De 1989 a 1994,
tive a oportunidade de exercer o cargo de Secretário de Educação em três
municípios: Croatá, Poranga e Guaraciaba do Norte. Uma realidade
totalmente adversa da atual. Não tínhamos Fundef ou Fundeb. Não tínhamos livros
didáticos. Merenda escolar, uma raridade. Quando chegava, a merenda era
composta por produtos alheios aos nossos costumes. A serra da Ibiapaba recebia
mel e rapadura produzidos em Santa Catarina. E os professores? Noventa por
cento só possuíam a quarta série. Raríssimos eram os que haviam concluído o
segundo grau, atual nível médio. A remuneração era ínfima. Encontrar
professores com curso superior era, praticamente impossível.
Ao aceitar o
convite, fiz uma exigência: que a menor remuneração dos professores fosse o
salário mínimo para aqueles que possuíam a quarta série. Até então, a
remuneração dos professores equivalia a dez por cento do salário mínimo. Quem
tivesse grau de instrução mais elevado, receberia remuneração compatível. Isso
fez uma grande diferença. Era uma forma de valorizar os profissionais da
educação. Mas não foi o principal. Os professores, aprovados em concurso, de
acordo com os níveis de estudos disponíveis, receberam formação especial
centrada na valorização dos alunos, da família, da comunidade, da vida. Nenhum
professor tinha curso superior. Em Croatá, por exemplo, apenas oito com nível
médio. E todos juntos fizeram uma revolução. Os alunos aprendiam, e não havia
evasão.
Qual foi o
segredo? Para nós não era segredo. Era o óbvio que devia ser feito e estava
sendo feito. Tudo desenvolvido, tendo como base a participação. A formação
inicial dos professores era desenvolvida, adotando-se as técnicas de comunicação
e dinâmica de grupo. O relacionamento, nos grupos, era a tônica principal.
Saiu-se da rotina de aulas monótonas e cansativas para aulas que expressavam
vida, participação. Os professores, durante o período de treinamento, eram, de
fato, os agentes do processo de aprendizagem. Queríamos que eles mesmos
aprendessem – a partir da participação -, para, depois,
aplicarem os conhecimentos adquiridos, em suas salas de aula, com os futuros
alunos.
As avaliações
feitas sobre a metodologia adotada, na formação dos professores, registravam
alto índice de satisfação. Mas, quando perguntávamos se era possível aplicar
aquela sistemática na sala de aula, os professores hesitavam. Sabiam que
agradaria, mas não tinham ainda segurança para aplicá-la. Para apoiá-los na implantação
da nova metodologia, escrevemos e distribuímos um “roteiro para os
primeiros dias de aula”. Ali estava escrito, desde a preparação da
sala de aula até as formas de trabalho em grupo. Foi um sucesso. A satisfação
dos alunos contagiou os professores e suas famílias.
Daí para frente
tudo se tornou mais fácil. As inovações foram adotadas pela convicção de sua
importância, e não por ser uma determinação da Secretaria de Educação. E a
escola passou a despertar a atenção de todos. Pais e mães passaram a comparecer,
em massa, às reuniões a que eram convidados. O exercício constante da
participação gerou a mudança.
Atualmente, as
escolas contam com professores titulados, livros em abundância, laboratórios,
computadores, vários incentivos e, no entanto, as queixas são de que os alunos
não aprendem a ler e a escrever. Algum tempo depois, descobri que tudo aquilo
que fazíamos, hoje tem o nome de Educação Biocêntrica. Era o caminho da
reflexão, do diálogo, da participação, das vivências, sob a influência das ideias
de Paulo Freire, Edgar Morin e Rolando Toro, psicólogo chileno, criador
da Biodança, e concebido e estruturado pela Psicopedagoga cearense
Ruth Cavalcante que propôs o nome de Educação Biocêntrica àquela
nova concepção. Com a contribuição do psicólogo Cézar Wagner. Educação
Biocêntrica foi, portanto, o nome do caminho que percorremos, pela
convicção de que, quando há respeito à comunidade escolar, tudo se torna mais
fácil e a escola passa a ter mais vida.
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