"A população estacionou nas praças
públicas, impressionada com o surpreendente espetáculo que a natureza lhe
oferecia. Parecia que a aurora ia romper e, naquela escuridão, os galos
cantavam e as avezinhas procuravam agasalho."
Assim o jornal Folha do
Littoral descreveu o momento em que a população de Sobral, no interior do Ceará, presenciou um eclipse total do
Sol em 1919. Mas aquele não era um eclipse qualquer.
O fenômeno permitiu que um
grupo de cientistas comprovasse pela primeira vez a teoria da relatividade
geral do físico alemão Albert Einstein, consolidando uma das maiores revoluções
da história da ciência.
Meses depois do fim da
Primeira Guerra Mundial, a façanha catapultou o físico, que até
então era pouco conhecido, para a fama mundial.
"Alguns cientistas dizem
que o anúncio dos resultados do experimento feito nesse eclipse foi um dos
maiores momentos da ciência", disse à BBC News Brasil o físico Luis Carlos
Bassalo Crispino, da Universidade Federal do Pará (UFPA), autor de artigos
sobre o episódio.
Nos anos seguintes, a
relatividade geral de Einstein permitiria a formulação da teoria do Big Bang,
um modelo para explicar como começou o universo. Um ramo especial da
astrofísica, a cosmologia física, foi criado só para estudar esse tema.
As ideias do alemão também
permitiram que os cientistas desenvolvessem a ideia dos buracos negros e,
muitos anos depois, o funcionamento do sistema de GPS - que usa a posição de
satélites no espaço para
localizar aparelhos na Terra.
Mas tudo começou com uma ideia
pouco convencional.
Uma revolução incomparável - No
século 19, a física avançava a passos largos, com descobertas sobre a
eletricidade, a energia cinética (movimento), a termodinâmica (energia em forma
de calor) e a luz, finalmente entendida como uma onda eletromagnética.
Foi a partir destas ideias que
o físico alemão Albert Einstein começou a pensar sobre o comportamento da luz e
sua velocidade, usando uma série de "experimentos mentais" -
problemas cujo resultado ele previa apenas em sua imaginação.
Em 1905, ele afirma que as
medidas de espaço e tempo poderiam mudar de acordo com o ponto de referência.
Até então, toda a física se amparava na ideia de que tempo e espaço eram absolutos.
A teoria da relatividade
especial, como ficou conhecida, já causou espanto e interesse na comunidade
científica, mas servia apenas para casos específicos da física.
Nos anos seguintes, enquanto
as potências europeias, entre elas a Alemanha e o Reino Unido, caminhavam para
a Primeira Guerra Mundial, o jovem alemão daria um passo ainda mais ousado:
questionar a Lei da Gravitação Universal do inglês Isaac Newton.
Sua teoria da relatividade
geral, publicada em 1915, confrontava um dos fundamentos da física clássica.
Nesta teoria, Einstein afirma
que o espaço e o tempo, interligados, formam uma espécie de tecido que conforma
tudo ao nosso redor e que pode se curvar, de acordo com a massa dos corpos.
Essas curvaturas explicam
desde a gravidade, até o movimento dos planetas e estrelas no espaço, a
existência dos buracos negros e a formação de todo o universo.
"Filosoficamente, a
relatividade geral foi quase tão importante quanto a ideia de Copérnico de que
a Sol, e não o Terra, estava no centro do universo. Ela revolucionou
completamente a maneira como os cientistas deveriam pensar sobre o
funcionamento do mundo ao seu redor. As coisas ficaram mais complexas",
disse à BBC News Brasil Teresa Wilson, física do Observatório Naval dos Estados
Unidos.
O fato de um alemão, naquele
momento, propor uma mudança tão fundamental na física também causou polêmica.
Alguns pesquisadores simplesmente não acreditaram nele, e outros ignoraram suas
ideias.
