O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse neste domingo (23) que
"a liberdade de imprensa é um valor inegociável na democracia". A
declaração foi dada a "O Globo" após o presidente Jair Bolsonaro dizer a um repórter do jornal que
estava com vontade de “encher” a boca dele “na porrada”.
Maia disse ainda que "espera que o presidente retome o tom mais moderado dos últimos 66 dias".
Bolsonaro deu a declaração após ter sido questionado por um repórter do jornal "O Globo" sobre cheques de Fabrício Queiroz para a primeira-dama Michelle Bolsonaro. Um repórter do G1 perguntou, em seguida, sobre movimentações nas contas da empresa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente.
Ao ser questionado, Bolsonaro disse, primeiro, que não responderia às
perguntas. Depois, ao ser questionado novamente sobre os cheques para Michelle,
Bolsonaro se dirigiu aos jornalistas e disse: "Eu vou encher a boca desse
cara na porrada”. Na sequência, o presidente emendou: "Minha vontade é
encher tua boca na porrada, tá?"
Entidades de imprensa e políticos repercutiram a fala do presidente.
Veja:
Jornal
"O Globo"
"O GLOBO repudia a agressão do presidente Jair Bolsonaro a um
repórter do jornal que apenas exercia sua função, de forma totalmente
profissional, neste domingo.
Em cobertura de compromisso público do presidente, o repórter solicitou
que ele se pronunciasse sobre reportagens da revista Crusoé e do jornal Folha
de S.Paulo que, no início deste mês, informaram que o ex-assessor de Flávio
Bolsonaro Fabrício Queiroz e a mulher dele depositaram cheques no valor de R$
89 mil na conta da primeira-dama, Michelle Bolsonaro. Anteriormente, o
presidente havia prestado uma informação diferente sobre os valores.
Bolsonaro, então, em manifestação que foi gravada, não respondeu à
pergunta e afirmou a vontade de agredir fisicamente o repórter.
Tal intimidação mostra que Jair Bolsonaro desconsidera o dever de
qualquer servidor público, não importa o cargo, de prestar contas à população.
Durante os governos de todos os presidentes, o GLOBO não se furtou a fazer
as perguntas necessárias para cumprir o papel maior da imprensa, que é informar
os cidadãos. E continuará a fazer as perguntas que precisarem ser feitas, neste
e em todos os governos."
Associação
Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Artigo 19, Conectas Direitos
Humanos, Observatório da Liberdade de Imprensa da OAB e Repórteres sem
Fronteiras
"Durante uma visita à Catedral de Brasília no domingo, 23.ago.2020,
o presidente do Brasil disse a um jornalista que gostaria de agredi-lo
fisicamente. Abraji, Artigo 19, Conectas Direitos Humanos, Observatório da
Liberdade de Imprensa da OAB e Repórteres sem Fronteiras se solidarizam com o
repórter e condenam mais um episódio violento protagonizado por Jair Bolsonaro,
cuja reação, ao ouvir uma pergunta incisiva, foi não apenas incompatível com
sua posição no mais alto cargo da República, mas até mesmo com as regras de
convivência em uma sociedade democrática. Um presidente ameaçar ou agredir
fisicamente um jornalista é próprio de ditaduras, não de democracias.
A ameaça se deu quando um repórter questionou o presidente sobre os
depósitos realizados por Fabrício Queiroz na conta bancária da primeira-dama,
Michelle Bolsonaro. O mandatário respondeu à pergunta com a frase: "Minha
vontade é encher tua boca com uma porrada, tá". Os colegas do jornalista
perguntaram se a resposta era uma ameaça ao profissional, ou mesmo à imprensa
como um todo, mas o presidente deixou o local sem responder.
Essa ameaça de agressão física se soma a um histórico de forte
hostilidade de Bolsonaro contra jornalistas e marca um novo patamar de
brutalidade. Desde o início de seu mandato, em jan.2018, Jair Bolsonaro vem
demonstrando carecer de preparo emocional para prestar contas à sociedade por
meio da imprensa, uma responsabilidade de todo mandatário nas democracias
saudáveis. Jornalistas têm sido vítimas de agressões verbais constantes ao
cumprir sua obrigação profissional de questionar o presidente sobre ações do
governo federal e indícios de corrupção ao longo de sua carreira política.
A questão da segurança do trabalho dos jornalistas que cobrem a
Presidência da República sob Bolsonaro é uma preocupação recorrente. Em
jun.2020, organizações da sociedade civil entraram com uma ação na justiça do
Distrito Federal solicitando ao governo que garanta a segurança de jornalistas
que cobrem a agenda presidencial - sobretudo os que ficam diante do Palácio do
Alvorada e que vinham sendo atacados com frequência por apoiadores do
presidente. As agres.sões levaram diversos veículos a interromper a cobertura
diária na frente do palácio.
O discurso hostil e intimidatório. de Bolsonaro contra a imprensa vem
incentivando sua militância a assediar jornalistas nas redes sociais nos
últimos meses, inclusive com ameaças de morte e agressões aos profissionais e a
seus familiares. Em pelo menos dois casos, um em Minas Gerais e outro em
Brasília, este último no Dia Mundial da Liberdade de Imprensa (03.mai.2020),
apoiadores do presidente agrediram repórteres que estavam no desempenho de suas
funções. A frase "minha vontade é encher tua boca com uma porrada"
pode ser entendida como uma legitimação do cometimento de crimes como esses.
