sexta-feira, 1 de abril de 2016

LITERATURA CEARENSE: A Padaria Espiritual

A Padaria Espiritual
Florêncio Macedo (foto), Francisca Ângela Sousa e Iris Dayanne (*)

Antecipando em, exatamente, trinta anos os traços modernistas de valorização da identidade nacional e insubmissão a cultura europeia, a Padaria Espiritual, com sede no Café Java, Praça do Ferreira, Fortaleza, Ceará, surge de forma irônica, bem humorada e revolucionária no contexto das letras brasileiras. Mas não é só no campo das letras que este clube irá vigorar. A exemplo de Henrique Jorge, a Padaria Espiritual divergia das demais academias por ser academia de artes, o que vai assemelhá-la bastante da exposição de 22, e das mais diversas artes. Ao contemplar um estudo sobre esta agremiação devemos, sem dúvidas, dá o merecido respaldo ao seu programa de instalação. Foi constituído com base nas  características que já mencionamos e no “calor da idade”, visto que os padeiros eram em sua maioria jovens.
O principal meio de divulgação foi o jornal "O Pão", que prometia, e levou, aos cearenses e brasileiros alimento para alma, para o espírito. Como afirma o artigo 38 do programa de instalação: “ a Padaria terá correspondentes em todas as capitais dos países civilizados”. São tantas as características deste movimento que poderíamos  escrever páginas e mais páginas, para evitar isto, elencaremos algumas características do programa de instalação, das leis e normas que regiam a Padaria Espiritual
Características

Busca e valorização da identidade nacional, seja pelo discurso, seja pelos textos impressos (em sua maioria em versos); Crítica social, principalmente a polícia, as freiras, as professoras ignorantes, entre outras; Desejo de formar uma corrente de pensamento, com a busca de apoio dos principais intelectuais das letras e artes do país e do mundo e Busca do cancioneiro popular como forma de resgate ao folclore (saber do povo) cearense.

O contexto histórico
Padaria espiritual (1892 - 1898) culminou bem no centro da Belle époque, que durou de 1871 até a eclosão da Primeira Guerra Mundial em 1914. O que pode ser percebido em vários aspectos tanto da agremiação em si, quanto de seus membros e peculiaridades.

A Belle Époque  foi um período de cultura cosmopolita na história da Europa. A Belle époque foi marcada por profundas transformações culturais que se traduziram em novos modos de pensar e viver o quotidiano.

A Belle Époque foi considerada uma era de ouro da beleza, inovação e paz entre os países europeus. Novas invenções tornavam a vida mais fácil em todos os níveis sociais, e a cena cultural estava em efervescência: cabarés, o cancan, e o cinema haviam nascido, e a arte tomava novas formas com o Impressionismo e a Art Nouveau. A arte e a arquitetura inspiradas no estilo dessa era, em outras nações, são chamadas algumas vezes de estilo "Belle Époque". Além disso "Belle Epóque" foi representada por uma cultura urbana de divertimento incentivada pelo desenvolvimento dos meios de comunicação e transporte gerados pelos lucros e necessidades da política imperialista, que aproximou ainda mais as principais cidades do planeta.

Inovações tecnológicas como o telefone, o telégrafo sem fio, o cinema, a bicicleta, o automóvel, o avião, inspiravam novas percepções da realidade. Com seus cafés-concertos, balés, operetas, livrarias, teatros, boulevards e alta costura, Paris, a Cidade Luz, era considerada o centro produtor e exportador da cultura mundial. Ir a Paris ao menos uma vez por ano era quase uma obrigação entre as elites, pois garantia o vínculo com a atualidade do mundo.

A cultura boêmia imortalizada nas páginas do romance de Henri Murger, Scènes de la vie de bohème (1848), era um referencial de vida para os intelectuais brasileiros, leitores ávidos de Baudelaire, Rimbaud, Verlaine, Zola, Anatole France e Balzac. O caráter boêmio dos membros da Padaria Espiritual é notório até mesmo em sua denominação como uma “Agremiação de Rapazes e Letras”.

