Um
relatório do governo da Grã-Bretanha indica que não existe "nenhuma
relação óbvia" entre leis mais duras e níveis de consumo de drogas. A pesquisa comparou
a legislação do Reino Unido com 13 países, como Portugal, Uruguai e alguns
Estados americanos.
O
documento afirma que, em Portugal, onde a posse de pequenas quantidades de
drogas não resulta em sanções penais, a descriminalização combinada com outras
políticas conseguiu reduzir o uso de todas as drogas e de casos de doenças
relacionadas a elas, como a infecção pelo HIV.
O
secretário do Interior britânico, o liberal democrata Norman Baker, disse que
os resultados devem alertar para o fim da "retórica sem sentido"
sobre drogas e mudar o foco para o tratamento. O documento chamou
atenção porque há 40 anos o governo britânico defende que apenas punições mais
duras podem diminuir o problema do consumo de drogas.
'Histórico' - Depois de examinar uma série de
abordagens, da tolerância zero à descriminalização, a pesquisa concluiu que o
uso de drogas é influenciado por fatores "mais complexos e cheios de
nuances do que somente legislação e sua aplicação."
No
entanto, o relatório constatou que houve uma melhora considerável na saúde dos
usuários de drogas em Portugal desde que o país passou a lidar com a posse de
drogas como uma questão de saúde e não de polícia, em 2001.
As
experiências do Uruguai e de Estados americanos como Washington e Colorado
foram mencionados, mas segundo o documento ainda é cedo para precisar seus
efeitos.
O
Ministério do Interior disse que estes resultados não podem ser atribuídos a
descriminalização por si só e que o governo do Reino Unido não tem
"absolutamente nenhuma intenção de descriminalizar as drogas."
Baker
disse que o tratamento do uso de drogas como uma questão de saúde seria muito
mais eficaz na minimização de danos.
"Vamos
olhar para o que funciona, em vez de presumir que prender as pessoas seja a
resposta."
"As
pessoas são tratadas como um número, recebem uma multa, recebem uma
advertência, são colocadas na prisão e nada disso muda o seu vício em
drogas", acrescentou.
"Se
estamos interessados em mudar o comportamento das pessoas, então temos de olhar
para isso do ponto de vista da saúde", concluiu Baker.
O
correspondente de assuntos internos da BBC Danny Shaw afirmou, no entanto, que
a visão de Baker estava em desacordo com a posição oficial do Ministério do
Interior, que diz que a estratégia de drogas atual está funcionando.
Descriminalização - Danny Kushlick, o fundador do
grupo Transform, que tem feito campanha para a regulamentação legal de drogas
no Reino Unido por quase 20 anos, disse que o relatório foi um passo importante.
"Pela
primeira vez em mais de 40 anos o Ministério do Interior admitiu que a
aplicação das leis de drogas duras não significa necessariamente reduzir os
níveis de consumo de drogas. Descriminalizar a posse de drogas não aumenta os
níveis de uso", afirmou.
No
início deste ano o vice-primeiro-ministro britânico Nick Clegg prometeu abolir
as penas de prisão para a posse de drogas para uso pessoal.
Clegg
desafiou o primeiro-ministro David Cameron a olhar para questões como a
descriminalização, apesar de Cameron ter rejeitado anteriormente pedidos de uma
comissão que analisasse a questão.
Drogas
legais - Um outro relatório do Ministério
do Interior pedirá a proibição geral de todas as drogas psicoativas, em uma
tentativa de combater algumas drogas legais sintéticas - as chamadas
"legal highs".
Atualmente,
quando um composto legal passa a ser considerado ilegal, os fabricantes evitam
a lei ajustando o composto químico e criando uma nova substância. Essas drogas
sintéticas usam substâncias que produzem efeitos semelhantes ao de drogas
proibidas.
O
governo vai considerar a legislação adotada na Irlanda há quatro anos, que
proíbe a venda de todas as substâncias psicoativas, mas isenta algumas como o
álcool e o tabaco.
"A
partir de hoje vamos começar a olhar para a possibilidade de uma proibição
geral de novas substâncias psicoativas em todo o território do Reino Unido,
reprimindo os fornecedores em vez de os usuários", disse Baker.
"Esta
abordagem teve um forte impacto sobre a disponibilidade de drogas legais
sintéticas quando introduzida na Irlanda, mas temos de saber se ele iria
funcionar aqui também."
Brasil - A
discussão sobre descriminalização das drogas também causa polêmica no Brasil.
Em
2006, entrou em vigor uma nova lei que tinha como objetivo punir os grandes
traficantes e acabar com a pena de prisão para usuários. Pela legislação atual,
quem é flagrado com drogas para uso pessoal pode ser advertido, ter de prestar
serviços comunitários ou cumprir medida sócio-educativa.
A
lei, no entanto, não determina a quantidade que caracteriza uso pessoal - quem
decide isso é o juiz. Críticos apontam que, com isso, abriu-se um precedente
para que usuários fossem condenados por tráfico, o que acabou aumentando a
superlotação nas prisões brasileiras. (BBC)
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