Mas também existem vozes no empresariado e no mundo político americano que estão tentando convencer o presidente americano Donald Trump a reduzir ou desistir das tarifas contra o Brasil, que devem entrar em vigor na sexta-feira (01/08).
Desde que Trump anunciou, em 9 de julho, que uma nova sobretaxa de 50% será imposta, ele e o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ainda não conversaram para tentar chegar a um acordo, algo que vem sendo cobrado amplamente.
O diálogo entre Trump e Lula foi
pedido pela U.S. Chamber of Commerce e pela Câmara Americana de Comércio para o
Brasil (Amcham Brasil), duas das principais organizações que representam os
interesses do setor privado americano.
As entidades publicaram uma nota
conjunta solicitando que os dois países "se engajem em negociações de alto
nível a fim de evitar a implementação da tarifa de 50%".
"Mais de 6,5 mil pequenas
empresas nos Estados Unidos dependem de produtos importados do Brasil, enquanto
3,9 mil empresas americanas têm investimentos naquele país", disseram as
entidades em nota.
"O Brasil está entre os dez
principais mercados para exportações dos Estados Unidos e é destino, a cada
ano, de cerca de US$ 60 bilhões em bens e serviços americanos."
Diante do impasse, outros empresários
americanos também se mobilizaram. As importadoras de suco de laranja Johanna
Foods e Johanna Beverage Company foram ao Tribunal de Comércio Internacional
(CIT, na sigla em inglês) dos Estados Unidos pedir alívio emergencial diante da
possível alta nos preços com a nova tarifa.
Com produção em queda nos EUA,
o Brasil se tornou o principal fornecedor de suco de
laranja para o mercado americano, que responde por 41,7% das
exportações brasileiras.
No documento, as empresas afirmam que
novas taxações poderão forçar um aumento de 20 a 25% no preço final para o
consumidor e colocariam em risco 700 empregos.
As projeções pessimistas estão
surgindo nas mais variadas dimensões. Da imensa indústria do suco de laranja a
um pequeno café no Maine, extremo nordeste dos EUA.
Ali, a proprietária do Rock City,
Jessie Northgraves, publicou nas redes sociais um comunicado aos seus clientes
na semana passada com más notícias.
"Nossos preços aumentarão na
próxima semana e esperamos também compensar a possibilidade iminente de uma
tarifa de 50% sobre os grãos de café do Brasil."
No comunicado, Northgraves explica
que nos últimos seis meses o preço do café vinha subindo como nunca antes.
Mudanças climáticas e aumento no consumo da bebida explicam esse aumento.
O café, assim como o suco de laranja,
é um dos produtos mais sensíveis ao tarifaço porque os Estados Unidos importam
em grande quantidade do Brasil.
O país é o maior comprador do produto
brasileiro. No ano passado, os EUA receberam 16,4% das exportações de café do Brasil,
segundo o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).
Diante das taxas já impostas por
Trump sobre diversos produtos e na iminência de novas tarifas, o reajuste teve
de ser repassado aos consumidores. E as perspectivas não são animadoras.
"Na minha opinião, a situação
toda parece estar se agravando. Já estamos pagando tarifas de 10% sobre os
grãos provenientes de todos os lugares de onde os adquirimos, e parece haver o
risco de as tarifas do Brasil aumentarem para 50%, o que seria
devastador", disse Northgraves à BBC News Brasil.
No setor de aviação, a SkyWest,
companhia aérea dos Estados Unidos que encomendou 74 aviões da Embraer, também
criticou o tarifaço.
Na semana passada, o CEO da empresa,
Chip Childs, afirmou que não pretende pagar a tarifa de 50% sobre jatos
encomendados até 2032 com a empresa brasileira, caso a medida entre em vigor.
A declaração foi dada durante a
apresentação do balanço financeiro do segundo trimestre da empresa.
