segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

COLUNA WILSON BELCHIOR: Caça ao pobre

No Nordeste, sai de viagem pelo interior, em tempo de eleição, um político de carreira, rico, denunciado muitas vezes por corrupção, crimes prestes a prescrever, porém ainda com mandato, que lhe assegura o imoral Foro Privilegiado.

Chega ele com seus cabos eleitorais, a uma casa humilde, rindo e feliz, abraça e beija fortemente a dona da casa, para depois brincar e gracejar com os seus muitos filhos.

- Alô, dona Zefinha, que maravilha a ver! Como a senhora está jovem, saudável e bonita.

- O senhor acha?

- Eu não acho, mas estou apenas lhe falando a verdade.

- E seu esposo Miguel, por onde anda? Está, porventura, de férias em Paris?

- Eu nunca tive nenhum Miguel como marido. O senhor quer dizer o Pedro?

- Ah! Ele mesmo! Desculpe-me, pois confundi. É que são muitos os meus eleitores.

- O Pedro morreu de ódio do senhor depois na última eleição. O senhor não se lembra que quando passou por aqui e prometeu a ele mandar cavar um cacimbão em nosso quintal? Mas parece até que se esqueceu.

- Esqueci-me! Porém, me perdoe. O Pedro pode ter morrido para a senhora, para mim ele ainda está vivo e viverá eternamente em meu coração.

- Dona Zefinha, a saudade bateu. Vamos tirar um selfie? Uma foto com a senhora bombará no Face. Eu vim aqui especialmente para lhe visitar e lhe pedir humildemente o seu sufrágio. Hoje mesmo lhe mandarei uma cesta básica, e lhe inscreverei no Bolsa Família. Dê-me seu sufrágio que, se eu for eleito, a senhora não precisará mais trabalhar. E ainda irá esquecer o tempo em que foi pobre.

- O senhor quer o meu sufrágio sem se casar comigo? Cruz-credo!






(*) Wilson Belchior é engenheiro civil, articulista, poeta e memorialista.  


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