Depois da polêmica
com feministas e do mal-estar ocorrido na reunião passada do Conselho Nacional
de Saúde, o governo federal decidiu retirar da Medida Provisória que cria o
cadastro de gestantes um artigo que fazia referência aos direitos do nascituro.
A retificação, que saiu ontem no Diário Oficial da União, ajudou a acalmar os
ânimos, mas ainda não conseguiu satisfazer os movimentos sociais. "O ideal
seria tirar toda MP ", afirmou a coordenadora executiva do movimento
Católicas pelo Direito de Decidir, Rosângela Talib. Um desfecho que o governo
evita a todo custo, de olho principalmente em preservar um dos benefícios
criados pela Medida Provisória - o auxílio de R$ 50 para o deslocamento das
gestantes até as consultas de pré-natal e ao local em que será realizado o
parto. Como é ano eleitoral, a criação do benefício não poderia ser proposta
numa MP editada agora.
A decisão de
subtrair o ponto considerado mais polêmico foi tomada pela Presidência da
República a pedido do Ministério da Saúde, informou o secretário de Atenção da
pasta, Helvécio Magalhães. E foi anunciada pela presidente Dilma Rousseff
anteontem, durante uma reunião com representantes de movimentos sociais.
"Ela acaba com um mal-entendido em torno do assunto", disse o
ministro da Saúde, Alexandre Padilha. Publicada no dia 28 de dezembro, a MP
determina a criação de um banco de dados com informações sobre grávidas e sobre
atendimento prestado, principalmente àquelas consideradas com gestação de
risco. A ideia visa a melhorar o acesso das gestantes à assistência de
qualidade e a responsabilizar diretores dos serviços por eventuais falhas de
atendimento.
Referência - Desde
a sua edição, movimentos sociais apontaram falhas no dispositivo - todas
encampadas pela maioria dos integrantes do Conselho Nacional de Saúde. A
primeira delas é a referência ao direito ao nascituro - uma brecha, avaliam,
para que obstáculos sejam colocados à interrupção da gravidez, mesmo nos casos
previstos em lei. Mesmo dentro do governo, a inclusão do tema havia sido
criticada. "Pode parecer paranoia, mas não é", afirmou Elizabete
Saar, da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres, durante um relato
pessoal feito na reunião do conselho. Ela disse ainda considerar que o assunto
deveria ter sido melhor debatido, o que teria evitado um desgaste desnecessário
para o próprio governo.
A falta de
discussão sobre o assunto também foi criticada por representantes dos movimentos
sociais. E, sobretudo, pelo fato de o texto ter sido editado no formato de
Medida Provisória. "Foi uma punhalada pelas costas", definiu a
conselheira Lurdinha Rodrigues, durante a reunião realizada na quarta-feira
passada. Nessa reunião, o grupo tentou pedir a retirada total da MP, mas foi
convencido pelo ministro da Saúde, também presidente do conselho, a adotar uma
medida mais branda. Eles decidiram criar um grupo de trabalho, com prazo de 15
dias para avaliação do texto.
Avanço - Esse grupo vai continuar a discussão, afirmou Jurema Werneck, do Grupo
Crioula. "O reconhecimento do erro foi um avanço. A retirada do termo foi
importante, mas isso não invalida outros temas que precisam ser
debatidos", afirmou. Entre eles está a própria criação do cadastro. A
ideia, de acordo com Padilha, é inspirada numa iniciativa realizada em Cuba
para tentar reduzir a mortalidade. "Esse banco não resolve o
problema", afirmou Lígia Bahia, representante no conselho da Associação
Brasileira de Saúde Coletiva. "Isso só vai resolver quando estudantes de
Medicina deixarem de fazer partos sozinhos, quando houver assistência pré-natal
de qualidade, quando a mulher não precisar ouvir da equipe médica que tem de
voltar para casa porque ainda não chegou a hora do parto ou peregrinar de
hospital em hospital para saber se há vagas de atendimento." Miranda
afirmou que as conclusões do grupo de trabalho poderão ser apresentadas num
segundo momento para o relator da MP. (Fonte: Estadão)
Nenhum comentário:
Postar um comentário