"Temos a sensação de que as
pessoas estão entendendo a importância disso para pequenas comunidades nos
Estados Unidos, o impacto econômico disso para o nosso país", disse
Childs.
"Vamos continuar lutando muito
para avançar nessa frente das tarifas."
Na mesma reunião, o diretor comercial
da SkyWest, Wade Steele, também admitiu a possibilidade de adiar entregas
combinadas com a empresa brasileira.
"Se a tarifa de 50% com o Brasil
for implementada, planejamos trabalhar com nossos principais parceiros e a
Embraer para adiar a entrega até que a situação tarifária seja resolvida",
disse.
Em abril, Trump já havia anunciado tarifas de 10% sobre
produtos brasileiros. A SkyWest já teve que arcar com essas tarifas, com custos
adicionais em dois jatos entregues no segundo trimestre.
A Embraer é a principal exportadora de bens de alto valor agregado do
Brasil e tem nos Estados Unidos seu mercado mais importante.
As exportações para clientes
americanos representam 45% nos jatos comerciais e 70% nos jatos executivos da
empresa brasileira.
Segundo estimativas da própria
Embraer, caso a tarifa de Trump se confirme em 50%, a empresa terá um custo
adicional de US$ 9 milhões (cerca de R$ 50 milhões) ao preço de cada aeronave
para seus clientes.
'Abuso de poder'
No Congresso americano, também há
movimentações em curso. Na quinta-feira passada (24/07), um grupo de 11
senadores democratas enviou uma carta a Trump pedindo o fim do tarifaço
comercial contra produtos brasileiros, mencionando "abuso de poder"
contra o Brasil.
Segundo os parlamentares, a taxação
vai aumentar os custos para famílias e empresas americanas.
"Os americanos importam mais de
40 bilhões de dólares anualmente do Brasil, incluindo quase 2 bilhões de
dólares em café. O comércio entre EUA e Brasil sustenta cerca de 130 mil
empregos nos Estados Unidos, que estão ameaçados com a imposição de tarifas
elevadas", diz o grupo na carta.
"O Brasil também prometeu
retaliar, e o senhor antecipadamente prometeu responder na mesma moeda — o que
significa que os exportadores americanos sairão prejudicados e que os impostos
sobre importações pagos pelos americanos ultrapassarão os 50% que o senhor
ameaçou impor."
Os senadores acrescentaram que tinham
"sérias preocupações quanto ao claro abuso de poder presente em sua
recente ameaça de iniciar uma guerra comercial com o Brasil".
"Os Estados Unidos e o Brasil
têm questões comerciais legítimas que devem ser discutidas e negociadas. No
entanto, a ameaça tarifária do seu governo claramente não diz respeito a
isso", escreveram os senadores.
Já os deputados que presidem o
Congressional Coffee Caucus, uma espécie de comissão no congresso americano
para debater temas relacionados ao setor de café, enviaram no fim de junho uma
carta com apoio bipartidário ao embaixador do comércio dos EUA, pedindo a
isenção do produto das tarifas atuais e futuras.
Na carta, os deputados Jill Tokuda
(democrata, Havaí) e William Timmons (republicano, Carolina do Sul) disseram ao
representante comercial dos EUA, Jamieson Greer, indicado por Donald Trump, que
a isenção é necessária "para proteger os empregos americanos e garantir a
vitalidade contínua de uma indústria que depende quase inteiramente de
importações".
Eles lembram que, ao contrário de
outros produtos afetados pelas novas tarifas, o café nos Estados Unidos não é
produzido em escala capaz de suprir a demanda interna. De acordo com o
documento, a produção americana de café, cultivado no Havaí e em Porto Rico,
não representa nem 1% do consumo da bebida no país.
Nesta terça, o secretário de Comércio
dos Estados Unidos, Howard Lutnick afirmou à rede CNBC que alguns produtos não
cultivados nos EUA poderiam estar isentos das taxações. Dentre eles o café, a
manga, o abacaxi e o cacau.
