quinta-feira, 11 de julho de 2024

Como preparar o SUS frente às previsões de aumento da obesidade em crianças e adolescentes


Pesquisas nacionais lançadas recentemente indicam que a obesidade entre crianças e adolescentes representa uma carga financeira de cerca de R$ 225 milhões ao Sistema Único de Saúde (SUS). Se nada mudar, a situação tende a piorar nos próximos 20 anos em todas as faixas etárias de 5 a 19 anos.


Segundo um dos levantamentos divulgados no final de junho durante o Congresso Internacional sobre Obesidade, caso as tendências atuais entre crianças e adolescentes sejam mantidas, o problema vai aumentar em todas as idades até 2044. A prevalência para o grupo de 5 a 9 anos pode chegar a 24%. Já na população de 10 a 14 anos, o índice tem potencial de alcançar 15% e, para idades de 15 a 19 anos, 12%.  


Com base nos padrões observados no Brasil, de 1985 a 2019, os índices podem aumentar de 22,1% para 28,6% em meninos de 5 a 9 anos até 2044. Entre as meninas dessa faixa etária, o problema pode aumentar de 13,6% para 18,5% no mesmo período. 


Outro estudo brasileiro, apresentado no mesmo evento, indica que os gastos hospitalares excessivos vinculados à obesidade infantil e adolescente no SUS ultrapassam os custos totais de hospitalização para todas as doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas do Código Internacional de Doenças (CID-10).

Eduardo Nilson, pesquisador do Programa de Alimentação, Nutrição e Cultura da Fiocruz Brasília e integrante das equipes que elaboraram os levantamentos, afirma que a mudança "intensa" nos hábitos alimentares brasileiros são o fator que mais impulsiona esse cenário.


“Por trás disso tudo, um dos principais fatores que as evidências apontam é o padrão alimentar sendo modificado na população brasileira. É uma substituição na nossa dieta tradicional - baseada em alimentos in natura, como feijão, arroz, salada, frutas, fontes de proteína - por produtos ultraprocessados, que, inclusive, não podem ser chamados de alimentos, porque são formulações industriais que substituem esses alimentos na nossa dieta."


Em participação no podcast Repórter SUS, ele explicou que a ciência observa o avanço da obesidade em toda a população a partir das últimas décadas do século passado. Essa realidade passou a impactar populações mais vulneráveis, como crianças e adolescente, nos anos 1990.


Os estudos também apontam que a solução para o problema está na implementação de políticas públicas amplas, coletivas e de regulação da indústria e do comércio de alimentos com pouco valor nutricional e que fazem mal à saúde. 


Dados de 2022 do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (Nupens/ USP) mostram que 28% do aumento da obesidade entre 2002 e 2009 no Brasil foi causado pelo consumo de ultraprocessados. 


"Como a obesidade é um problema complexo, ele vai exigir soluções complexas, que vão envolver múltiplas estratégias, políticas intersetoriais. Não é uma responsabilidade única do setor saúde", enfatiza Nilson. Segundo ele, é preciso desenvolver métodos mais adequados para chegar a dados mais amplos e próximos da realidade.


O pesquisador contou que, no período de 2013 a 2022, somente R$ 5 milhões estavam identificados como custos diretos da obesidade. "Sabíamos, com certeza, que não era isso. Vamos ter que desenvolver metodologias para identificar essa questão, porque a obesidade infantil e na adolescência está associada à questão da prematuridade das doenças crônicas."


Entre as consequências potenciais estão hipertensão, diabetes, doenças renais e, inclusive, o agravamento de condições não crônicas. Um exemplo é a covid-19, que traz mais riscos para pessoas obesas ou com sobrepeso. "Há evidências científicas que mostram que isso acontece, inclusive para um outro grande conjunto de doenças", alerta Nilson.


Os mais de R$ 200 milhões investidos no SUS para responder a esse cenário custeiam internações, procedimentos e medicamentos. Mas combater o problema com efetividade exige ações de prevenção, educação, distribuição de renda e políticas capilarizadas. 


Os estudos brasileiros sobre o tema foram desenvolvidos por meio de parceria entre o Instituto Desiderata, o Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens), da Universidade de São Paulo (USP), e o Programa de Alimentação, Nutrição e Cultura (Palin) da Fiocruz Brasília. 

 

*O Repórter SUS é uma parceria entre o Brasil de Fato e a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz)

 

(Brasil de Fato)

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