Ter
autorização da chefia para poder trabalhar de casa pode ser fundamental para
alguns trabalhadores e trabalhadoras que já disponham de mesas, cadeiras,
softwares ou outros itens que auxiliem no cumprimento de suas tarefas. Isso
porque muitas vezes não têm o básico no local de trabalho.
Na
rede social X, um usuário cadeirante e que busca descomplicar as discussões
sobre deficiência relata que já foi selecionado para uma vaga de emprego e logo
depois dispensado pelo potencial empregador. A razão foi que, embora seu
currículo de advogado fosse ideal para o escritório ao qual se candidatou, sua
cadeira de rodas não passava entre os batentes da porta do banheiro.
A
pesquisa divulgada mostra que um terço dos respondentes (33%) afirma que seu
ambiente de trabalho não é devidamente adaptado a eles. Além disso,
praticamente todos os participantes disseram que se apresentam, durante um
processo seletivo, como pessoas com deficiência ou neurodivergência, o que pode
deixar implícitas duas coisas: que uma parcela ainda não se sente confortável
para se declarar como tal, talvez por medo de perder a vaga, ou não se
descobriu assim, por minimizar deficiências, considerando que não precisariam
ser mencionadas, ou por não ter confirmado um diagnóstico ou desconhecer
condições de saúde que se encaixam nessa classificação.
Entre
os diagnósticos que estão no grupo das neurodivergências estão o transtorno de
déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), transtorno do espectro autista
(TEA), transtorno afetivo bipolar, altas habilidades, entre outros. É comum que
quem tem TDAH, por exemplo, seja erroneamente tachada de pessoa sem interesse
pelos estudos ou pelo trabalho, quando, na realidade, tem um modo singular de
se concentrar em suas tarefas, que deve ser observado e respeitado.
O
levantamento ainda destaca que, para um quarto dos respondentes, a existência
de programas de inclusão e acessibilidade nas empresas é um fator determinante
na tomada de decisões profissionais. Ao buscar emprego, quase metade deles
(47%) escolheria ou iria preferir vagas exclusivas para pessoas com deficiência
ou neurodivergência, enquanto a maioria (49%) se candidataria para qualquer
vaga.
A
diretora Lia Calder, da companhia 4CO, que presta serviços de consolidação de
ações de diversidade e inclusão e elabora publicações sobre o assunto, diz que,
apesar de o Brasil contar com uma política, desde 1991, que visa implementar
medidas nas empresas com mais de 100 funcionários, não houve tantos avanços. Na
prática, o que se observa é um cenário ainda distante do ideal, que não tem
sido transformado nem mesmo pelas leis vigentes no país.
Segundo
a especialista, algo revelador sobre a mentalidade do empresariado brasileiro
em geral é o fato de que prefere ficar suscetível a denúncias do Ministério
Público do Trabalho (MPT), que podem se desdobrar em processos judiciais que
impõem penalidades, a fazer o que é preciso, já que é ele quem deve se adaptar
aos funcionários com deficiência ou neurodivergência e não o contrário. "E
onde estão as pessoas com deficiência dentro das organizações? Em geral, nos
cargos de base. São pessoas que entram pela base da pirâmide hierárquica e ali
se mantêm fazendo as mesmas funções por 10, 15, 20 anos. Isso mostra que não
existe um comprometimento por parte das organizações em relação ao
desenvolvimento profissional dessas pessoas", comenta Lia, que também é
professora na área de diversidade e inclusão.
A
diretora lembra que tudo isso são barreiras e comprovações de que o Brasil não
está cumprindo o que foi acordado em 2008. Naquele ano, Convenção sobre as
Pessoas com Deficiência, da ONU, foi aprovada pelo Congresso Nacional e passou,
em agosto de 2009, a fazer parte da Constituição Federal. Com o dispositivo,
explica Lia, o que se sinalizou foi que derrubar tais obstáculos é
responsabilidade compartilhada entre sociedade e organizações.
"E
elas são, muitas vezes, o que acho mais problemático, naturalizadas. Quando a
gente vai a um ambiente, tem por natural que ele não seja acessível. Quando a
gente está lidando com o ambiente de trabalho e não consegue se comunicar com
um colega, é natural que não consiga", diz.
"A
gente tem por natural que não consiga conviver, se comunicar ou desenvolver
essas pessoas com deficiência e neurodivergentes. E é essa naturalização que
continua replicando e propagando essa exclusão muito triste e aterrorizante
dentro do ambiente organizacional", critica.
Dados
do IBGE
Apenas muito recentemente, em 2023, o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) reuniu e divulgou dados específicos sobre pessoas com
deficiência. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) evidencia a
discrepância entre a porcentagem de pessoas com deficiência que estão
empregadas e as que não têm deficiência e também trabalham. É 26,6% contra
60,7%.
O
IBGE aponta, ainda, que cerca de 55% das pessoas com deficiência que trabalham
estão em situação de informalidade, ou seja, não têm carteira assinada. Seu
rendimento médio é R$ 1.860, enquanto o de pessoas sem deficiência é R$ 2.690,
uma diferença de 30%. (JB/Ag. Brasil Por Letycia Bond)
Nenhum comentário:
Postar um comentário