Lutnick, no entanto, não mencionou o
Brasil. "Se vamos negociar com um país que produz manga ou abacaxi, então
eles podem entrar sem tarifa. Café e cacau são outros exemplos de recursos
naturais", completou.
Portanto, ainda não é possível saber
a dimensão do impacto que a nova tarifa causará no bolso dos consumidores
americanos, acostumados a tomar ao menos três xícaras da bebida por dia.
Mas ao menos os clientes do Rock City
Coffee já estão pagando mais caro pela bebida.
"As tarifas prejudicarão nossos
negócios, pois não conseguiremos manter nossas margens de lucro sem aumentar os
preços – e, se esses preços subirem o suficiente, poderemos perder clientes
para empresas maiores e mais capazes de absorver custos e manter os preços
baixos", afirmou Northgraves.
'Tarifa proibitiva'
O National Foreign Trade Council
(Conselho Nacional de Comércio Exterior) já considera a tarifa de 10% imposta
pelo governo Trump após 2 de abril uma mudança muito significativa na
capacidade das empresas americanas de importarem do Brasil.
Agora, a tarifa de 50% prevista para
entrar em vigor em 1º de agosto pode inviabilizar negócios com o parceiro
comercial. É o que afirma Tiffany Smith, vice-presidente de Comércio da
entidade, que representa grandes empresas em temas de comércio e investimento
internacional.
"O Brasil tem mantido superávit
comercial com os Estados Unidos. E uma tarifa de 50% coloca o país entre os que
enfrentam as taxas mais altas no atual ambiente de tarifas recíprocas. É algo
que consideramos bastante preocupante", disse à BBC News Brasil.
"Uma tarifa nesse nível seria
proibitiva para a maioria dos produtos. A expectativa é que as importações do Brasil
parem, em muitos casos, enquanto essa tarifa estiver em vigor. Pode haver
alguns produtos que suportem uma tarifa tão alta, mas não seriam muitos."
Segundo ela, empresas americanas
podem tentar minimizar os impactos transferindo a produção para outros países.
Mas essa alternativa nem sempre é viável, principalmente a curto prazo.
"Por conta de contratos em vigor
ou exigências técnicas, como peças automotivas que precisam atender a padrões
específicos de segurança. Essas adaptações não ocorrem rapidamente",
afirma Smith.
"Nesses casos, as empresas
teriam que repassar os custos para os consumidores ou absorver perdas
significativas em suas margens de lucro."
Smith avalia que a política tarifária
reflete uma "convicção forte do presidente" de que os parceiros
comerciais precisam abrir mais seus mercados para empresas americanas.
"No caso do Brasil, a ideia é
que, mesmo com superávit, poderia haver espaço para ampliar as exportações dos
EUA. Mas a linguagem da carta sugere que considerações políticas também podem
ter influenciado a decisão."
Ela ressalta que a tarifa de 50% pode
ser apenas o início de uma mudança mais ampla na relação comercial entre os
dois países.
"O resultado desse processo, que
deve levar alguns meses, pode resultar na imposição de novas tarifas ou outras
medidas, além da tarifa já anunciada."
Nesta segunda-feira (28/07), uma
missão especial do Senado esteve na Câmara Americana do Comércio, em
Washington, para uma reunião com lideranças empresariais e representantes do
Conselho Empresarial Brasil-Estados Unidos.
Após a reunião, o senador Carlos
Viana (Podemos-MG) afirmou que uma conversa entre Trump e Lula está sobre a
mesa.
"Nós estamos dialogando neste
momento", afirmou o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), no fim da tarde
de segunda-feira (28/7) em entrevista coletiva.
Ao ser perguntado se havia falado com
Lula sobre a possibilidade de uma conversa entre ele e Trump, afirmou que ainda
não. "Mas o presidente Lula é o homem do diálogo. Sempre defendeu o
diálogo", disse.
(Fonte:
BBC)
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