
Conversas em ligações telefônicas, interceptadas
pela Justiça Estadual e obtidas pelo G1,
mostram a participação dos policiais militares do Batalhão da Polícia do Meio
Ambiente (BPMA) em um esquema criminoso na região Norte do Ceará. Nove servidores viraram réus por crimes
militares, na Vara Única da Auditoria Militar do Ceará, em abril
deste ano; um deles foi solto e cumpre medidas cautelares.
O G1 procurou
os advogados de defesa dos policiais, mas eles não quiseram se posicionar sobre
o caso ou não atenderam às ligações feitas pela reportagem.
Conforme a investigação do Ministério Público do
Ceará (MPCE), a quadrilha formada dentro da Polícia Militar do Ceará
(PMCE) extorquia principalmente empresários e
comerciantes, com exigências de R$ 20 mil a R$ 50 mil e ameaças de
apreensão de material, prisão e assassinato.
Em uma das ligações interceptadas por decisão
judicial, o tenente-coronel Paulo de Tasso Marques de Paiva, comandante da
Polícia Ambiental na região, revela a um homem não identificado que pressionou
outra pessoa a pagá-lo R$ 1 mil por semana, com ameaças. Eles riem da situação
e, na sequência, combinam de cobrar de outra pessoa nos dias seguintes. A
ligação ocorreu em 28 de janeiro.
O comandante aparece em outra ligação, na qual
cobra uma "comissão" para pagar uma "conta de luz". Outro
homem, também não identificado, responde apenas "beleza", e eles se
despedem, em 7 de fevereiro deste ano.
Termo
em 'ciganês' - Em uma conversa entre o sargento
Jorge Luís Sousa e um familiar, em 20 de dezembro de 2018, o PM pede para o
jovem ir a um galpão de um português, na cidade de Tianguá, para solicitar que
o empresário ligue para ele e para pegar um "radem" - que, no idioma
de ciganos significa dinheiro. Conforme o Ministério Público, dois policiais
suspeitos têm esposas de origem cigana e aprenderam os termos para disfarçar os
diálogos criminosos. Na ligação seguinte, o parente confirma que recebeu R$
800.
O sargento Sousa, como é conhecido, também é
suspeito de participar de uma ocultação de uma motocicleta em situação
irregular. Em uma ligação telefônica, um homem não identificado afirma que está
na dúvida do que fazer com o veículo: "Eu fiquei pensando que uma hora
dava errado, rapaz, embolava muita gente. Eu pensei noutra coisa aqui, aí se
não der certo, é que nós vamos apelar".
Então, o PM sugere: "Manda ele jogar essa
bicha no rio, macho". O comparsa aceita a sugestão e diz que irá
"desmontar" o material.
Pedidos
de liberações - Outras
ligações interceptadas pela Justiça revelam que o sargento Marcelo Cristiano de
Melo liberava suspeitos e materiais apreendidos abordados pelo Batalhão de
Polícia Rodoviária Estadual (BPRE), onde ele trabalhou antes de ser transferido
para a Polícia Ambiental.
Em 23 de janeiro deste ano, o sargento Melo ligou
para outros policiais para pedir a liberação de um veículo que estava com fumê
mais escuro que o permitido e com débitos, apreendido pela Polícia Rodoviária
em Caucaia.
Durante a abordagem, o dono do veículo, um
empresário de banda de forró, argumentou: "Eu sou amigo do Melo".
"Não, pois beleza, tenha calma, eu conheço ele, conheço o Melo, você não.
Vá embora", respondeu o PM. O veículo e o proprietário foram liberados.
Outra ligação do militar foi gravada com
autorização da Justiça em 8 de fevereiro e capta a liberação de um veículo
irregular. Após o pedido de um empresário do ramo de carnes, o policial entrou
em contato com colegas para conseguir a liberação de um motorista de um
caminhão da empresa, que estava sem habilitação, na cidade de Granja.
"É pra levar ele
preso pra Delegacia, como é?", chegou a perguntar um policial. "Pra
liberar o homem, rapaz!", rebateu o sargento Melo, com risos. Segundo a
denúncia do Ministério Público, o servidor praticou o crime de patrocínio
indébito.
A quadrilha também é suspeita de corrupção passiva.
Em um dos casos, um sargento combina com um empresário, em uma ligação de 7 de
janeiro deste ano, como seria o esquema de segurança, realizado por PMs, em uma
festa particular. As partes combinam que dois policiais ficariam fixos no
local, pelo preço de R$ 300 cada, e outros três agentes iriam trafegar
periodicamente no carro da Polícia Militar, ao preço de R$ 150 cada.
Os nove policiais militares foram presos durante a
deflagração da Operação Espanta Raposa, em 28 de março deste ano. Dentre eles,
apenas o soldado foi solto, com aplicação de medidas cautelares definidas pela
Justiça. A juíza da Auditoria Militar considerou que ele tem menor participação
no esquema criminoso. Os outros 8 PMs seguem presos. (G1)
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