LISBOA - No primeiro ano em que o acordo ortográfico da língua
portuguesa começa a ser aplicado em Portugal, o secretário de Estado da Cultura
do país, o escritor Francisco José Viegas, quer mudanças. Para as modificações,
seria preciso reunir representantes dos oito países de língua portuguesa.
Só neste ano os alunos portugueses começaram a
aprender a nova ortografia e apenas em janeiro os serviços públicos passaram a
ter de usar o acordo nas as comunicações escritas.
A questão foi levantada por Viegas numa entrevista
televisiva. Ao Estado,
Viegas disse que o problema é o caso da ortografia dupla que passou a existir.
Aplicando a regra de que as consoantes não
pronunciadas devem ser eliminadas, se por um lado em vez de “acto” os
portugueses passaram a escrever “ato” ou “Egipto” virou “Egito”, surgiram novas
divergências entre os dois lados do Atlântico: com a nova ortografia, em
Portugal “espectador” passou a ser “espetador”, “recepção” ganhou a forma
“receção” e “cacto” se tornou “cato”. Também foram mantidas diferenças em
acentos, como em “Antônio” e “António” e “gênero” e “género”.
“Não mencionei a necessidade de alterar o acordo
ortográfico. Mencionei incorporar pequenas alterações pontuais, que têm a ver
com aquilo que o próprio acordo dispõe, sobre o que é pronúncia culta,
pronúncia corrente e a sua correspondente ortografia”, explicou Viegas.
Viegas, formado em linguística, não quis indicar
quais as mudanças no acordo seriam necessárias. “Isso não depende do poder político,
mas dos especialistas e acadêmicos. Não pode ser o poder político a alterar,
são as academias (Brasileira de Letras e das Ciências, de Portugal) que têm de
fazer esse trabalho.”
Na entrevista, ele afirmou que a possibilidade de
alterar o acordo estava prevista. “Temos um quadro que nos impõe que até 2015 o
acordo esteja completamente implementado. Até dezembro de 2012 podem ser feitas
algumas sugestões de alterações. Aquilo que eu fiz foi simplesmente abrir uma
porta.” Viegas diz ser a favor do acordo. “A partir de 1.º
de janeiro de 2010, eu tinha uma coluna diária no Correio da Manhã que era
escrita segundo o acordo ortográfico. Eu fui o primeiro colunista a ter uma
coluna diária seguindo o acordo.”
A polêmica atual a respeito do acordo começou depois
que o poeta Vasco Graça Moura assumiu o cargo de diretor de uma das mais
importantes instituições culturais do país, o Centro Cultural de Belém, em
fevereiro. Sua primeira medida foi uma norma suspendendo a aplicação do acordo
ortográfico nos serviços sob sua tutela. Na sequência, surgiu uma petição na internet para
que o Parlamento vote o fim do acordo. E o professor Ivo Barroso, da Faculdade
de Direito de Lisboa, entrou com um processo pedindo a inconstitucionalidade do
acordo ortográfico.
Estranheza. O romancista e
presidente da Comissão de Língua Portuguesa do Ministério da Educação
(Colip-MEC), Godofredo de Oliveira Neto, encarou com estranheza as declarações
de Viegas. “O acordo já foi discutido nas instâncias acadêmicas e políticas
competentes. Não faz sentido discutir tudo de novo.” Ele recorda que o Brasil
também poderia ter críticas a aspectos pontuais do acordo - como a abolição do
trema -, mas decidiu ceder para garantir a adoção da proposta. / COLABOROU
ALEXANDRE GONÇALVES (Estadão)
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