"Por causa da guerra, os
cientistas alemães e austríacos eram ignorados e excluídos dos órgãos
internacionais. Havia muito ressentimento com relação a eles. Também deixaram
de ser convidados a conferências e associações", disse à BBC News Brasil o
astrofísico e historiador Daniel Kennefick, autor do livro No Shadow of a Doubt (Sem Sombra de Dúvida, em
tradução livre), sobre eclipse de 1919.
Mas alguns acadêmicos se
consideravam "internacionalistas" - acreditavam que a ciência deveria
reunir esforços de pessoas de qualquer nacionalidade. Entre eles estava o
próprio Einstein, que havia renunciado a sua cidadania alemã e adotado a suíça
em protesto contra o militarismo do regime germânico.
Para vencer a resistência da
comunidade científica à teoria de Einstein, no entanto, seria preciso confirmar
suas previsões. Isso só aconteceria quatro anos após a formulação da teoria - e
após o término da Primeira Guerra (em 1918) -, quando pesquisadores ingleses
puderam viajar até o interior do Brasil para ver um eclipse.
Por que um eclipse? - Segundo
a relatividade geral, a força de gravidade é um efeito causado pela curvatura
do espaço-tempo.
Um corpo massivo como o Sol,
por exemplo, distorce o espaço-tempo a seu redor, e faz com que outros objetos
menores tenham que seguir essa distorção.
Até mesmo a luz de outras
estrelas, em seu caminho até nós na Terra, tem sua trajetória alterada quando
passa perto do Sol.
Por isso, se pudessem ser
vistas durante o dia, as estrelas se pareceriam um pouco mais afastadas do Sol
do que realmente estão.
Cálculos de Einstein previam
um desvio da luz duas vezes maior do que o que era previsto de acordo com a
teoria de Newton.
Para testar a teoria, seria
necessário fotografar estrelas próximas ao Sol e depois fotografá-las no mesmo
lugar à noite. Em seguida, medir a posição delas no céu a cada momento, e
encontrar a diferença entre estas medidas.
O cenário ideal para isso
seria um eclipse total, um alinhamento que faz com que a Lua esconda o Sol,
projetando sua sombra sobre a Terra.
A escuridão permite que os
astrônomos observem as estrelas, os planetas e a atmosfera solar durante o dia,
com mais facilidade.
"Para comprovar que o
campo gravitacional do Sol desvia a luz de uma estrela, ela precisa estar
próxima do Sol, senão você não consegue perceber esse efeito. Mas o Sol é tão
brilhante que normalmente não se consegue ver as estrelas durante o dia. Por
isso era necessário fazer o experimento durante um eclipse total", explica
Daniel Kennefick.
Einstein sabia que organizar
esse experimento era complicado. Ele chegou a investir suas próprias economias
na expedição do astrônomo alemão Erwin Finlay-Freundlich para observar um
eclipse na Crimeia, na Rússia, em 1914, um ano antes de publicar a teoria da
relatividade geral.
Mas, quando Freundlich chegou
à Rússia, explodiu a Primeira Guerra. Seus instrumentos foram confiscados e ele
não conseguiu realizar o experimento.
A busca pelo 'eclipse
perfeito' - Em 1917, os astrônomos
ingleses Frank Watson Dyson, diretor do Observatório Real de Greenwich, o mais
importante do Reino Unido, e Arthur Stanley Eddington, um conhecido
astrofísico, queriam comprovar - ou não - a teoria de Einstein, por motivos
diferentes.
"Como muitos astrônomos,
Frank Dyson era cético em relação à relatividade geral. E, naquele momento, os
alemães eram percebidos como o inimigo. Ele também tinha um certo sentimento
patriótico de que a teoria de Isaac Newton (que era inglês)deveria ser tratada
com mais respeito do que a de um jovem da Alemanha", disse à BBC News
Brasil o astrônomo Tom Kerss, do Real Observatório de Greenwich.
Eddington, por sua vez, era um
entusiasta das teorias de Einstein e um internacionalista, que acreditava no
ideal de juntar as melhores mentes de todas as nacionalidades em busca da
verdade científica.
Segundo o historiador Daniel
Kennefick, o entusiasmo de Eddington ajudou a convencer Dyson sobre a
importância de organizar uma expedição para testar as ideias de Einstein sobre
a luz.
