quinta-feira, 10 de setembro de 2015
'Impotentes e frustrados' são os mais agressivos na internet, diz psicóloga
Impotência,
frustração e uma necessidade de se impor sobre outras pessoas. Assim, a
psicóloga americana Pamela Rutledge, diretora do Media Psychology Research
Center (Centro de Pesquisas sobre Psicologia e Mídia), na Califórnia, avalia a
agressividade de muitos "comentaristas" de redes sociais em tempos de
polarização política no Brasil.
Referência
em um ramo recente da psicologia dedicado a estudar as relações entre a mente e
a tecnologia, Rutledge ressalta que as pessoas "são as mesmas", tanto
em ambientes físicos quanto virtuais. Mas faz uma ressalva sobre a
impulsividade de quem dedica seu tempo a ofender ou ameaçar pessoas nas caixas
de comentários de sites de notícias e páginas de política: "Já estamos
acostumados com a ideia de que nosso comportamento obedece a regras sociais,
mas ainda não percebemos que o mesmo vale na internet".
Além
da polarização política ou ideológica, a especialista comenta a ascensão de
temas como diversidade sexual, racismo e machismo ao debate público, graças às
redes sociais. "Tudo isso já acontecia, mas não tínhamos
conhecimento." Leia os principais trechos da entrevista.
BBC Brasil - Estamos mostrando o nosso
'lado negativo' nas redes sociais?
Pamela Rutledge - As pessoas são as mesmas, online ou offline.
Mas a internet tem a ver com respostas rápidas. As pessoas falam sem pensar. É
diferente da experiência social offline, em que você se policia por conta da
proximidade física do interlocutor. Nós já estamos acostumados com a ideia de
que nosso comportamento obedece a regras sociais, mas ainda não percebemos que
o mesmo vale na internet.
BBC Brasil - No Brasil, a polarização
política tem levado pessoas com visões distintas a se ofenderem e ameaçarem,
tanto em comentários em sites de notícias quanto nas redes sociais. A internet
estimularia o radicalismo?
Rutledge - As redes sociais encorajam pessoas com
posições extremas a se sentirem mais confiantes para expressá-las. Pessoas que
se sentem impotentes ou frustradas se comportam desta maneira para se
apresentarem como se tivessem mais poder. E as pessoas costumam se sentir mais
poderosas tentando diminuir ou ofender alguém.
BBC Brasil - Os comentários na internet
são um índice confiável do que as pessoas realmente acreditam?
Rutledge - Depende do tópico.
Mas as pessoas que tendem a responder de maneira agressiva não representam o
sentimento geral.
BBC Brasil - As pessoas com opiniões menos
radicais têm menos disposição para comentar do que as demais?
Rutledge - Sim. Porque os comentários agressivos têm
mais a ver com a raiva das pessoas do que com uma argumentação para mudar a
mente das outras. Quem parte para a agressividade, não está dando informações
para trazer alguém para seu lado, estas pessoas querem apenas agredir.
BBC Brasil - A "trollagem",
gíria de internet para piadas ou comentários maldosos sobre anônimos e famosos,
muitas vezes feitos repetidamente, é vista por muita gente como diversão. Há
perigos por trás das piadas?
Rutledge - No caso das celebridades que são alvo da
''trollagem'', os fãs vêm defendê-las, então, elas não costumam precisar tomar
qualquer iniciativa. No caso dos anônimos, a recomendação é usar ferramentas para
solução de conflitos, como encorajar seus amigos e conhecidos a não serem
espectadores, mas a tomarem atitudes em defesa do ofendido. Isso não significa
discutir com os autores das ofensas, porque isso alimenta os ''trolls'' e é
isso que eles querem.
BBC Brasil - Os procedimentos de
segurança do Facebook e do Twitter são suficientes para
proteger os alvos de bullying?
Rutledge - Seria ingênuo esperar que qualquer
companhia, mesmo do tamanho do Facebook e do Twitter, seja capaz de monitorar e
ajudar neste tipo de situação. E não dá para deixar só para as empresas aquilo
que devemos ser responsáveis, nós mesmos. É importante que as pessoas entendam
como funcionam as ferramentas e seus mecanismos para privacidade. Se a
conclusão for que o Facebook não oferece o suficiente, que as pessoas se
posicionem e reclamem: ''Não é suficiente''.
BBC Brasil - Que tipo de doenças são
ligadas ao uso da internet ou das redes sociais?
Rutledge - A resposta simples é não, não há doenças
causadas pela internet. Há preocupações recorrentes com o vício em internet ou
em redes socais. Mas vícios são doenças bastante sérias e a internet não cria
personalidades com vícios. As pessoas usam as redes da mesma forma que usam
álcool, jogos, chocolate, ou qualquer outra coisa que mascare problemas
maiores.
BBC Brasil - Problemas como...?
Rutledge - Falta de autoestima, depressão. É importante
chegar à real causa do vício, apenas cortar a internet não muda nada.
BBC Brasil - Temas como diversidade
sexual, racismo e machismo, vistos como tabus até recentemente, são hoje
bastante populares online. Como vê estes tópicos ganhando atenção?
Rutledge - É sempre positivo que as pessoas debatam e
desenvolvam seu conhecimento sobre temas. Mesmo que a conversa termine de forma
negativa, isso ainda vale para que se perceba o que está acontecendo a seu
redor. Afinal, tudo isso já acontecia, mas não tínhamos conhecimento – e isso
significa que estamos nos aproximando da possibilidade de transformá-las.
BBC Brasil - Quais são os conselhos
para os pais ajudarem seus filhos a não embarcarem nas ondas de ódio das redes
sociais?
Rutledge - A primeira coisa é conversar com as crianças
desde muito cedo sobre tecnologia. Muitos evitam porque não entendem bem a
tecnologia. Mas a tecnologia é apenas o "lugar" onde as coisas estão
acontecendo; o principal ainda são os valores. Então, se algo está acontecendo
em qualquer plataforma que os pais não conheçam bem, a sugestão é que chamem as
crianças e peçam que elas deem seu ponto de vista. Aí sim eles poderão entender
como as crianças estão lidando com a questão e, a partir daí, decidir quais
devem ser as preocupações. A responsabilidade pode ser compartilhada. É
importante ensinar os filhos a pensarem criticamente.
BBC Brasil - Muitos acham que ler
históricos de conversas dos filhos ou usar apps para controlá-los é a melhor
forma de ajudar as crianças. O controle é uma boa saída?
Rutledge - Os pais precisam entender que devem escutar
seus filhos. Claro que cada situação tem suas características, mas geralmente
controlar significa que você não conversou com eles e não lhes deu
oportunidades para tomar decisões.
O
problema é que, em algum momento, eles vão precisar tomar decisões por si
mesmos e você não vai estar ali, nem o seu "app de controle". Então,
é muito melhor dialogar, e isso costuma ser muito difícil para os pais, que
tendem dizer o que os filhos devem fazer, sem conversa. (BBC)
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário