
A temperatura está aumentando no mundo como um todo,
mas as consequências disso não são as mesmas para todos os países.
No
último século, a mudança climática aumentou a desigualdade entre as nações,
puxando para baixo o crescimento econômico dos países mais pobres e aumentando
a prosperidade de alguns dos países mais ricos do planeta, aponta uma nova
pesquisa.
O
abismo entre as nações mais pobres e as mais ricas do mundo é 25% maior do que
seria sem o aquecimento global entre 1961 e 2010, diz um estudo da Universidade
de Stanford, na Califórnia.
Países
tropicais africanos foram os mais afetados- os Produtos Internos Brutos da
Mauritânia e do Níger estão 40% menores do que estariam se as temperaturas não
estivessem aumentando progressivamente.
O
Brasil, que é nona maior economia do mundo, teria tido um crescimento 25% maior
se não houvesse aquecimento global.
A
Índia - que, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), se tornará a quinta
maior economia do mundo neste ano- atingiu um PIB 31% menor em 2010 por causa
do aquecimento global, diz a pesquisa.
Por
outro lado, conforme o estudo, publicado na revista acadêmica National Academy of Sciences, o aquecimento global
contribuiu para o crescimento do PIB de vários países ricos, inclusive de
alguns dos maiores emissores de gases poluentes.
O problema do calor - Um
dos autores da pesquisa, Marshal Burke, do Earth System Science, da
Universidade de Stanford, passou anos analisando a relação entre temperatura e
flutuação econômica em 165 países, entre 1961 e 2010.
O
estudo usou mais de 20 modelos climáticos para determinar quanto cada país
aqueceu em decorrência do aquecimento global provocado pelos seres humanos.
Ele, então, calculou 20 mil versões de qual seria a taxa de crescimento anual
dessas nações se não tivesse havido esse aumento na temperatura.
Burke demonstrou que, nos anos que registraram climas mais quentes que a média, o crescimento econômico acelerou nos países mais frios e reduziu, nos mais quentes.
"Os
dados históricos mostram claramente que as plantações são mais produtivas, e as
pessoas são mais saudáveis e mais produtivas no trabalho quando as temperaturas
não são nem tão quentes nem tão frias", explica.
O
pesquisador argumenta que países frios se beneficiaram do efeito do aquecimento
global ao vislumbrarem alguns anos de temperaturas mais amenas, enquanto os
países quentes foram "punidos" com temperaturas mais extremas que o
normal.
Noah
Diffenbaug, que liderou a pesquisa, disse à BBC News que a temperatura afeta a
economia de um país de diferentes maneiras.
"Por
exemplo, a agricultura. Países frios têm períodos limitados para germinação,
por causa do inverno com temperaturas muito frias. Por outro lado, obtivemos
evidências de que a produção agrícola declina acentuadamente em temperaturas
muito altas", diz.
"Da
mesma maneira, há evidências de que a capacidade de trabalho decai em
temperaturas quentes, assim como a performance cognitiva. E os conflitos
interpessoais aumentam em climas quentes também."
Impacto a longo prazo é ruim para todos - Os
pesquisadores dizem que, enquanto há certa incerteza sobre o tamanho dos
benefícios obtidos pelos países mais ricos e frios, o impacto do aquecimento
global em nações de clima quente não deixa margem para dúvida.
Na
realidade, se tivessem considerado o aquecimento global desde o período da
Revolução Industrial, os efeitos seriam ainda mais significativos.
Ciclones que atingiram a África nos últimos dois meses deixaram centenas de mortos
"Os
achados dessa pesquisa são consistentes com conhecimentos que já tínhamos, como
o fato de que as mudanças climáticas agem como multiplicador de ameaças,
agravando vulnerabilidades", afirmou Happy Khambule, consultor do
Greenpeace África.
"Isso
significa que os mais pobres e vulneráveis estão na linha de frente das
mudanças climáticas, e os países em desenvolvimento estão tendo de lidar com
temperaturas cada vez mais extremas, que tolhem o seu desenvolvimento."
A
falta de resiliência de Moçambique ficou evidente após o ciclone Kenneth- que
provocou mais de 40 mortes- atingir o país em 25 de abril, diz Khambule.
Em
março, mais de 900 pessoas morreram em Moçambique, no Malauí e na Zâmbia como
consequência do ciclone Idai.
Até
a África do Sul, que se beneficia de uma infraestrutura mais sofisticada,
sofreu com eventos climáticos extremos, como a crise da seca em 2018 e as
recentes enchentes na província de KwaZulu-Natal, afirma Khambule.
"Países
africanos têm contribuído muito pouco para a piora do aquecimento global, mas
são os que mais estão sofrendo seus impactos."
Injustiça - De
acordo com a pesquisa, entre 1961 e 2010, todos os 18 países com emissões
históricas que totalizam menos de 10 toneladas de dióxido de carbono per capita
foram impactados negativamente pelo aquecimento global. Eles tiveram, em média,
uma redução de 27% no PIB per capita comparado a um cenário sem alta nas
temperaturas.
Por
outro lado, 14 dos 19 países cujas emissões ultrapassam 300 toneladas de
dióxido de carbono per capita se beneficiaram do aquecimento global, tendo um
crescimento médio adicional de 13% no PIB.
"Além
de não terem compartilhado dos benefícios do consumo de energia, os países
pobres se tornaram mais pobres com o consumo de energia pelas nações
ricas", destaca a pesquisa.
Mas
essas descobertas também foram alvo de críticas.
Solomon
Hsiang, professor de políticas públicas da Universidade da Califórnia, Berkley,
que colaborou com os dois autores da pesquisa no passado, diz que países ricos
também foram impactados negativamente pelo aquecimento global.
"Nós
detectamos malefícios de efeito retardado em países ricos, por meio do uso de
métodos de análise. Portanto, se você olhar para além dos primeiros anos de
impacto, você vai perceber o surgimento de danos em países ricos e frios, assim
como em países quentes e pobres", disse.
Também
não está claro como o crescimento foi afetado pelas mudanças climáticas em
países de latitude média, como Estados Unidos, China e Japão- as três maiores
economias do mundo.
"O
que se sabe é que, no longo prazo, as mudanças climáticas não beneficiam ninguém.
É essencial que os maiores emissores de gases poluentes reduzam urgentemente
suas emissões", diz Khambule.
"Os
governantes precisam levar o aquecimento global mais a sério do que fazem hoje
e garantir uma rápida transição do uso de combustíveis fósseis para fontes
renováveis de energia." (BBC)



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