É a
primeira vez que um ex-presidente eleito é colocado no banco dos réus por
crimes contra a ordem democrática estabelecida com a Constituição de
1988. Esses tipos de crime estão previstos nos Artigos 359-L (golpe de
Estado) e 359-M (abolição do Estado Democrático de Direito) do Código Penal
brasileiro.
“Não
há então dúvidas de que a procuradoria apontou elementos mais do que
suficientes, razoáveis, de materialidade e autoria para o recebimento da
denúncia contra Jair Messias Bolsonaro”, disse Moraes, relator do caso no
Supremo, referindo-se à acusação apresentada no mês passado pelo
procurador-geral da República, Paulo Gonet.
O relator votou para que Bolsonaro também responda, na
condição de réu no Supremo, aos crimes de organização criminosa armada, dano
qualificado pelo emprego de violência e grave ameaça e deterioração de
patrimônio tombado. Se somadas, todas as penas superam os 30 anos de
cadeia.
Até
o momento, seguiram o relator os ministros Flávio Dino e Luiz Fux. Ainda devem
votar a ministra Cármen Lúcia e o ministro Cristiano Zanin, presidente da
Primeira Turma, colegiado composto por cinco dos 11 ministros do Supremo e
onde tramita a denúncia sobre golpe.
Em
seu voto, Dino buscou garantir que as defesas terão oportunidade de construir
suas próprias narrativas, que serão levadas em consideração no momento
adequado. "Justiça é diferente de justiçamento", disse ele.
"Temos
que aferir a conduta, uma a uma, independentemente do julgamento moral que
tenhamos sobre a pessoa", assegurou.
Fux
destacou que o voto do relator detalhou ponto a ponto as condutas e crimes
imputados a Bolsonaro e outros sete aliados. "Em relação à autoria e a
materialidade, a procuradoria e o ministro Moraes legaram à turma e à sociedade
tudo quanto nós precisávamos saber para o recebimento da denúncia".
O
ministro ressalvou, contudo, que durante o processamento da ação penal deverá
apresentar divergências em relação ao cálculo das penas. "Confesso
que em determinadas situações me deparo com uma pena exacerbada", afirmou.
Acusação
Conforme
a acusação da PGR, Bolsonaro tinha conhecimento do plano intitulado Punhal
Verde Amarelo, que continha o planejamento e a execução de ações para
assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo
Alckmin e o ministro do STF Alexandre de Moraes.
A
procuradoria também garante que o ex-presidente sabia da minuta de decreto com
o qual pretendia executar um golpe de Estado no país. O documento ficou
conhecido durante a investigação como "minuta do golpe".
Em
seu voto, Moraes afirma “não haver dúvidas” sobre conhecimento de Bolsonaro
acerca do documento:
“Não
há dúvida que o denunciado Jair messias Bolsonaro conhecia, manuseava e
discutiu sobre a minuta de golpe”.
Qual
a implicação desse conhecimento para o cometimento dos crimes imputados pela
PGR deve ser ainda verificada durante a instrução da ação penal, disse Moraes.
“A interpretação do fato vai ocorrer durante a instrução penal.”
No
voto, Moraes frisou que o plano de Bolsonaro começou a ser posto em prática em
julho de 2021, quando em uma transmissão ao vivo pela internet o ex-presidente
“atacou as urnas eletrônicas sem nenhum fundamento e sem apresentar nenhum
elemento concreto”.
O
objetivo seria insuflar aliados e criar o clima para que Bolsonaro permanecesse
no poder mesmo com derrota na tentativa de reeleição, em 2022, conforme narra a
denúncia, destacou Moraes.
A
denúncia “aponta o aumento da intensidade da agressividade de forma
progressiva, integrando a execução de seu plano” autoritário, destacou Moraes.
Demais
réus
A
maioria da Primeira Turma votou ainda para que mais sete aliados de Bolsonaro
se tornem réus na mesma ação penal sobre o golpe. Todos compõem o chamado
“núcleo crucial” da denúncia. São eles:
- Jair
Bolsonaro, ex-presidente da República;
- Walter Braga
Netto, general de Exército, ex-ministro e vice de Bolsonaro na chapa das
eleições de 2022;
- Augusto
Heleno, general do Exército e ex-ministro do Gabinete de Segurança
Institucional;
- Alexandre
Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência - Abin;
- Anderson
Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de segurança do Distrito
Federal;
- Almir
Garnier, ex-comandante da Marinha;
- Paulo Sérgio
Nogueira, general do Exército e ex-ministro da Defesa;
- Mauro Cid,
delator e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.
Detalhamento
Em
um voto longo, com mais de uma hora e 40 minutos de duração, Moraes recorreu a
vídeos, tabelas e estatísticas para rebater cada uma das oito defesas. Ele
começou por destacar a violência dos atos golpistas do 8 de janeiro de 2023,
quando as sedes dos Três Poderes foram invadidas e depredadas por apoiadores de
Bolsonaro.
Um
vídeo com cenas da “batalha campal”, como descreveu o ministro, foi colocado
durante a sessão da Primeira Turma do Supremo, colegiado responsável por julgar
o caso. Para rebater as alegações de falta de provas, Moraes apresentou, na
parte final de seu voto, uma tabela relacionando dos os atos apontados pela PGR
como criminosos e todas as provas documentais colhidas pela Polícia Federal
(PF).
Para
Moraes, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, “descreveu
satisfatoriamente os fatos típicos ilícitos, com todas as circunstâncias, dando
aos acusados o amplo conhecimento dos motivos e das razões pelas quais foram
denunciados”.
O
ministro destacou que o julgamento desta quarta tem por objetivo somente
verificar se há indícios materiais suficientes para se abrir uma ação penal, na
qual as defesas terão a plena oportunidade de construir suas próprias
narrativas sobre os fatos apresentados pela acusação.
(Ag.
Brasil)
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