Tal comportamento inadmissível por parte de um presidente da República
deveria ser condenado por todas as instituições e cidadãos comprometidos com a
estabilidade e o progresso do Brasil. As organizações abaixo assinadas esperam
sobretudo dos líderes dos Poderes Legislativo e Judiciário uma reação
contundente contra mais essa atitude violenta e irresponsável de Jair
Bolsonaro.
Associação
Nacional de Jornais (ANJ)
"É lamentável que mais uma vez o presidente reaja de forma
agressiva e destemperada a uma pergunta de jornalista. Essa atitude em nada
contribui para o ambiente democrático e de liberdade de imprensa previstos pela
Constituição", afirmou o presidente da associação, Marcelo Rech.
Associação
Brasileira de Imprensa
"Mais uma vez o presidente Jair Bolsonaro choca o país com seu
comportamento grosseiro. Ao ser perguntado por um repórter do jornal “O Globo”
sobre os sucessivos depósitos feitos pelo PM aposentado Fabrício Queiroz na
conta bancária de sua esposa, o presidente respondeu afirmando que tinha
vontade de “encher de porrada a boca” do jornalista, em declaração gravada.
Tal comportamento mostra não apenas uma inaceitável falta de educação.
É, também, uma tentativa de intimidação da imprensa, buscando impedir
questionamentos incômodos.
A ABI se solidariza com o profissional atingido e reafirma que a pergunta
feita ao presidente era pertinente e de interesse público.
Por fim, lembra, ao primeiro mandatário do país que o cargo que ocupa
exige maior decoro.
Tenha compostura, senhor presidente."
Ordem
dos Advogados do Brasil (OAB)
"O presidente vinha muito bem nas últimas semanas. Com sua
moderação estava contribuindo para a pacificação do debate público. Lamentável
ver a volta do perfil autoritário que tanta apreensão causa nos democratas.
Nossa solidariedade ao jornalista ofendido e ao jornal O Globo", publicou
em rede social o presidente da entidade, Felipe Santa Cruz.
Senador
Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder do partido no Senado
"Ao ser perguntado sobre os depósitos de Queiroz p/ a
primeira-dama, Bolsonaro ameaçou um jornalista de agressão física. O medo de
responder é tão grande que Bolsonaro quer silenciar quem o fiscaliza de toda
forma... Ele vai dizer o mesmo à justiça?"
Senador
Humberto Costa (PT-PE)
"ABSURDO - Bolsonaro disse há pouco a um repórter que estava com
vontade de “encher a boca” dele de porrada,depois de perguntado sobre os
depósitos de Queiroz na conta da primeira-dama.O presidente estava em frente à
Catedral de Brasília quando fez a ameaça.
A absurda ameaça feita por Jair Bolsonaro a um repórter do Globo que
perguntou sobre os depósitos suspeitos de Queiroz na conta da primeira-dama
mostra o desespero do presidente. Até hoje, ele não deu qualquer explicação
sobre o assunto. Por quê? Cadê a resposta, falastrão?"
Gilmar
Mendes, ministro do STF
"A liberdade de imprensa é uma das bases da democracia. É
inadmissível censurar jornalistas pelo mero descontentamento com o conteúdo
veiculado. G. Orwell: 'Jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se
publique. Todo o resto é publicidade'."
Deputado
Alessandro Molon (PSB-RJ), líder do partido na Câmara
"O que se espera de um presidente é que ele se comporte à altura do
cargo que ocupa. Ameaças à imprensa são ameaças à própria democracia. Além
disso, Bolsonaro tenta esconder o que aos poucos está vindo à tona: seu
envolvimento num esquema criminoso."
Deputado
Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), líder do partido na Câmara
"Postura totalmente inapropriada para um presidente da República.
Também revela sua intolerância e desrespeito com a imprensa. As palavras de
Bolsonaro constituem verdadeira ameaça à atividade jornalística. Lamentável tal
atitude.”
Deputado
José Guimarães (PT-CE), líder da Minoria na Câmara
"Veja o vídeo em que Bolsonaro diz querer encher a boca do repórter
de porrada. Quando perguntado sobre Queiroz, Bolsonaro partiu pra agressão
verbal contra o jornalista. Que fique registrado na história como um tirano
trata a imprensa e também o seu medo em falar sobre Queiroz.
Que fique marcada na história a tirania de quem nos governa. Bolsonaro
não mudou. Continua autoritário e vai continuar se irritando quando o assunto é
Queiroz. Ele sabe que sua família deve explicações."
Senador
Rogério Carvalho (PT-SE), líder do partido no Senado
"'A vontade que eu tenho é de encher sua boca de porrada'. É assim
que o Bolsonaro responde a um jornalista por perguntar a ele sobre uma suspeita
de corrupção. Acabou o tempo do Bolsonaro paz e amor! #forabolsonaro"
PSDB
"O presidente volta a mostrar apreço por posturas agressivas e
antidemocráticas. Desrespeita a liberdade de imprensa, em atitude que não
condiz com o cargo que ocupa. Agindo assim, não nega apenas uma resposta ao
jornalista; nega também a informação transparente aos brasileiros."
MDB
"O MDB defende a liberdade de imprensa e o respeito aos jornalistas
profissionais. O presidente da República precisa se retratar pelo que disse ao
repórter do jornal O Globo neste domingo. #PontoDeEquilíbrio"
(G1)
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