Em junho, o presidente Jair Bolsonaro (PL) e
ministros receberam no Palácio da Alvorada parlamentares da comissão de
segurança pública e entidades representativas de policiais, que defendem a
aprovação de uma nova lei orgânica para as polícias: pressionavam pela votação
como uma forma de aceno às bases do presidente na segurança pública, já que a
lei orgânica é mais abrangente e traz outros benefícios.
O governo federal acompanhou todos os passos da
preparação do projeto, elaborado em consulta às associações, e também fez
sugestões, por intermédio do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Originalmente, a limitação ao poder dos
governadores havia sido incluída no projeto de lei orgânica das PMs. Uma ideia
semelhante foi criada para nomeação dos delegados-gerais de Polícia Civil, que
discutiam sua organização à parte. Nenhuma das duas leis orgânicas, no entanto,
avançou a ponto de ser votada pelos deputados.
Houve forte reação de governadores descontentes,
quando o Estadão revelou o teor dos projetos em gestação, em janeiro do ano
passado. Ao longo de meses de debates, os parlamentares responsáveis pela
elaboração da proposta recuaram e aceitaram retirar a lista tríplice e o
mandato dos comandantes do escopo da lei orgânica. Não havia consenso nem
sequer entre os atuais comandantes-gerais, que foram consultados por meio de um
conselho nacional.
Agora, os deputados da bancada da bala decidiram
retomar o assunto e acelerar a tramitação da proposta durante o esforço
concentrado pré-eleitoral. A meta é colocar em discussão e votação o projeto
com o propósito de instituir a lista tríplice como forma de escolha dos
comandantes. A última versão ainda garante aos comandantes a prerrogativa de
“elaborar a proposta orçamentária” das corporações.
O projeto de lei é de autoria do deputado José
Nelto (PP-GO), mas foi modificado por parlamentares bolsonaristas. Fizeram
contribuições a deputada Major Fabiana (PL-RJ) e o Cabo Junio Amaral (PL-MG),
ambos ex-policiais militares. Os favoráveis à ideia argumentam que visam
reduzir a “ingerência política” e influência partidária dos governadores nas
PMs.
Limites
O PL 164/2019 diz que o comando-geral de policiais
e bombeiros militares será exercido por oficial da ativa do último posto,
atualmente coronel, escolhido pelo governador a partir de lista tríplice. Essa
lista será encaminhada ao governador depois de uma votação interna sigilosa,
que envolverá todos os oficiais da ativa. Poderão concorrer os dez coronéis
mais antigos.
O escolhido comandante-geral exercerá um mandato de
dois anos e poderá ser reconduzido ao cargo, a critério do governador, uma vez.
Já se o governador desejar destituir o comandante-geral, ele precisará de
aprovação por maioria de votos dos deputados estaduais ou distritais. Nenhuma
dessas amarras existe atualmente, e a escolha dos governadores é livre dentro
da corporação.
Para o Instituto Sou da Paz, a lista tríplice, além
de limitar o controle do chefe do Executivo sobre o braço armado dos Estados,
fortalece a agenda corporativa dos comandantes e recrudesce disputas políticas
internas, com campanhas para coronéis concorrerem à indicação a cada dois anos.
“O projeto que se propõe limitar ingerências
políticas indevidas nas polícias acabaria na prática por acirrar ainda mais a
politização entre seus membros, realidade incompatível com uma instituição
militar e prejudicial para a própria função policial”, afirmou o Sou da Paz por
meio de nota. O texto entrou na pauta da Comissão de Segurança Pública,
dominada por deputados da base do governo e bolsonaristas ligados ao setor. Os
deputados começaram a discutir o assunto em julho, mas adiaram a votação, por
causa de pressões de governadores sobre o Planalto.
Pelo perfil do colegiado, os parlamentares
envolvidos no debate entendem que o projeto será aprovado com facilidade, mas
pode voltar a ser discutido de forma mais ampla se a lei orgânica retornar à
pauta. O ritmo de votação pode ser expresso. O projeto segue direto ao Senado,
sem passar pelo plenário da Câmara, se aprovado nas comissões de Segurança
Pública e de Constituição e Justiça.
Especialistas em segurança pública já manifestaram
uma série de ressalvas à lista tríplice nas polícias e dizem que, nos
bastidores, a intenção de Jair Bolsonaro e sua base aliada no Congresso é
desvincular as PMs dos governadores.
Estudos já mostraram adesão de policiais militares,
base eleitoral do presidente, a ideias autoritárias defendidas por ele e seus
apoiadores em ambientes virtuais. Há temor, mesmo nas Forças Armadas, de que
facções de PMs se insurjam contra o resultado eleitoral desfavorável ao
presidente, junto à militância bolsonarista e grupos civis armados, como os CACs
(caçadores, atiradores e colecionadores).
(Jornal do Brasil)
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