Por ter sido seminarista de Dom José e por ter convivido
com ele de um modo muito especial, ao assumir as Prorreitorias de Articulação e
Comunicação (Pro-Art.com) logo no início do ano de 2002, tive que
integrar, pela própria função, a equipe já existente do Setembro Dom José,
cujo encargo aceitei, com prazer, do 3º ano a ser celebrado até o 6º ano, em
2005, quando saí da UVA. Fui convocado por Dom Fernando Saburido para
ser Assessor de Comunicação da Diocese de Sobral para coordenar a Rádio
Educadora e o Jornal Correio da Semana, cabendo também a mim a parceria com o
Setembro Dom José, que se mantinha desde o início com uma coordenação
tripartite: a UVA, a Diocese e a Prefeitura de Sobral.
A brilhante ideia saiu da cabeça do Professor Teodoro, ao
tempo em que era Reitor da Universidade Vale do Acaraú. Motivou o Prefeito de
Sobral e o seu Bispo Diocesano, respectivamente, Cid Gomes e Dom Aldo Pagoto,
para realizarem o intento que, em 17 anos consecutivos, aconteceu, mesmo depois
que mudaram Prefeito e Bispo. Dom José havia passado, mas um outro José – o
Teodoro Soares - seu fiel e grato discípulo, sustentou a memória até ir-se
também ele aos 18 de agosto de 2016.
Já nos estávamos preparando para celebrar o 17º Setembro
Dom José, como nos anos anteriores, com o apoio total do Prof. Teodoro. Sua
partida não nos impediu de comemorar, pois, certamente, na eternidade, com o
próprio Dom José, se alegraram bastante. Nós aqui, naquele ano, rememoramos os
dois. Nunca esquecemos, nesses últimos 16 anos, de enumerar o Curriculum de Dom
José, os inúmeros títulos universitários conquistados na Universidade
Gregoriana, em Roma, inclusive o fato de “ter
sido recebido em audiência pelo Papa Pio X, por ter obtido a melhor nota na
famosa Universidade Pontifícia”.
Nossa referência à Audiência Pontifícia é porque do dia
13 de Maio de 1899 ao dia 06 de Junho de 1906 D. José estudava em Roma, fazendo
seus Cursos de Filosofia, Teologia, Sagrada Escritura e Direito Canônico, com
os respectivos Doutorados em todos. Até 1903, o Papa era Leão XIII. Foi
substituído por D. José Sarto, que escolheu o nome de Pio X. Até 1906, com o
aluno D. José, ainda em Roma, embora seu pontificado tenha ido até 1914.
Em junho de 1906 D. José foi laureado em Teologia com o
mais alto conceito dado pela Universidade Gregoriana: summa cum laude. Para coroar a magnitude de sua proeza, foi
recebido em audiência pelo Papa Pio X que queria parabenizar o “gênio brasileiro” que alcançara tão alto
conceito ou avaliação tão excepcional naquela tradicional Universidade
Pontifícia. Aquele gesto de Sua Santidade deixou em D. José uma marca especial.
Foi, como que, a glória ou o coroamento de seus esforços, até então,
empreendidos. D. José nunca esqueceu isso.
Em 1914 o Papa Pio X morreu. Substituiu-o Bento XV, que
logo em 1915 criou a Diocese de Sobral, nomeando D. José, com apenas 33 anos, o
seu 1º Bispo. O “amigo” já se tinha ido, com 79 anos de idade, mas o sucessor
não lhe desconheceu o valor. Fê-lo, tão jovem ainda, Bispo da nova Diocese.
Sabemos sua história. Contamo-la e recordamo-la sempre,
como já o fizemos inúmeras vezes: seu nascimento no dia 10 de Setembro de 1882
e a sua morte no dia 25 de Setembro de 1959. Daí o motivo do Setembro Dom José:
seu nascimento e sua morte aconteceram em SETEMBRO.
Quarenta anos após a morte de Pio X, em 1954, o Papa era
Pio XII. Ele o elevou à honra dos altares, canonizando-o como um dos santos da
Igreja. Eu ia fazer meus 14 anos de idade e me lembro bem: D. José decretou
feriado no Seminário São José de Sobral, não só para aquele dia 21 de agosto,
mas para todos os anos no dia da celebração litúrgica de São Pio X.
Poucos anos depois, em Junho de 1959, D. José teve uma
crise de “edema pulmonar” e eu estava
com ele em sua residência episcopal. Era cedo da noite quando ele se sentiu
mal. Pediu-me para, apressadamente, chamar seu médico e amigo – o Dr.
Guarany Mont’Alverne - que habitava em frente à sua casa. Imediatamente eu
o chamei e ao chegar, tomou as providências necessárias para debelar a crise e
D. José voltou ao normal. Quando todos saíram – médico, padres, seminaristas e
alguns amigos e familiares – D. José me segredou: “eu tinha certeza de que não ia morrer. Quando você saiu para chamar o
médico, apareceu-me, ali naquela parede, sorrindo, irradiante de felicidade, o
meu querido São Pio Décimo. Eu tive certeza de que não morreria dessa vez”.
De fato, permaneceu vivo até 25 de Setembro do mesmo ano.
Além de recordá-lo a cada ano, ainda guardamos inúmeras
lições de vida, mesmo após 139 anos de seu nascimento e 62 anos de sua morte.
