quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

COLUNA WILSON BELCHIOR: Eleito antes da eleição

Na alegre Rua Santo Antônio, em Sobral, nos anos 50, moravam pessoas boas, cujas vidas geraram histórias interessantes. Uma delas ocorreu com um senhor que tinha nome de batismo Vicente e nome completo Vicente Gomes Parente. Natural da Serra do Rosário, era descendente de Inácio Gomes Parente, patriarca de uma rica e das mais tradicionais famílias sobralenses.
Câmara Municipal de Sobral 
(Foto antiga do Blog Catafau - de Sarto Rios)

Morava numa bela casa amarela nas proximidades e do mesmo lado da igrejinha, entre as casas da Dona Delfa e a do seu Barroso, fiscal fazendário, pai do Delano Barroso, meu amigo de priscas eras e menino dos mais inteligentes. Situava-se em frente ao Club Artístico Sobralense, presidido por José da Mata e Silva, um puxador de quadrilhas de São João, udenista inquebrantável e responsável vereador.

Em Sobral era querido por todos e conhecido como Pipiu. Tinha cabelos brancos e era um homem decente, com rosto de bom avô, com todos as condições para ser meu quarto avô da Rua Santo Antônio, que com ele seriam: Artur Anastácio, Ubaldo Solon, Oton Vasconcelos e seu Pipiu, lista de notáveis senhores, que não era justo a ninguém desmerecer.

Se não tive essa subida honra e felicidade, foi por culpa de um dos seus filhos, chamado Lister Ibiapina Parente, agrônomo sisudo, na época solteirão, que não era simpático, não só comigo, mas com toda a meninada de nossa rua, indisposição essa advinda de sua personalidade e de ocorrências havidas com seu famoso Jeep.

Já seu Pipiu era alegre e sensível. Adorava ir à Praça São João conversar com seus amigos, dentre os quais, seu primo e meu tio, Raymundo Gomes, e meu pai Otávio Belchior, que ele recebia em sua própria residência. Quando eu o conheci já era casado em segunda núpcias com uma distinta senhora de nome Déborah Ibiapina e formavam um casal feliz.

Pipiu contava a seus amigos que, certa vez, induzido por políticos da cidade, aceitou candidatar-se a uma Cadeira da Câmara Municipal de Sobral, cargo a que jamais aspirou. Mas, por insistirem, dizendo que seria facilmente eleito, que teria eleição garantida sem precisar gastar um só tostão com campanha política, aquiesceu.

No tempo dessa eleição em Sobral só se ouvia dizer: “O Pipiu está eleito; ele não precisa mais de votos”. “Eu não irei votar no Pipíu, apesar de ser meu amigo, simplesmente, por ele já ter votos demais”.

Pipiu não se mobilizou para o pleito, não fez campanha eleitoral e jamais pediu votos a alguém.

Realizada a eleição e terminadas as apurações, quando já ciente do resultado Pipiu foi para casa e assim falou com dona Débora:

- Débora, você não votou em mim?


- Para que Pipiu? Você já estava eleito, já tinha votos mais do que suficientes. Eu votei no nosso amigo que precisava de votos.

- Qual deles?

- O Gerardo!

- Débora, saiba de uma coisa: pensando que eu já estivesse eleito, e para ajudar o Gerardo, eu votei nele também. Você imagina quantos votos eu tive?

- Não, Pipiu. Quantos? Fostes o "Cabeça da Chapa", liderastes a votação?

- Que nada, Débora! Eu não tive um voto sequer.

- Meu Deus! Disse, atônita, Dona Débora.





(*) Wilson Belchior é engenheiro civil, articulista, poeta e memorialista.  



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