Conquistar parte dos votos
brancos e nulos é um dos desafios que o candidato à Presidência Fernando Haddad (PT) precisaria superar para vencer o líder no primeiro turno, Jair Bolsonaro (PSL).
Haddad tem
41% das intenções de voto, de acordo com a pesquisa Ibope divulgada nesta
segunda-feira, 15 de outubro. Bolsonaro tem 59%. Como a diferença na intenção
de votos é alta – 18 pontos –, Haddad precisaria não apenas atrair os votos que
foram para outros candidatos no primeiro turno, mas convencer alguns dos que
votaram em branco e nulo a se posicionarem, segundo o sociólogo Thiago de Aragão,
da Arko Consultoria.
Isso
porque, na prática, esses votos ajudam quem está na frente na disputa - como
não são contabilizados entre os votos válidos, facilitam a obtenção de maioria
pelo líder nas pesquisas. A mesma lógica vale para as abstenções.
Embora
historicamente o número de brancos e nulos sempre seja menor no segundo turno,
os especialistas afirmam que não necessariamente a tendência vai se repetir no
segundo turno em 2018, porque o pleito deste ano é extremamente atípico.
"A
comparação (com outros anos) é problemática", explica o cientista político
Fábio Wanderley Reis, professor da UFMG. "Estamos diante de uma situação sui generis."
Entre as características singulares do pleito deste ano
está o fato de que as alianças partidárias e o tempo de TV tiveram muito menos
importância do que em outros anos, por exemplo, com a internet e as redes
sociais assumindo um papel muito maior.
Neste ano, os nulos e brancos somaram 8,79% do total de
votos no primeiro turno - um número que está na média dos registrados nas
eleições presidenciais desde o fim da ditadura. O menor índice foi de 6,4% em
1989 e o maior, de 10% em 2002 e em 2014.
Em 2014, votos brancos e nulos somaram 10% do total no
primeiro turno e caíram para 6% no segundo. Em 2010, eles foram 7,1% no
primeiro turno e 6,7% no segundo. Já as
abstenções (pessoas que simplesmente não vão votar) tradicionalmente aumentam:
foram 19% dos eleitores registrados no primeiro turno de 2014 e 21% no segundo.
De acordo
com a última pesquisa Ibope, a intenção de nulos e brancos para o segundo turno
é ligeiramente superior à registrada no primeiro, de 9%.
Como a rejeição afeta nulos e brancos? - Na disputa pelos
votos no segundo turno, os dois candidatos têm em comum altos índices de
rejeição. Na pesquisa Ibope desta segunda-feira, 35% dos eleitores
disseram que não votariam de jeito nenhum em Bolsonaro e 47% rejeitaram Haddad.
A um dia
do primeiro turno, a situação era inversa: o capitão reformado tinha 43% de
rejeição e o petista, 36%, conforme a pesquisa Ibope de 6 de outubro. "Tem
muita gente que está declarando voto em branco pela incerteza, pela rejeição ao
que é visto como dois extremos", afirma Reis. No entanto, diz ele, não é
possível afirmar que a polarização vai desestimular o eleitor a votar. Pelo
contrário: o extremo desgosto com um dos candidatos pode incentivar pessoas que
não escolheram no primeiro turno a se posicionar para neutralizá-lo.
Uma
possibilidade é inclusive que a polarização faça com que, além dos brancos e
nulos, o número de abstenções também caia. Essa é a
opinião do professor Lucio Rennó, do Instituto de Ciência Política da
Universidade de Brasília.
"É
difícil especular, mas quanto mais competitiva uma eleição, maior pode ser o
comparecimento. Tenderia a dizer que a competitividade pode nos mostrar o outro
lado da moeda (diminuir a abstenção)", afirma Rennó.
Questão matemática - Outro
ponto importante, na visão dos analistas, é que, na prática, uma das
candidaturas sempre acaba se beneficiando dos votos nulos e brancos - isso
porque, matematicamente, eles ajudam quem está na frente, tanto no primeiro
quanto no segundo turno.
Não é que
o voto vá para alguém, mas, quando o eleitor vota nulo ou branco, esses votos
não são contados entre os votos válidos. Isso faz com que, quanto maior o
volume de brancos e nulos, mais fácil seja obter a maioria. Isso
porque, para eleger um presidente, é preciso mais de 50% dos votos válidos, não
do total da votação.