"Dyson já havia observado
muitos eclipses e sabia que aquele experimento era importante e possível. Era
um momento em que os instrumentos já tinham evoluído o suficiente pra medir com
confiança os resultados que Einstein previa", disse Tom Kerss.
Cálculos indicavam que em 1919
um eclipse seria visível na América do Sul e na África. Nesse momento, o Sol
estaria perto de um aglomerado de estrelas especialmente brilhantes, as Híades.
Parecia a oportunidade
perfeita para a ciência e para os dois astrônomos ingleses. O primeiro passo
era escolher o local onde eles iriam observar o fenômeno.
"Durante um eclipse
solar, a sombra da Lua viaja pela Terra de oeste para leste. Então eles
desenhavam seu trajeto precisamente em um mapa e começavam a pesquisar",
explica Kennefick.
Nesse caso, a faixa de
totalidade do eclipse - ou seja, o trecho em que o Sol estaria completamente
encoberto - cruzaria toda a América do Sul, começando na Bolívia, passaria pelo
Oceano Atlântico e terminaria no continente africano, na Tanzânia.
"Na Bolívia e no leste da
África não funcionaria, porque o Sol estaria ainda nascendo ou já começando a
se pôr, e isso causaria distorções atmosféricas que prejudicariam a medição. A
maior parte do trajeto também seria em áreas de floresta tropical de um lado ou
de outro. No oceano Atlântico também não era bom, porque um navio não teria
estabilidade suficiente para os instrumentos", diz o historiador.
A decisão de ir ao Brasil foi
tomada depois que Dyson recebeu uma carta do engenheiro Henri Charles Morize,
diretor do Observatório Nacional do Rio de Janeiro e um dos fundadores da
Academia Brasileira de Ciências (ABC).
]Na carta, Morize dizia que
Sobral - a segunda maior cidade do Ceará, bem conectada por trens e por um
porto relativamente próximo - seria o melhor lugar para acompanhar o fenômeno.
No entanto, Dyson e Eddington
decidiram que ter apenas um ponto de observação não seria suficiente. Era comum
que os resultados de expedições como essa fossem prejudicados por más condições
de tempo. Em geral, nuvens acabavam impedindo que as estrelas fossem
fotografadas.
"Apesar do risco, eles
estavam determinados a aproveitar essa oportunidade, porque sabiam que aquele
eclipse, com uma duração longa e estrelas tão brilhantes, seria especial",
disse Kennefick.
Por isso, eles decidiram
mandar duas equipes de astrônomos a lugares diferentes: a Sobral, no Brasil, e
à Ilha de Príncipe, parte do arquipélago de São Tomé e Príncipe, na costa
africana.
Como fazer ciência em meio à
guerra? - Depois de decidir seu destino, os cientistas tiveram que solucionar
outro problema: a Europa ainda estava em guerra.
Dyson usou sua influência para
conseguir financiamento e convencer o governo britânico a manter seu colega
Eddington fora da frente de batalha. Mesmo assim, era muito difícil encontrar
astrônomos com experiência e navios para levá-los ao Brasil e a África.
"Eddington queria ir para
Príncipe, mas precisou levar com ele um relojoeiro do interior da Inglaterra,
porque todos os seus assistentes haviam morrido na guerra", afirma
Kennefick.
Dyson teve que ficar na
Inglaterra e, após uma série de contratempos, encontrou dois candidatos para
mandar a Sobral. Os escolhidos foram Charles Davidson, um calculista sem
formação acadêmica, mas com muita experiência em telescópios, e o astrônomo
irlandês Andrew Crommelin, que operaria um segundo telescópio levado por segurança.
"Outro problema da guerra
era que os britânicos tinham poucos instrumentos disponíveis, alguns haviam
sido confiscados pelos russos em 1914. Eles tiveram que pedir um telescópio
emprestado aos irlandeses", disse à BBC News Brasil o astrofísico Tom Ray,
do Instituto de Estudos Avançados de Dublin, que encontrou e restaurou o
equipamento original que foi a Sobral.