A Belle Époque, foi uma época onde ocorreram várias mudanças no mundo da arte na Europa, fazendo com que teatros, exposições de telas, cinemas, entrassem no cotidiano das pessoas burguesas. E somente elas tinham acesso a esse mundo da arte.

Os Padeiros
Os membros da Padaria Espiritual eram jovens prosadores, poetas, pintores, desenhistas, músicos, os quais segundo o artigo 6° do estatuto da Padaria receberiam nomes de guerra. Na primeira fase do movimento que aconteceu em 1982 ingressaram 20 padeiros sendo eles: Jovino Guedes (Venceslau Tupiniquim), Antonio Sales (Moacir Jurema), Tibúrcio de Freitas (Lúcio Jaguar), Ulisses Bezerra (Frivolino Catavento), Carlos Vitor (Alcino Bandolim), José de Moura Cavalcante (Silvino Batalha), Raimundo Teófilo de Moura (José Marbri), Álvaro Martins (Policarpo Estouro), Lopes Filho (Anatólio Gerval), Temístocles Machado (Túlio Guanabara), Sabino Batista (Sátiro Alegrete), José Maria Brígido (Mogar Jandira), Henrique Jorge (Sarasate Mirim), Lívio Barreto (Lucas Bizarro), Luís Sá (Corrégio Del Sarto), Joaquim Vitoriano (Paulo Kandalaskaia), Gastão de Castro (Inácio Mongubeira), Adolfo Caminha (Félix Guanabarino), José dos Santos (Miguel lince).

No ano de 1894, a padaria foi reorganizada ingressando agora mais 14 padeiros: Antonio de Castro(Aurélio Sanhaçu), José Carlos Júnior (Bruno Jaci), Rodolfo Teófilo (Marcos Serrano), Almeida Braga (Paulo Giordano), Valdemiro Cavalcante (Ivan d’ Azof), Antonio Bezerra (André Carnaúba), José Carvalho (Cariri Braúna), X.de Castro (Bento Pesqueiro), José Nava (Gil Navarna), Roberto de Alencar (Benjamim Cajuí), Francisco Ferreira do Vale (Flávio Bacininga), Artur Teófilo (Lopo Mendonza), Cabral de Alencar (Abdul Assur), Eduardo Sabóia (Brás Tubiba).

Boêmios, os padeiros não se limitavam em suas reuniões e as  redações de suas atas, divulgavam também por meio de performances em áreas públicas, como piqueniques ou conferências. Além disso, nos textos publicados no jornal ‘'O Pão’’, os "padeiros" tratam de assuntos diversos da vida literária do Ceará e do Brasil, além de publicarem seus próprios textos. A orientação geral do que é impresso no periódico é de um posicionamento contrário à burguesia, sendo assim mais voltados para a valorização do nacional. Os membros do grupo são, em sua maioria, jovens que não participam da elite cearense, daí sua ênfase no combate à burguesia e na valorização do trabalho. Juntamente com o periódico “O Pão”, foram publicado diversas obras e livros bastante significativos para a literatura cearense e brasileira entre elas destacaram: Phatos (1893) de Lopes Filho, Marinhas (1897) de Antônio de Castro, Flocos (1894) de Sabino Batista, Contos do Ceará (1894) de Eduardo Sabóia, Cromos (1895) de X. de Castro, Trovas do Norte (1895) de Antônio Sales, Os Brilhantes (1895) de Rodolfo Teófilo, Dolentes (1897) de Lívia Barreto, Maria Rita (1897) de Rodolfo Teófilo, Perfis Sertanejos (1897) de José Carvalho.

(*) Trabalho apresentado pelos alunos da disciplina Literatura Cearense,                                                                                             no curso de Letras da UVA, que tinha como docente  o professor  Leunam Gomes.

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