Não sei
nem como começar. Nunca adquiri habilidade para literatura ou para a arte de
escrever. Mesmo assim, vamos lá. Em 1944, nasci na zona rural do município de
Ubajara, no sítio Pitanga, distante sete quilômetros da sede do município.
Minha
única obrigação na infância era frequentar a escola da professora Fransquinha,
onde o objetivo primeiro era aprender a ler.
Comecei pela Carta de
ABC, depois veio a cartilha e exercitei a leitura do primeiro ao Quinto Livro.
Isso no turno da manhã. O resto do dia era brincar de pião, caçar de baladeira
e outras brincadeiras.
Aos 11 anos, fui
influenciado a ingressar no Seminário de Sobral pelo conterrâneo José Cândido
Fernandes que lá estudava. Sabia ler e escrever rudemente, daí a necessidade de
ingressar, como de fato ingressei no Pré-Seminário, à época, dirigido pelo
Padre Tupinambá (Francisco Tupinambá Melo). Os primeiros dias de internato
foram de saudade. Via meu pai e minha mãe por todos os cantos daquele casarão.
Dias depois, me habituei.
Meu pai chamava-se
André Rodrigues da Silva, agricultor e fabricante de rapaduras a quem presto
homenagem póstuma. Minha mãe é dona Amélia Fernandes da Silva, graças a Deus
ainda é viva aos 96 anos, lúcida e saudável. Que coisa boa. Eu muito lhes devo.
Em 1957, fiz exame de
admissão para o Seminário e, em 1958, passei a cursar o 1º ano. Entre na turma
dos menores. Lá fiz boas amizades. Seu Cunha, Abdoral, Zé Célio, Arimateia, Zé
Hudson e outros. Rotineiramente, no
primeiro dia de férias, era aquela festa. Logo após a missa, nós, eu e o Sena
(já falecido) por sermos conterrâneos, contratávamos os serviços do carreteiro
"7" para conduzir nossas malas até a agência do ônibus da empresa
"O Cajazeiras". Eram 30 dias em julho, de primeiro a 31 de agosto. No
fim do ano, era de 8 de dezembro a 8 de fevereiro. Duas férias por ano. No
entanto, no ultimo dia caracterizava-se por uma perversa melancolia e saudades
dos dias despreocupados.
Logo cedo, meu pai
montava em um cavalo e colocava-me na garupa para transportar-me até a agência
do ônibus em Ubajara. Minha mãe se despedia esboçando um forçado sorriso e nos
acompanhava com o olhar até o cavalo desaparecer nas curvas da estrada. Em
seguida, recolhia-se e desmanchava-se em choro, como depois me falou. Eu, na
despedida, chorava copiosamente, e meu pai me repreendia:
-“Menino, engole este choro, quando tu crescer e se tornar padre ou
doutor tu vai entender que tudo isto é para o teu bem”.
Anos depois, me
acostumei e tudo se tornou rotina. Em 1959, transferi-me para a turma dos
“maiores”. Leunam Gomes, Arimateia Mourão, Francisco Sampaio e eu fundamos a
Rádio Itamarati. Era um serviço de alto-falantes que tinha ramificações nos
(salões) recreios dos menores e dos maiores.
A rádio tinha uma
programação semelhante a qualquer outra estação de rádio: abertura, noticiário
de um modo geral, notícias esportivas, e musicais. O ponto alto da audiência
era a retransmissão, através da Rádio Jornal do Comercio, de Pernambuco, às 13
horas, do Repórter Esso que prendia a atenção de todos.
Os padres eram
aqueles homens sábios a quem nós muito admirávamos. Preparavam-nos para a vida
desde as coisas mais simples até as matérias curriculares por eles lecionadas.
Lembro-me, por exemplo, que o Padre Edson Frota dizia, em sala de aula, que nas
refeições nunca devemos nos fartarmos. Para uma boa digestão, é necessário
sairmos da mesa com um pouquinho de fome”. Dias atrás, em um programa de
televisão de muita audiência, vi e ouvi um médico dizer a mesma coisa. E
comentei com os meus filhos.
Eu era fascinado
pelas aulas de História do Padre Lira, o que me influenciou a formar-me em
História pela UECE – Universidade Estadual do Ceará, e lecionei essa matéria.
Recordo-me das aulas
de Matemática, do Padre Austregésilo (Francisco Austregésilo de Mesquita Filho)
em que ele se desdobrava para fazer com que entendêssemos regras de números
relativos, teoremas de Pitágoras e outros temas. Como não se reconhecer a dedicação
do Padre Osvaldo Chaves, ensinando-nos Literatura e Português; Padre Zé
Linhares, Ciência; Padre Albani, Latim; Padre Sadoc, Latim; Padre Moésia,
Francês. Desculpem-me se omiti o nome de algum mestre.
Formei-me em
História, bacharelei-me em Direito pela UFC e fiz-me Advogado. Exerci,
simultaneamente, o magistério e a advocacia. Na década de 70, lecionei nos
colégios São Francisco, Liceu do Ceará, Lourenço Filho e Sistema. Nos anos 80,
a advocacia sufocou o magistério e lecionei apenas nas escolas da rede
municipal de Fortaleza, até 1998 quando me aposentei.
Hoje, minha riqueza
maior é, com a ajuda da minha esposa Zélia, ter conseguido fazer com que nossos
três filhos – Andrea, Leandro e Flávia cursassem escolas de nível superior.
Trouxe comigo do Seminário
conceitos da Ética e Moral que me tornaram cidadão obediente aos bons ditames
da vida. Foram quatro anos inesqueciveis. De 1958 a 1961. Sem falar nos dois
anos de Pré-Seminário, 1956 e 1957. Defendo a instituição familia, uma vez que
sou casado há quarenta e tres anos com a mesma mulher.
Por questão de crise
vocacional, deixei o velho casarão aos 18 anos de idade.
(*) Francisco Flamario Rodrigues,
de Ubajara, estudou na Betânia de 1958 a 1961. Este texto está no livro “SEMINÁRIO DA BETÂNIA – AD VITAM – 65
DECALARAÇÕES DE AMOR”, de Leunam Gomes e Aguiar Moura.
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