Depois de muitas mudanças de planos, o calculista Charles Davidson e
o astrônomo irlandês Andrew Crommelin foram os escolhidos para a expedição do Brasil
Apesar de ser menor e mais
velho, o telescópio irlandês foi o autor dos resultados que fizeram história.
"Naquele momento, era
preciso ter telescópios que fossem estáveis e precisos para conseguir fazer
imagens do Sol de longa exposição. O telescópio irlandês tinha sido criado
especialmente para eclipses em 1900 e tinha um campo visual maior, que permitia
ver mais estrelas", explica Ray.
Em novembro de 1918, o Armistício
de Compiègne anunciou o fim da guerra e abriu caminho para a expedição.
Eddington foi para Príncipe
com seu assistente e Davidson e Crommelin saíram de Liverpool, na Inglaterra,
para Belém, no Pará, à bordo do Anselm, o primeiro navio inglês a retomar a
rota para o Brasil - que tinha sido paralisada por conta da guerra.
Os 'sábios ingleses' em Sobral
- Em Belém, Davidson e Crommelin foram recebidos com festa no porto, e ainda
tiveram tempo de fazer uma viagem de barco pelo rio Amazonas até Manaus.
Em seguida, os britânicos
foram de navio para Camocim, já no Ceará, e de trem para Sobral. No Ceará, a
imprensa também se animava com a chegada dos estrangeiros, que eram chamados de
"sábios ingleses".
Em 26 de abril, o jornal O
Malho dizia que "por amor à ciência", eles iriam "afrontar a
seca, a febre amarela e a falta de conforto".
Na época, de acordo com a
pesquisa de Luis Crispino, da UFPA, o governo brasileiro enviou uma equipe de
médicos especialmente para conter a febre amarela no Ceará, preocupado com os
visitantes.
"Precisamos defendê-los,
por todos os modos, para que não se arrependam da sua viagem ao Ceará. É o
ministério da Agricultura quem os vai hospedar em Sobral, e esse, de acordo
comigo, fará proteger as casas que lhes forem destinadas com telas de arame, a
fim de evitar a entrada do mosquito que serve de veículo à febre",
escreveu o médico paraense Emygdio de Matos, que era parte da comissão de
combate ao vírus no país.
O Observatório Nacional
organizou a logística da expedição britânica e também de uma americana, que foi
fazer medições sobre o campo magnético terrestre e da eletricidade atmosférica.
Mas a "falta de
conforto" anunciada pelo jornal não atingiu os pesquisadores. Eles se
hospedaram na casa do deputado e coronel Vicente Saboya, dono de um poço
artesiano próprio. Água ali, tanto para as atividades diárias quanto para
revelar as imagens do eclipse, não seria um problema.
A pista de corrida do Jockey
Club da cidade, que costumava atrair curiosos, também foi reservada para o
acampamento de observação dos britânicos e americanos.
"Pelos registros que
temos, dá pra perceber que eles ficaram impressionados com a boa recepção das
pessoas de lá. Havia muito interesse na chegada deles e todo mundo queria
ajudar", diz Daniel Kennefick.
"Mas eles também
perceberam que Sobral passava por um período ruim. Estava muito seco e as condições
de vida eram difíceis. Crommelin escreveu que a cidade tinha um aspecto
deprimente, porque era muito seca e empoeirada. Ele também mostrou compaixão
pelas pessoas que viu desesperadas cavando buracos em um rio seco, buscando
água."
Enfim, o eclipse - A excitação
em Sobral era tamanha que, segundo os jornais da época, o dia do eclipse foi um
feriado informal na cidade. Todo o comércio foi fechado e a população encheu as
praças públicas desde o início da manhã.
As igrejas também ficaram
repletas de fiéis com medo de que o escurecimento do céu fosse o anúncio de um
mau agouro.
"A Prefeitura Municipal
instalou dois pequenos telescópios, cobrando pequenas quantias aos que
desejavam observar o eclipse. Esse dinheiro reverterá a favor da construção do
jardim da cidade. Aqueles aparelhos foram disputadíssimos", dizia o jornal
O Malho.
