sexta-feira, 12 de julho de 2019

LITERATURA CEARENSE: Seminário da Betânia: A chama que nunca se apaga (Edson Costa, na Betânia: 1964/1967 *)


O primeiro capítulo do livro do Gênesis que fala da criação do mundo no seu versículo 3 diz: “faça-se a luz”. A primeira grande luz que iluminou a minha vida foi a luminosidade irradiada pelos meus pais Antônio e Raquel que viveram uma vida cristã e foram um exemplo de vida para as famílias Costa e Andrade. Traçarei alguns fatos importantes que contribuíram para a construção ativa da minha memória.

A primeira delas, na mais tenra idade, quando meu pai me conduzia para a missa aos domingos na Igreja da Sé, celebrada pelo Mons. Domingos e, algumas vezes, via os seminaristas de preto sentados na primeira fila, perfilados de maneira contrita. Aquilo me fascinava e marcou muito a minha memória.   Em casa tínhamos o hábito de almoçarmos juntos em família com meu pai na cabeceira da mesa e ele   não se esquecia de agradecer a   Deus a refeição que naquela hora iríamos nos servir.

A segunda grande luz da minha vida aconteceu quando ingressei no Seminário, no dia 08/02/1964, num sábado à tarde, juntamente com meu irmão Zé Costa. Nós nos sentíamos a âncora um do outro nos momentos de muitas saudades de casa.   Um fato marcante na minha vida foi no segundo dia de seminário quando fui apresentado no almoço, que era servido num grande refeitório, a um alimento de cor vermelha, desconhecido e estranho para mim, dando-me ele a impressão de derramar sangue sobre o prato de arroz: conheci a beterraba. Para mim era uma estranha novidade. Hoje toda vez que a vejo me lembro do Seminário.

Não sei dizer precisamente porque ingressei no seminário. Acho que teve uma certa influência de um primo seminarista:  o Zé Gomes e das missas que ia com o papai como escrevi acima. Mas o impulso e a decisão maior foram da minha mãe. Meu pai sempre respeitava as decisões dela. Tendo um bom prato de comida e uma rede para ele dormir, estava tudo perfeito.

O seminário me deixou uma grande formação: cristã, ética e profissional. Tenho muitas saudades dos melhores dias da minha vida, daquela caminhada cristã de muita fé e de muita alegria. Fui um escolhido por Deus para ter ido para lá. No evangelho de João 15, 16: “não foste vós que me escolhestes; fui eu que vos escolhi e vos designei, para dardes fruto e para que o vosso fruto permaneça¨. Os frutos do seminário ainda hoje estão a alimentar, com os seus ensinamentos, a minha família, dos meus filhos aos netos.   Foi mais uma graça que Deus me deu.

Todo semestre era nomeado para cargos de serviços no ambiente interno do Seminário: fui sinete iro, bedel, prefeito, etc. Era um misto de orgulho e responsabilidade. Era uma responsabilidade orgulhosa! Tais nomeações não me eram feitas por méritos próprios, mas tão somente por bondade dos meus superiores reitores. Fiquei lá até o final de 1967 quando o nosso querido Seminário Diocesano São José de Sobral fechou as portas. Quanto orgulho ao pronunciar esse nome !!!! Ah, não me esqueço da capela do Preciosíssimo Sangue, onde sedimentávamos a nossa fé com muitas orações e com as nossas missas diárias.

No ano seguinte fiz o primeiro científico no Colégio Sobralense.  Em meados de 1969 vim para Fortaleza para concluir os dois últimos anos do curso científico no Colégio Castelo, da Dom Manuel.  Também era um colégio de padres da diocese de Fortaleza.  Consegui me transferir para lá graças a uma carta de recomendação do Pe. Luizito para o padre Jonas, diretor do Colégio, solicitando uma vaga para um aluno aplicado e ex-seminaristas. O Colégio Castelo naquela época era muito conceituado em Fortaleza, sendo as vagas para ingresso muito disputadas. Concorria em aplicação didática com o Colégio Cearense que também era um colégio de formação cristã. Em meados de 1971 prestei vestibular para Medicina da UFC, formando-me na turma Juscelino Kubitschek, em 1976. O Seminário me deu a grande oportunidade de me sair bem nas notas escolares e nos vários exames a que prestei. Aprendi a disciplina da vida alicerçada em obediência aos meus superiores.

Em 1975, fui para o carnaval em Sobral quando aconteceu a terceira Luz da minha vida: conheci uma sobralense, nascida no berço dos Linhares, Livramento, para quem Deus nos deu a grande graça da bênção no nosso casamento em meados de 1976.

Dessa nossa união mais três luzes se acenderam na minha vida com o nascimento de Décio (médico), Samuel (dentista) e Lis (advogada). Os meus três filhos me abençoaram com cinco netas e um neto. Sou o mais muçulmano dos avós com cinco netas.

A sétima luz que se acendeu em minha vida foi com a decisão de ser abençoado com a escolha da especialidade: oftalmologia. Sinto-me plenamente realizado com ela, na qual atuo há 38 anos com muita dedicação, sem esquecer jamais dos meus princípios éticos e religiosos calcados nos ensinamentos dos meus professores do Seminário.

Não sou ex betanista. Sou um Betanista!  Fervoroso e apaixonado por aquele casarão que deixou marcas profundas em minha alma.  Tenho me esforçado para aplicar plenamente as virtudes teologais de fé, esperança e caridade.

Um grande abraço fraterno a todos os meus colegas betanistas e a minha melhor reverência aos meus professores padres ou não, ainda vivos:  Pe. Osvaldo (quantas mãos frias em suas aulas eu as tive), ao Pe. Luizito (pela paciência e disponibilidade em me receber em sua casa nas minhas dificuldades escolares), ao Pe. Zé Linhares (pelo ensino e exemplo de disciplina) e ao meu padrinho de crisma: Pe. Sadoc (pelos seus sábios ensinamentos de vida).  

Aos meus colegas seminaristas falecidos, que Deus os convidou para junto de si, tenham toda a plenitude da vida eterna. Aos funcionários do Seminário, o meu melhor reconhecimento pela dedicação prestada a nós, numa convivência extremamente fraterna. Às nossas freiras, na pessoa da Irmã Hermenhilde que se esmerava no cuidado do preparo para fazer as nossas refeições as mais saudáveis possíveis, o melhor agradecimento. Somente Deus pode lhe pagar. Vou parar por aqui porque a saudade me leva às lagrimas.

O meu melhor agradecimento a DEUS pelo dom da minha vida que só a ele pertence. Obrigado mais uma vez a ELE pela sua infinita benevolência e pelo amor incomensurável a todos nós.

Não poderia me esquecer de deixar nestas palavras um grande abraço amigo e fraternal ao Betanista Aguiar Moura por quem reconhecemos o seu esforço incansável para manter viva a memória do nosso inesquecível Seminário da Betânia.




(*) Edison Costa, de Sobral, Médico Oftalmologista, em Fortaleza: 85- 9135.6654/ 85-3261.2334


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