A
condenação não tem efeito imediato de prisão: a defesa de Bolsonaro e outros
sete aliados condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ainda podem
recorrer para tentar reverter as sentenças pelos cinco crimes dos quais foram
acusados: organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do
Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência
e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.
De qualquer forma, a condenação do ex-presidente enfraquece a ala bolsonarista, conforme aponta à Sputnik Brasil a cientista política Mayra Goulart, professora da Universidade Federal Rio de Janeiro (UFRJ).
Segundo ela, o julgamento põe em discussões temas como problemas com a Justiça e a figura da prisão, que afastam os eleitores mais moderados que definirão a eleição do próximo ano. "A eleição para a presidência vai ser vencida por aquele candidato capaz de atrair as franjas do outro espectro ideológico."
"Os
dois campos, nenhum tem uma maioria inquestionável. São esses eleitores que
estão menos politizados, menos interessados, que podem definir a eleição."
Em
meio a essa disputa política está o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cujas
pesquisas de popularidade já sinalizavam uma alta pela forma que se portou
diante das tarifas da Casa Branca. Para a especialista, a decisão do julgamento
confere fôlego a Lula para o próximo pleito, pela postura distante que adotou
diante da atuação do STF.
A
analista afirma ainda que o julgamento tem caráter histórico tanto por colocar
um ponto final em uma história de intervencionismo militar na política, quanto
por servir de exemplo global, como noticiou o New York Times.
"É
um caminho que está sendo apontado para como as instituições
democrático-liberais podem reagir a uma extrema direita que é a principal
ameaça que tem proliferado nos últimos anos contra o sistema
democrático-liberal. O STF, enquanto parte desse sistema institucional, está
apontando um caminho."
Por
outro lado, o cientista político Elias Tavares defende que a condenação de
Bolsonaro até "mexe com a direita", mas não enfraquece a figura do
ex-presidente como principal nome da direita.
"De
um lado, ela fragiliza juridicamente o ex-presidente, mas de outro reforça sua
narrativa de perseguição, que ainda tem muito apelo junto à sua base."
Em
sua opinião, o governador de são Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP),
nome mais cotado para representar a direita no lugar de Bolsonaro em 2026, já
percebeu isso, e fez um gesto claro de aproximação com a ala bolsonarista em
seu discurso do 7 de setembro.
"Ele
sinalizou que está disposto a encampar essa retórica da perseguição política,
herdar esse capital simbólico e, ao mesmo tempo, mostrar que pode ser o nome de
continuidade. Tarcísio tem uma vantagem estratégica: governa São Paulo, o maior
colégio eleitoral do país, está bem avaliado e, se fosse candidato à reeleição,
teria uma situação confortável."
Segundo
o analista, essa posição confere a Tarcísio "capilaridade e musculatura
política" que nenhum outro possível nome da direita tem no momento.
"Por
isso, sim, ele [Tarcísio] tende a ser o maior beneficiado, embora exista também
o risco de divisão, já que uma parte da direita deve se manter fiel a Bolsonaro
até o fim."
Nesse
contexto, Tavares afirma que a condenação de Bolsonaro traz consigo um
paradoxo: enfraquece o seu nome como opção institucional, mas fortalece sua
imagem como mártir político, sobretudo em setores que enxergam a Justiça como
adversária.
"Do
ponto de vista prático, ele perde condições de ser o candidato central da
direita, mas do ponto de vista simbólico, ele ainda mobiliza. Essa narrativa de
perseguição política vai manter Bolsonaro em evidência e, inevitavelmente,
transfere parte desse capital para Tarcísio, que se coloca como herdeiro
natural desse eleitorado."
Por
outro lado, a esquerda também ganha. Segundo o especialista, o episódio
"serve como um contraponto imediato que fortalece a narrativa
lulista".
Para
Tavares, o elemento que será decisivo para as eleições de 2026 será o que ele
aponta como "eleitor-pêndulo", aquele de centro, que não se
identifica "nem com o lulismo nem com o bolsonarismo", e que, assim
como ocorre nos EUA, ora pende mais para a esquerda, ora para a direita.
"Só
que, até o momento, eu não enxergo uma terceira via consistente que consiga
captar esse eleitor de forma autônoma. Então, a tendência é que a polarização
continue, porque esse eleitor-pêndulo acaba sendo disputado entre Lula e
Bolsonaro ou, em um cenário sem Bolsonaro, entre Lula e Tarcísio."
(JB)
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