No entanto, o dia 19 de maio
de 1919 amanheceu nublado. Por sorte, cerca de um minuto antes que o Sol fosse
completamente coberto pela sombra da Lua, um vento afastou as nuvens. Os
astrônomos tiveram cerca de quatro minutos para fazer 27 fotos do céu,
mostrando as 12 estrelas que queriam observar.
Nas ruas, os moradores de
Sobral chegaram a quebrar as vidraças da porta de uma casa para conseguir
pedaços de vidro que, escurecidos por velas, servissem para olhar o céu.
"Na fase aguda do
eclipse, o 'stock' esgotou-se e o recurso que se apresentou foi o assalto às
vidraças. A casa de um nosso vizinho, na sua ausência, pois andava também vendo
o eclipse, sofreu um terrível ataque, e uma das portas de sua linda habitação
ficou sem duas lâminas das maiores e mais preciosas", escreveu o
correspondente do jornal Folha do Littoral.
Os britânicos tiveram um
problema. O calor intenso em Sobral, segundo o físico Luis Crispino, pode ter
causado uma dilatação incomum no espelho do seu principal telescópio. Por isso,
algumas imagens ficaram distorcidas e, portanto, menos confiáveis.
O pequeno telescópio irlandês,
no entanto, produziu oito imagens nítidas e impressionantes do Sol escurecido e
da luz das estrelas.
Um mês mais tarde, Davidson e
Crommelin fotografaram as mesmas estrelas, exatamente no mesmo lugar do céu, só
que à noite. Agora já tinham o que precisavam para testar a teoria de Einstein.
Em agosto de 1919, os
britânicos começaram o caminho de volta à Inglaterra.
Em Príncipe, Eddington teve
menos sorte. O tempo fechado permitiu poucas imagens aproveitáveis, nas quais
aparecia um número menor de estrelas.
No dia do eclipse, os moradores de Sobral chegaram a quebrar a vidraça de uma casa para conseguir
cacos de vidro que permitissem ver o sol. Foto: Observatório Nacional
Seus resultados já pareciam
favoráveis à teoria de Einstein, mas, sem base de comparação, crescia a
ansiedade pela chegada da expedição de Sobral.
O dia que mudou a física - Em
novembro de 1919, foi publicado o estudo final sobre o eclipse,
assinado por Dyson, Eddington e Davidson.
"Os resultados das
observações aqui descritas parecem confirmar a teoria da relatividade geral de
Einstein", diz o trabalho.
Nele, os pesquisadores também
afirmam que as imagens do telescópio irlandês de Sobral eram as mais
importantes e confiáveis. Era o primeiro experimento prático a confirmar a
teoria do jovem físico alemão.
"Nem todos ficaram
convencidos", disse à BBC News Brasil Virginia Trimble, professora de
Física e Astronomia da Universidade de Califórnia Irvine, nos EUA. "Os
cientistas continuaram fazendo medições em eclipses para comparar seus
resultados. E, nos anos 1970, as imagens de 1919 foram examinadas outra vez,
com instrumentos mais avançados, para garantir que os números estavam
corretos",
"Na verdade, a teoria da
relatividade geral foi testada muitas vezes e passou perfeitamente em todos os
testes que fizemos. É impressionante."
Como Einstein reagiu? - Em
setembro, Albert Einstein tinha recebido um telegrama de um amigo holandês
dizendo que os resultados da expedição de Eddington a Príncipe, ainda que
inconclusivos, apontavam para a confirmação da sua teoria.
Eddington já falava disso em
conferências internacionais, mas não escreveu pessoalmente a Einstein por causa
do clima tenso que ainda existia entre acadêmicos da Inglaterra e da Alemanha
após a guerra, terminada em novembro de 1918.
"Einstein estava muito
ansioso pelo experimento, mas quando o resultado finalmente chegou, ele já
estava tão convencido da beleza e da coerência de sua teoria, que parecia nem
precisar da comprovação", disse Daniel Kennefick.
