O Brasil é o país
que mais caiu em um ranking latino-americano que mede a capacidade de cada
nação de combater a corrupção.
O ranking, divulgado nesta terça-feira (15/06), se chama Índice de Capacidade de Combate à Corrupção (CCC) e é elaborado pela entidade empresarial americana Americas Society/Council of the Americas (AS/COA) e pela consultoria britânica Control Risks.
O texto do
relatório citou entre os fatores o "desmantelamento da operação Lava Jato
em fevereiro deste ano" e a nomeação pelo governo do presidente Jair
Bolsonaro de "pessoas percebidas como menos independentes para o comando
da Polícia Federal e do Ministério Público Federal".
O Brasil já vinha
em queda desde 2019, quando o ranking foi criado. Mas no mais recente relatório
o Brasil foi o país com o maior recuo entre os 15 países analisados.
A maior parte dos índices
que tentam medir corrupção é baseada em pesquisas de percepção da população. No
entanto, o CCC tenta mapear a capacidade de cada país de acordo com 14
variáveis, como a independência das instituições jurídicas, a força do
jornalismo investigativo e o nível de recursos disponíveis para combater crimes
de colarinho branco.
O Brasil ocupa
agora a 6ª posição na América Latina, tendo sido ultrapassado por Peru e
Argentina na mais recente edição. As primeiras posições são ocupadas por
Uruguai, Chile e Costa Rica, nessa ordem.
Nomeados de Bolsonaro
Os autores usam as
14 variáveis para atribuir pontuações a cada um dos países — que nesta edição
variaram de 7,8 (do Uruguai, o país com maior capacidade de combate à
corrupção) a 1,4 (da Venezuela).
A pontuação do
Brasil é de 5,07 — uma queda de 0,45 em relação à nota obtida em 2020. Essa foi
a maior queda entre todos os países do ranking.
Entre as variáveis
medidas estão a capacidade legal (como independência do judiciário e acesso à
informação pública), democracia e instituições políticas (como qualidade do
cumprimento da lei) e sociedade civil e mídia (como qualidade do jornalismo
investigativo, melhorias na educação e comunicação em redes sociais).
"Na categoria
capacidade legal (com uma queda de quase 9% desde 2020), o país teve declínios
na independência de suas agências anticorrupção e do Ministério Público",
diz o texto do relatório.
"O Índice
reflete a nomeação pelo governo do presidente Jair Bolsonaro de pessoas
percebidas como menos independentes para o comando da Polícia Federal e do
Ministério Público Federal. As investigações sobre corrupção transnacional
também perderam ímpeto, e a operação Lava Jato foi desmantelada em fevereiro de
2021."
"A única
melhora na capacidade legal do Brasil foi um ligeiro aumento da independência
judicial, graças a iniciativas recentes para reforçar a separação entre
poderes."
Os autores também
afirmam que a pandemia de coronavírus afetou a capacidade de combate à
corrupção no Brasil.
"O Brasil
registrou queda de 11% na categoria democracia e instituições políticas, onde o
estado das relações entre os poderes executivo e legislativo foi um fator
decisivo. O capital político de Bolsonaro diminuiu durante a pandemia, levando
seus aliados a recorrerem à política de troca de favores, negociação de cargos
e uso de fundos públicos para conseguir apoio no Congresso", diz o texto.
"Níveis
elevados de polarização política também reduziram a capacidade de mobilização
dos grupos da sociedade civil. Em parte, isso reflete uma leve redução na
categoria sociedade civil e mídia. No entanto, uma variável dessa categoria, a
qualidade da imprensa, aumentou 3%. Um ecossistema de mídia vibrante no Brasil
continua a exercer uma vigilância significativa sobre problemas de
corrupção."
O relatório ainda
aponta três áreas consideradas "críticas" que precisam ser
monitoradas por todos:
- a pressão sobre
líderes escolhidos pelo governo para o Ministério Público e da Polícia Federal
para que protejam o presidente e seu círculo íntimo de investigações de
corrupção
- a nomeação de um
segundo juiz por Bolsonaro para o Supremo Tribunal Federal ainda em 2021, que
seria um indicador de quanto o governo pretende aumentar sua influência no
judiciário
- novas decisões
judiciais que beneficiaram réus da Lava-Jato, como aconteceu com o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A BBC News Brasil
entrou em contato com o governo federal para obter uma resposta sobre as
críticas feitas pelo relatório da AS/COA e ControlRisks, mas não obteve retorno
até a publicação desta reportagem.
'Patamar ruim'
O mau desempenho
do Brasil no índice CCC da AS/COA e da ControlRisks é replicado em outros
índices dedicados a medir combate à corrupção.
Um dos índices
mais famosos do mundo — o da Transparência Internacional — mostra que "o
Brasil permanece estagnado em um patamar ruim".
Em 2020, o Brasil
melhorou sua nota de percepção — de 35 para 38 pontos — mas essa oscilação
aconteceu dentro da margem de erro da pesquisa.
"Isto
significa que a percepção da corrupção no Brasil permanece estagnada em patamar
muito ruim, abaixo da média dos BRICS (39), da média regional para a América
Latina e o Caribe (41) e mundial (43) e ainda mais distante da média dos países
do G20 (54) e da OCDE (64)", disse a Transparência Internacional.
O Brasil ocupa a
94ª posição em um ranking de 180 países — atrás de Colômbia, Turquia e China, e
empatado com Etiópia, Cazaquistão, Peru, Sérvia, Sri Lanka, Suriname e
Tanzânia.
Em outubro de
2020, a Transparência havia publicado a atualização de um relatório chamado
"Brasil: retrocessos nos marcos jurídicos e institucionais
anticorrupção", em que listava interferências políticas do governo de
Bolsonaro que prejudicaram a autonomia do Ministério Público, da Polícia
Federal e do Judiciário e dizia que o primeiro ano do mandato do
procurador-geral Augusto Aras foi marcado por "um alinhamento descarado
com o presidente Bolsonaro".
Covid-19
O relatório divulgado
nesta terça-feira pela AS/COA e ControlRisks revela que a América Latina como
um todo sofreu retrocessos no combate à corrupção no ano passado.
"Em vários
países, a pandemia de covid-19 levou governos e cidadãos a focar em outras
prioridades urgentes, o que deu espaço para que políticos diminuíssem a
autonomia e os recursos de órgãos judiciais sem desencadear indignação da
opinião pública ou manifestações de rua como as testemunhadas em anos
anteriores."
"O Índice
mostra que os esforços para combater a corrupção são mais necessários em 2021
do que nunca", disse em nota o vice-presidente de política da AS/COA,
Brian Winter.
"A América
Latina está entre as regiões mais afetadas pela pandemia. Com os governos sob
crescente pressão financeira e os sistemas de saúde em muitos países
severamente afetados, os efeitos perniciosos da corrupção na sociedade são
ampliados."
Confira abaixo a
lista completa do Índice de Capacidade de Combate à Corrupção (CCC) de 2021:
1. Uruguai - 7,80
2. Chile - 6,51
3. Costa Rica -
6,45
4. Peru - 5,66
5. Argentina -
5,16
6. Brasil - 5,07
7. Colômbia - 4,81
8. Equador - 4,77
9. Panamá - 4,55
10. República
Dominicana - 4,38
11. México - 4,25
12. Paraguai -
4,08
13. Guatemala -
3,84
14. Bolívia - 2,43
15. Venezuela -
1,40
(BBC)
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