Os últimos anos dele — e em particular os últimos dias — foram atormentados por problemas de saúde. Mesmo assim, a notícia da morte de Diego Armando Maradona, devido a uma insuficiência cardíaca aguda, causou um choque na Argentina.
Esse choque revela o status divino que o astro do futebol tinha em seu país, onde seus torcedores o apelidaram de "D10S" em homenagem ao famoso número em sua camisa e em referência à palavra Deus em espanhol, Dios.
Ficaram para trás as muitas polêmicas
que Maradona suscitou ao longo de sua vida, desde sua amizade com líderes
questionados como o venezuelano Nicolás Maduro e o cubano Fidel Castro (que
coincidentemente morreu no mesmo dia, em 2016), até seus excessos com comida,
drogas, álcool e mulheres.
No dia 25, a maioria dos argentinos
parece ter apagado, pelo menos momentaneamente, a memória daquele polêmico
Maradona dos últimos anos e, em vez disso, o que se vive é uma espécie de
catarse nacional em torno da figura do "Dez".
Precisamente às 22 horas (horário
local), foram organizados aplausos em todo o país para despedir do ídolo.
Muitos clubes de futebol argentinos
aderiram à comemoração, abrindo suas portas para que os torcedores prestassem
homenagem ao ídolo argentino.
Enquanto alguns jornalistas aguardavam
do lado de fora do exclusivo condomínio onde o jogador morreu, esperando para
falar com os parentes do craque, muitos noticiários faziam transmissões a
partir do humilde bairro de Villa Fiorito, onde ele cresceu e era chamado de
"El Pelusa".
Lá os vizinhos montaram homenagens, com
velas e estandartes, e os mais velhos compartilharam com a imprensa suas
lembranças dos primeiros passos do pequeno Diego Armando, o quinto dos oito
irmãos Maradona, que desde criança despertava admiração devido ao seu talento
com a bola.
Dor nacional
A dor pela perda do ícone não é sentida
apenas nas ruas e na interminável lista de jogadores e treinadores de futebol
que compartilham seus sentimentos por meio de entrevistas e publicações nas
redes sociais.
Também atinge as mais altas esferas de
poder. O presidente do país, Alberto Fernández, fervoroso amante do futebol,
anunciou que suspendeu suas tarefas e decretou três dias de luto nacional.
Enquanto isso, o luto chegou à Copa
Libertadores, com o anúncio de que o Boca Juniors, clube argentino que teve
Maradona como sua estrela principal, não iria jogar sua partida marcada para
quarta-feira em Porto Alegre contra o Internacional.
A Conmebol anunciou por meio de um
comunicado que aceitou o pedido do Boca de adiar a partida devido "à morte
do astro do futebol Diego Maradona e seus laços estreitos com o clube
argentino".
'Diego é eterno'
Entre as centenas de milhares de
comentários que a morte do ídolo despertou em todo o mundo, um dos mais
compartilhados foi o de Lionel Messi, a quem muitos consideram o herdeiro do
futebol de Maradona.
"Um dia muito triste para todos os
argentinos e para o futebol. Ele nos deixa, mas não se vai, porque o Diego é eterno",
escreveu em seu perfil do Instagram, junto com uma foto que mostra quem foi seu
treinador entre 2008 e 2010, quando Maradona comandou a seleção argentina.
Esse sentimento de um "eterno
Diego" é compartilhado por muitos neste país.
"Maradona Imortal" foi o
título da cobertura da morte por um dos principais canais de notícias da
Argentina.
O renomado jornalista e escritor
britânico John Carlin também deu este título à nota que escreveu em homenagem a
Maradona no jornal espanhol La Vanguardia.
Entrevistado pela imprensa argentina,
Carlin falou sobre o significado dessa morte.
"É como se fosse a morte de um
Papa", comparou.
Para alguns na Argentina, a comoção
popular que a morte de Maradona gerou é semelhante à causada na época da morte
da ex-primeira-dama argentina Eva Perón, outro ícone de origens humildes que
muitos idolatraram como uma figura mítica.
Como aconteceu em 1952, muitos
argentinos saíram às ruas de forma espontânea nesta quarta-feira (25/11) para
se encontrar e lamentar a partida de seu ídolo, o que nem mesmo a pandemia do
coronavírus conseguiu evitar.
O ponto central do encontro foi o
Obelisco localizado no centro da capital, o mesmo local que testemunhou uma das
maiores celebrações que a Argentina viveu, quando a magia de Maradona levou o país
a conquistar sua segunda Copa do Mundo, em 1986 .
Imagens da Copa do Mundo no México
foram veiculadas continuamente pela televisão, intercaladas com imagens da
polícia transportando o corpo de Maradona para o necrotério, onde será
realizada uma autópsia.
Embora as autoridades tenham indicado
que não há indícios de que a morte tenha sido violenta, uma investigação foi
iniciada para determinar as causas específicas da morte.
Lenda
Enquanto isso, ao longo do dia, uma
espécie de competição foi desencadeada para ver onde aconteceria a despedida
final da estrela.
Tanto a Casa Rosada, sede presidencial,
como os estádios Boca e Argentinos Juniors (primeiro clube pelo qual o Maradona
jogou, em 1976) foram disponibilizados para o velório, assim como as
instalações da Asociación del Futebol Argentino (AFA).
Maradona está sendo velado na Casa
Rosada nesta quinta-feira.
"Hoje o futebol para. Diego está
em paz e encontra aqueles que mais amou em sua vida, seu pai e sua mãe",
disse o jornalista Víctor Hugo Morales, que descreveu Maradona como uma
"pipa cósmica" durante cobertura da Copa do Mundo no México.
"Ninguém pode se afastar, você tem
que ser um ser muito especial, ter um coração de pedra, para não sentir que a
vida levou alguém muito precioso, muito querido, mas que ao mesmo tempo
encontra alívio porque vai entrar na lenda que Diego merece", disse ele. (BBC)
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