MEMÓRIAS DE MINHA VIDA: MEU AMOR, MEU
LUGAR, MEU ACONCHEGO
(Por Francisco Renan Andrade de Abreu)
Lembranças... Recordações de uma época
cheia de alegria, que até hoje não consigo esquecer. Momentos bons, únicos, que
ainda sinto o friozinho na barriga e o coração a palpitar quando me pego a
lembrar.
Naquele anoitecer com o brilho das
estrelas que começavam a surgir no céu e o sol que acabara de desaparecer,
chegou a minha singela casa, meu primeiro e único amor. Casinha simples,
pequenina, com várias árvores ao seu redor e um riacho que corria manso por
entre as pedras, formando pequenas cascatas de água límpida, clara,
tranquila... Um lugar muito aconchegante.
Ah! Não, não consigo esquecer como era
belo aquele rapaz que acabava de chegar à minha casa. Então ele desmontou-se de
seu cavalo e cumprimentou meu pai que estava sentado no alpendre. Ao vê-lo tão
belo e bem vestido em uma calça boca de sino e camisa justinha ao corpo senti
algo inexplicável.
Os dias foram passando e eu pensava cada
vez mais naquele jovem, sonhava quase todas as noites com ele e ficava a
imaginar quando o veria novamente e se seria correspondida com seu amor. Papai,
como todos os outros daquela época não permitia que a gente namorasse sem que
ele desse a permissão.
Passaram-se uns quinze dias e novamente
aquele “broto” lindo veio a minha casa e para minha surpresa logo ao chegar
pediu permissão para namorar comigo. Fiquei muito emocionada e feliz. Papai
conhecia muito bem a família do moço, pois nossos pais eram compadres. Diante
desse fato consentiu nosso namoro. Mesmo assim, naquela época os pais não
permitiam muitas intimidades entre os namorados. Ficava eu dentro de casa e ele
no alpendre, conversávamos através de uma janela, onde mamãe colocava a
lamparina para nos iluminar e impedir uma possível e acanhada aproximação
nossa.
Assim, passaram alguns meses, e cada dia
mais eu queria bem aquele rapaz, contava os dias, não, as horas para chegar os
domingos, dia em que os namorados visitavam as casas das namoradas, mas tinha
que chegar às 18 horas e ir embora às 21 horas.
Chegou a época em que nosso lugar ficava
mais animado, com a festa do santo padroeiro, “Santo Antonio”. Aproximava-se e
mamãe, como sempre muito cuidadosa e habilidosa, já preparava meus vestidos de
chita com bicos bordados e fitinhas, fazendo de mim a moça mais bem arrumada e
prendada da região.
Hoje, quando vejo aquela igrejinha
branca construída em cima do alto do morro revivo tudo novamente. O sobe e
desce dos casais de namorados, amigos, famílias nos dias de novenários, aquela
algazarra. Eu no lindo vestido, florido e rodado, desfilava entre as jovens da
época ao lado de meu amor que sempre querendo agradar oferecia-me prendas de
leilão, principalmente as caixas enfeitadas, conhecidas como “caixas de
segredo”, e depois íamos até a banca de seu Manoel tomar arico-rico, suco em pó
de morango ou uva diluído em água com açúcar acompanhado de bolacha “fogosa”pão
arredondado e macio. Ah! Como era deliciosa todas aquelas emoções.
Mas emocionante mesmo foi quando,
Antonio, meu amor, pediu a minha mão em casamento ao meu pai. Foi em um
domingo, à tardinha, chegou ele, cumprimentou papai, que, como de costume,
estava sentado em sua cadeira no alpendre contemplando o entardecer. Antonio
sentou-se ao lado de papai e disse que queria lhe falar algo importante. Papai,
um homem sério e introvertido e ao mesmo tempo educado, pediu que começasse a
conversa. Eu, muito nervosa, meu coração já quase saindo pela boca, fiquei
escondida atrás da porta para ouvir a conversa. Antonio fez o pedido. Nesse
momento papai chamou-me para perguntar se eu aceitaria como esposo. Não sei
como cheguei ao alpendre, minhas pernas trêmulas e meu coração em êxtase de
tanta felicidade, respondi que “sim”. Ficamos muito felizes e fazendo planos
para o nosso futuro.
Chegou o “grande” e esperado dia, meu
casamento. Minha madrinha fez o vestido, lindo, branco como a neve, com rendas,
babados e mangas longas. Fiquei belíssima naquele vestido acompanhado com a
grinalda de florzinha e o véu que ia até os pés.
Eu e todos os meus convidados fomos
montados em cavalos para a igrejinha, que até hoje está lá no alto do morro e
branquinha como o meu vestido. Uma animação só! Chegando lá, estava à minha
espera meu amado noivo, acompanhado de sua família.
O padre começou a missa ao mesmo tempo
em que celebrava o nosso matrimônio.
Terminado tudo, saímos de mãos dadas
acompanhados dos convidados. Estávamos muito felizes e queríamos compartilhar
nossa imensa alegria com os nossos amigos. Todos juntos fomos para o banquete,
como se chamava as festas de casamento daquela época. No caminho para a festa,
nossos amigos iam a galopear em seus cavalos e gritando bem alto para que todos
ouvissem “Viva os noivos, viva os noivos.” e nós dois não nos contínhamos de
tanta felicidade e ríamos da algazarra das pessoas.
Em minha casa estava aquele alvoroço.
Eram mesas e cadeiras colocadas embaixo de latadas: compartimento feito de paus
e cobertos com folhas para que todos se protegessem do sol do meio-dia. A
comilança começou a ser servida: carne de porco, galinhas, carneiros
acompanhados de arroz, macarrão, saladas e bebidas quentes - quinado, conhaque,
zinebra, etc. tudo ao natural, pois não havia geladeiras ou freezer nessa época
e muito menos energia elétrica. Todos numa animação só, comiam, conversavam,
riam e os mais ousados já estavam ficando tontos de tanto comer e beber. A
festança durou a tarde toda...
Hoje já estamos completando 40 anos de
casados. Durante todo esse tempo vivemos momentos bons, momentos difíceis, mas
a cada dia superamos todas as adversidades da vida. Vieram os filhos para
completar a nossa felicidade, e hoje os netos nos encantam a cada dia com suas
peraltices, enchendo nosso lar de muita alegria. São recordações que guardarei
comigo e que serão relembradas a cada momento como se fosse um bálsamo para
minha mente cansada e ao mesmo tempo feliz.
(texto baseado na entrevista feita com a
Sra. Cândida Rosália de Paiva, 7 anos.)

(*) Francisco Renan Andrade de Abreu é aluno da E.E.I.F. Zacarias Cordeiro de Paulo de Reriutaba (CE). PROFESSORA: Maria Jucieda de Paiva.
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