Anos depois, a filósofa alemã
Ilse Rosenthal-Schneider contou em um de seus livros que estava com Einstein no
momento em que ele recebeu o telegrama.
Ela perguntou o que ele faria
se o resultado final fosse desfavorável a suas ideias, e ele, calmamente,
respondeu: "Eu teria pena de Deus, porque a teoria está correta".
Mas, logo em seguida, o físico
escreveu a sua mãe contando que recebeu a "notícia feliz" de que sua
teoria havia sido confirmada.
No dia 6 de novembro, o
resultado final foi anunciado com pompa na União Astronômica Internacional. O
filósofo e matemático Alfred North Whitehead, que estava na cerimônia,
descreveu a cena como "de intensa emoção".
"Havia um elemento
dramático naquele cerimonial tão cênico e tão tradicional, que ocorria tendo
como pano de fundo um retrato de Newton e nos lembrava que a maior das
generalizações científicas acabava - depois de mais de dois séculos - de
receber a sua primeira modificação", escreveu.
No entanto, o próprio Einstein
se manteve humilde em relação a sua descoberta. Em um artigo publicado dias
depois da cerimônia no jornal Times of London, ele afirmou que "ninguém
deve pensar que a grande criação de Newton pode ser derrubada por esta ou
qualquer outra teoria".
"Suas ideias claras e
amplas sempre terão a importância de serem a base sobre a qual nossa concepção
moderna da física foi construída."
No mesmo artigo, Einstein
reconhece a "alegria e gratidão" que sentia pela oportunidade de se
comunicar com cientistas ingleses "depois do lamentável rompimento das
relações internacionais entre homens da ciência" que aconteceu na Primeira
Guerra.
O ressentimento com relação a
alemães e austríacos permaneceu por muito tempo depois da guerra, segundo
Daniel Kennefick, mas Einstein passou a ser uma exceção. "Em muitos
encontros científicos ele era o único alemão convidado", diz.
A atenção que a relatividade
geral recebeu da imprensa também fez com que Einstein se tornasse uma
celebridade mundial. Ele chegava a ser parado nas ruas por admiradores.
"Disso ele não gostou
muito. Não suportava ter que falar com repórteres o tempo inteiro e chegou a
dizer que: 'esse tormento é culpa daquela expedição inglesa'", conta
Kennefick.
Ele não esqueceu, no entanto,
da alegria de ver comprovada a teoria que chamava de "seu pensamento mais
feliz".
Em 1925, quando fez uma visita
ao Rio de Janeiro, o físico alemão escreveu em dedicatória ao empresário Assis
Chateaubriand: "O problema concebido pela minha mente foi respondido pelo
luminoso céu do Brasil".
Um ilustre desconhecido - Em
Sobral, o tempo diminuiu o alvoroço causado pelo eclipse. Só em 1999 a cidade
ganhou um pequeno museu dedicado ao episódio e, em 2015, um planetário.
No início dos anos 2000 a cidade
de Sobral ganhou um museu dedicado ao eclipse,
um planetário e monumentos que
relembram o episódio. Foto: Prefeitura de Sobral
O físico Ildeu Moreira,
presidente da Academia Brasileira de Ciências, disse à BBC News Brasil
acreditar que "a vinda dos britânicos em 1919 tenha contribuído para que
Sobral desse mais atenção à educação".
"Mas um motorista de táxi
me disse que a maioria das pessoas hoje não sabe nada sobre a expedição."
No último mês de março, em
preparação para as comemorações de 100 anos do eclipse, a prefeitura de Sobral
inaugurou uma estátua de Albert Einstein feita de argila e bronze. Nela, o
cientista aparece descontraído, de bermuda, camisa aberta, chinelos de couro e
cabelos ao vento.
"Quando colocamos a
estátua na praça, alguns jovens encostaram e perguntaram: 'Quem é esse?'.
Disseram que deveríamos ter colocado uma placa com o nome dele, mas achamos que
é mais interessante deixar as pessoas pesquisarem", diz Moreira. (BBC)
Nenhum comentário:
Postar um comentário