domingo, 8 de novembro de 2015
Uso ‘não bíblico’ de sangue em transfusões opõe Testemunhas de Jeová e médicos
Uma menina de
9 anos, com leucemia aguda, precisa de uma transfusão de sangue. Mas os pais,
adeptos da religião Testemunhas de Jeová, não autorizam o procedimento. Um
aposentado de 84 anos, com pneumonia grave e também testemunha de Jeová,
necessita de transfusão, mas, do mesmo modo, a família não dá o aval.
Casos assim são mais comuns do que se pensa no Brasil, e o de Armando
Wolff, o aposentado em questão, é o ponto de partida de um inquérito no
Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro – em uma investigação que
traz à tona o embate entre fé e ciência, o papel do Estado na proteção do
cidadão, o dilema moral de médicos e o conflito entre dois direitos
fundamentais do homem: à vida e à liberdade de escolha.
'Novelo'
- Armando Wolff foi internado em 25 de julho de 2010 na Clínica São Lucas, em
Macaé, no Norte fluminense. Segundo o prontuário médico, tinha dispneia (falta
de ar), arteriosclerose e infecção urinária de repetição, além de anemia
crônica. O quadro evoluiu para pneumonia gravíssima. Anêmico e inconsciente,
não reagia aos medicamentos, e o hospital tentou que seu filho, Aldo,
autorizasse a transfusão de sangue.
Sem autorização do filho, o hospital de Macaé foi à Justiça, argumentando
que tinha o dever de salvar o paciente. A transfusão foi autorizada pela
Justiça e realizada em 18 de agosto de 2010. Armando Wolff morreu 11 dias
depois.
Aldo iniciou, a partir daí, o périplo que deságua no inquérito do MPF. Na
ação, ele alega desrespeito à vontade do paciente e cobra "reforço no
ensino de medidas alternativas à transfusão de sangue". Wolff não quis dar
entrevista. Procurado pela BBC Brasil, seu advogado também não se manifestou.
Ler o inquérito é desenrolar um novelo em um labirinto de fatos e nomes e
perceber de que modo se relacionam. Anexado ao inquérito sobre o caso Wolff
está o de Luis Augusto do Nascimento, internado em novembro de 2011 no
Instituto Nacional de Traumato-Ortopedia (Into), no Rio, para uma cirurgia na
coluna. Cardiopata e usuário de marca-passo, Nascimento, testemunha de Jeová,
não autorizou a transfusão caso ela fosse necessária.
O Into lhe deu alta, argumentando que a cirurgia oferecia risco de
sangramento e que necessitava da autorização para eventual transfusão. Um amigo
de Nascimento, Washington Salvioli Salgado, procurou o MPF, que abriu
investigação.
Em 2013, o Into informou ao MPF que ofereceu a Nascimento a possibilidade
de autotransfusão, ou seja, retirar o próprio sangue do paciente, armazená-lo e
usá-lo na cirurgia. Mas Nascimento não foi mais localizado, e o inquérito foi
arquivado.
À BBC Brasil, Salvioli disse que o amigo morreu há cerca de um ano, sem ter
feito nem a transfusão nem a cirurgia.
Seus pais, testemunhas de Jeová, não assinaram a autorização para a
transfusão de sangue, e a Unimed entrou na Justiça. "Como a menina era
menor de idade, a Justiça autorizou sem dificuldades", lembra o advogado
da Unimed Vitória, Marcelo Devens.
O pai de Luana, o empresário Evanildo Manske, disse que conversou com os
médicos sobre os impedimentos que sua religião impõe. Segundo ele, os médicos
utilizaram no tratamento hemoderivados fracionados do sangue, ou seja, pequenas
quantidades de elementos do sangue.
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