D. José continuará inesquecível.
Depois do 17º Setembro Dom José em 2016 - um mês após a
morte do Prof. Teodoro - ainda teimamos em promover o 18º Evento em Setembro de
2017, reunindo familiares, amigos, diretores dos Institutos criados por ele, o
Museu Dom José, a Escola de Artes Universo da Música e a sociedade Sobralense
em Geral para prestarmos uma dupla homenagem aos “02 JOSÉs”: o
tradicional homenageado, Dom José Tupinambá e o criador e incentivador do
Setembro Dom José, o Professor José Teodoro.
O Teatro São João ficou repleto de gente, aplaudindo,
incentivando os artistas, motivando até um pronunciamento público na hora do
agradecimento: ‘não podemos trair essa
memória; para o ano queremos estar aqui e colaborar’.
O fato é que, já se vão 04 anos sem que sejam lembrados
os Setembros Dom José. Não me vejo mais com coragem de arregimentar os novos
integrantes da UVA, do Governo Municipal, da Diocese, da Sociedade Civil, do
Museu D. José, do Teatro S. João – coetâneo do ilustre Bispo, filho da terra –
e da Escola de Artes: Universo da Música que, dos anos 2007 a 2017, fora
parceira do Setembro D. José, promovendo o Festival “Amigos e a Música”, sempre com muito sucesso, abordando um ritmo
musical.
Dom José tinha um zelo especial pelos seus padres e seminaristas
No alto dos meus 81 anos, não me vejo mais com garra,
tempo, ousadia e disponibilidade para integrar tal equipe, embora reconheça
como necessária para manter uma tradição em honra de alguém que tanto fez por
Sobral. Não é para humilhar ninguém, mas Sobral nunca teve um administrador tão
corajoso e tão desapegado, até dos seus próprios recursos, para investir nesta
cidade com a sua mensagem de fé, sua obra material sempre na esperança de fazer
de Sobral, uma “Nova Roma”. Não era
sonhar demais? E ele conseguiu.
Dom José - sem ter estudado a Teologia da Libertação, sem
falar de CEBs ou de “Comunidade de Comunidades”, sem adesão alguma às ideias
liberais ou ao positivismo de sua época, sem propagar a nascente Doutrina
Social da Igreja, nem mesmo sem ser um visionário socialista – enveredou pela
junção de fé e obra, de esperança e política, de oração e ação como o fizeram e
ainda fazem tantos outros homens de Igreja. Colocou até seu patrimônio pessoal
a serviço da Paróquia da Conceição, como seu 12º Pároco e, mais tarde, a
serviço da Diocese, como seu 1º Bispo a partir de 1915, com aquela pertinaz
ideia de fazer de Sobral uma miniatura de Roma. Não mediu esforços.
Criou muitas Associações Religiosas, Irmandades, Catequese,
Ordens Terceiras, para vivenciarem as Festas de Padroeiros, as procissões e
demais práticas religiosas. Imprimiu no povo as tradições essenciais da vida
cristã, dando ênfase à Santa Missa, aos Sacramentos, à Ação Missionária de tal
modo que plantou muitas raízes e boas tradições no coração da família
sobralense, que perduram até hoje.
Fundou o Asilo da Mendicidade, alicerce para a futura
Santa Casa de Misericórdia, o Seminário São José para a formação de
sacerdotes, hoje sede da UVA (Universidade Vale do Acaraú), o Abrigo Sagrado
Coração de Jesus, o Colégio Diocesano Sobralense, o Colégio Santana, o
Patronato Imaculada Conceição, o Jornal Correio da Semana e, mais tarde, a
consequente Rádio Educadora, o Comitê Municipal contra o analfabetismo,
o Palácio Episcopal, onde habitava e já funcionava o seu Museu
Diocesano, hoje Museu Dom José, o Cine Teatro Gloria, a Casa de
férias para si e para seus seminaristas na Serra da Meruoca, mais tarde
Centro de Treinamento Diocesano. Para a Administração de Recursos e de doações
para construir tantas obras e até movimentar rendas pessoais e da diocese,
ousou erigir o Banco de Crédito Popular, transformado mais tarde no
BANCESA, que movimentou por um bom tempo a economia local. Dom José foi, de
fato, um dos maiores mentores, incentivadores, construtores e administradores
do desenvolvimento de Sobral. Ninguém nega.
Também, pudera! Um homem culto; falava, fluentemente,
várias línguas. Conhecia música erudita e tinha um ouvido afinadíssimo. Ao
ouvir uma voz destoante no Coral do Seminário, em pleno Pontifical na Igreja da
Sé, corrigia publicamente e mandava cantar de novo, desfazendo o erro.
Como não homenagear este homem, como deixá-lo no
esquecimento ou não lhe ter tanto respeito pelo “monstro sagrado” que ele foi? No início deste ano, fui procurado
pelo Padre João Paulo, Pároco da Catedral e Chanceler da Cúria Diocesana de
Sobral, demonstrando interesse em conhecer a história da caminhada do Setembro
Dom José para retomá-la, quem sabe, nos próximos anos. Dei-lhe estas
informações acima descritas. Ele é jovem e capaz de dar um novo destino a tudo.
Vá em frente, meu irmão! Se eu ainda estiver vivo e puder colaborar com alguma
lembrança dos fatos, conte comigo.
(*) Mons. ASSIS ROCHA - Sacerdote aposentado, Mestre e Doutor em Comunicação Social, residente em Bela Cruz – CE.
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