resistência. A resistência
teria se as pessoas entendessem que vamos substituir professores. Não é essa a
intenção do projeto. Pelo contrário, não temos a intenção de fazer isso e não
faremos. Temos que ter clareza que é a soma de uma ferramenta a mais”.
Ao todo,
segundo a diretora de Apoio às Redes de Educação Básica, do MEC, Renilda Peres
de Lima, que é responsável pelo projeto, deverão ser usados, neste ano, R$ 35
milhões. Segundo ela, recursos suficientes para iniciar as aulas no ano que
vem. Para 2019,
mais R$ 40 milhões estão previstos no projeto da Lei Orçamentária Anual, em
discussão no Congresso Nacional.
A intenção é
que o projeto possa ser ampliado para mais 350 escolas que serão escolhidas
ainda este ano. Negociações com estados também estão em andamento e os próprios
entes poderão seguir o modelo do centro. Com isso, a expectativa de alcance em
2019 sobe para mil escolas.
Regulamentação - O novo
ensino médio foi sancionado no ano passado. A lei 13.415/2017 permite que, para
cumprir as exigências curriculares do ensino médio, as aulas sejam
dadas a distância ou mediadas por
tecnologia.
As novas diretrizes do ensino médio, aprovadas na semana passada pelo Conselho
Nacional de Educação (CNE), permitem que até 20% no ensino regular e até 30% no
ensino médio noturno sejam ministrados à distância.
Pelas novas
regras, as aulas a distância deverão ser preferencialmente dadas na formação
específica, mas poderão ser também aplicadas na parte comum. São necessários,
no entanto, suporte tecnológico e pedagógico apropriados. Os estudantes têm de
ter necessariamente acompanhamento e coordenação de um professor da unidade
escolar onde estão matriculados.
No ensino
fundamental, pela lei de diretrizes e bases da educação nacional, a educação a
distância pode ser utilizada apenas como complementação da aprendizagem ou em
situações emergenciais a estudantes que, por motivo de saúde, estejam impedidos
de acompanhar o ensino presencial; estejam no exterior; vivam em localidades
que não possuam rede regular de atendimento escolar presencial; sejam
transferidos compulsoriamente para regiões de difícil acesso, incluídas as
missões localizadas em regiões de fronteira; e estejam em situação de privação
de liberdade. (Ag. Brasil)
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