Um
exemplo: Se a eleição fosse em uma classe de dez alunos e todos votassem em um
dos dois candidatos, para obter maioria e vencer seriam necessários 6 votos.
Mas se 3 alunos votassem nulo ou branco, para obter maioria e vencer seriam
necessários apenas 4 votos. Ou seja, fica mais fácil obter maioria e mais fácil
vencer.
O mesmo
vale se os 3 alunos faltarem à votação. Para o resultado final, os votos brancos,
nulos e as abstenções (pessoas que faltam à votação) têm o mesmo efeito: ficam
fora da contagem dos votos válidos.
Mas como
isso tende a beneficiar o favorito nas pesquisas - que, no caso, é Jair
Bolsonaro?
Considerando
o total das intenções de voto, o ex-capitão está à frente, com 52%, enquanto
Haddad tem 37%, de acordo com a última pesquisa Ibope, desta segunda-feira. Há,
portanto, uma diferença de 15 pontos entre os dois candidatos. A intenção de
brancos e nulos é de 9% e os indecisos somam 2%.
Quando se consideram só os votos válidos, contudo,
Bolsonaro sobe 7 pontos e tem 59% das intenções, ao mesmo tempo em que Haddad
sobe 4 pontos e chega a 41%. A distância se aprofunda para 18 pontos.
Isso
acontece porque, sem os nulos e brancos na conta, cada voto individual
"vale" um pouquinho mais e, portanto, quem hoje tem mais votos sobe
mais pontos. "Não
se posicionar acaba contribuindo pra quem está ganhando", afirma Reis.
Para votar
em branco, basta clicar no botão "branco" presente no teclado da
urna. Para anular, por sua vez, é preciso digitar um número que não corresponda
a nenhum candidato e apertar confirma.
Como isso afeta as campanhas - Durante a
campanha eleitoral, muitos apoiadores de Bolsonaro têm tentado aproveitar essa
vantagem matemática: depois do primeiro turno, diversos militantes
pró-Bolsonaro passaram a incentivar o voto em branco de quem rejeita o
candidato.
Mas quem
realmente precisa correr para conquistar os eleitores que votaram branco e nulo
é a campanha do candidato do PT - ele precisa atrair uma boa parte deles se quiser
superar a diferença de 18 pontos contra o adversário.
"Certamente
é uma questão mais crucial, mais decisiva para Haddad, que tem que conquistar o
pessoal que não votou e ganhar votos de quem declarou voto a Bolsonaro",
explica Reis.
Essa é
também a opinião do sociólogo Thiago de Aragão, diretor da consultoria Arko. "A
onda de crescimento que Bolsonaro teve no primeiro turno continua. Se a gente
tem um candidato favorito, ele tem a vantagem de não precisar se
reinventar", afirma Aragão.
A campanha
de Haddad tentou se reinventar: mudou a identidade visual para ter menos
vermelho e mais verde e amarelo, afastou a imagem de Lula e fez um aceno ao
centro e aos que ainda não decidiram ou pretendem votar em branco.
Segundo os
analistas, o fato de ter chegado em segundo lugar no segundo turno e a
necessidade de atrair esses votos fez com que Haddad tenha sido empurrado para
essa estratégia. "Se
reforçasse o caráter de esquerda, iria consolidar os votos que teve, mas
correria o risco de alienar os indecisos e eleitores de outros candidatos no
primeiro turno.", afirma Aragão.
No
entanto, de acordo com o especialista, mesmo que essa estratégia seja bem
sucedida, ela não será suficiente para ajudar o candidato do PT a virar o jogo.
"Haddad depende de algum acontecimento extraordinário ou de um erro do
adversário para ganhar", avalia.
"Os
principais pontos negativos que ameaçaram Bolsonaro no primeiro turno estão
ligados a coisas que foram ditas por sua equipe. O que mais o prejudica é seu
próprio pessoal."
Ou seja,
de acordo com ele, Bolsonaro nem precisaria se preocupar com nulos e brancos,
abstenções ou eleitores indecisos. "Em tese ele já tem o que precisa para
ganhar. Basta ter uma campanha discreta e não cometer nenhum erro", diz o
especialista. (BBC)
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