Mais da metade dos brasileiros entrevistados por uma pesquisa declararam que sua saúde emocional e mental piorou desde o início da pandemia, em índice superior à média dos 30 países e territórios pesquisados.
Segundo pesquisa do instituto Ipsos, encomendada
pelo Fórum Econômico Mundial e cedida à BBC News Brasil, 53% dos brasileiros
declararam que seu bem-estar mental piorou um pouco ou muito no último ano.
Essa porcentagem só é maior em quatro países: Itália (54%), Hungria (56%),
Chile (56%) e Turquia (61%).
"A gente já havia percebido isso em outra
pesquisa global que fizemos em março do ano passado, quando 41% dos brasileiros
relatavam ter sintomas como ansiedade, insônia ou depressão já por consequência
da pandemia", diz à BBC News Brasil Helena Junqueira, gerente de pesquisas
digitais do Ipsos.
Em meio à devastação causada pela covid-19 no país
e a necessidade de isolamento social, "a percepção é de que a saúde mental
das pessoas está piorando, e além disso o tema se tornou mais discutido
recentemente. É um assunto mais presente", prossegue Junqueira.
Outros estudos sobre o mesmo tema também trazem
dados preocupantes.
Um deles, publicado pela Fiocruz com
outras seis universidades em meados do ano passado, dizia que "sentimentos
frequentes de tristeza e depressão afetavam 40% da população adulta brasileira,
e sensação frequente de ansiedade e nervosismo foi relatada por mais de 50% das
pessoas".
Um relatório de 2017 da Organização
Mundial da Saúde (OMS) apontava o Brasil como o país com a maior prevalência de
transtornos de ansiedade nas Américas: o problema afetava 9,3% da população, o
equivalente a 18,6 milhões de pessoas.
Transtornos depressivos foram relatados por 5,8%
dos brasileiros, ou 11,5 milhões de pessoas.
"De fato, vemos como isso é um problema aqui
no Brasil (com as pesquisas), e a situação atual da pandemia tem pesado
muito", diz Junqueira. "As notícias são muito tristes, e (com o
isolamento social e a perda de redes de apoio) as pessoas têm perdido as
estratégias para lidar com isso."
Saúde mental global
É claro que não é um problema exclusivo do Brasil:
na média global, 45% dos cerca de 21 mil entrevistados pelo Ipsos afirmaram que
sua saúde mental piorou um pouco ou muito no último ano, na vida sob a
pandemia.
E em apenas três países (Índia, China continental e
Arábia Saudita) dos 30 pesquisados, houve mais gente dizendo que sua saúde
mental melhorou do que gente que acha que ela piorou.
"O impacto da pandemia na saúde mental das
pessoas já é extremamente preocupante", afirmou, ainda em maio de 2020, o
diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus.
"O isolamento social, o medo de contágio e a
perda de membros da família são agravados pelo sofrimento causado pela perda de
renda e, muitas vezes, de emprego".
Na época, a OMS alertou que entre os grupos de risco
estavam, por exemplo, "mulheres, particularmente aquelas que estão fazendo
malabarismos com a educação em casa e trabalhando em tarefas domésticas;
pessoas idosas e quem possui condições de saúde mental pré-existentes".
Transtornos mentais não aumentaram durante a
pandemia, dizem pesquisadores
É importante, porém, fazer a ressalva que pesquisadores
consultados em uma reportagem da BBC News Brasil viram a quantidade de
diagnósticos de transtornos mentais se manter relativamente estável durante a
pandemia.
Portanto, não é possível afirmar que o isolamento
social ou o contexto de luto tenham levado, por exemplo, a um aumento nos casos
de suicídio - como chegou a insinuar o presidente Jair Bolsonaro, no mês
passado, ao criticar medidas de lockdown.
Um estudo publicado pela revista
científica Lancet nesta terça-feira (13/4) sobre tendências de suicídio em
cidades ou regiões de 21 países (Brasil incluído) não identificou aumento de
casos durante o período da pandemia, embora faça a ressalva de que os dados oficiais
dos países podem ainda não estar completos e de que o tema precisa ser
constantemente monitorado.
O que não quer dizer - tal como mostram as
pesquisas - que a pandemia não esteja cobrando um preço do bem-estar mental das
pessoas.
"É esperado sentir-se mal, triste, confuso e
revoltado diante de uma situação nova e ruim, como foi o aparecimento da covid-19.
Mas há todo um processo entre esses sentimentos e o desenvolvimento de um
transtorno mental", disse à BBC News Brasil em março psiquiatra André
Brunoni, professor associado da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo.
Volta à normalidade?
De volta às respostas dos brasileiros na pesquisa
do Ipsos, além dos 53% que viram sua saúde mental piorar, cerca de um terço
(34%) dos entrevistados afirmou que sua saúde mental mudou pouco no último ano,
e cerca de 13% sentiram melhora no bem-estar emocional.
Ao serem questionados sobre quando esperavam voltar
à normalidade como era antes da covid-19, metade dos entrevistados afirmou
esperar que isso aconteça ao longo deste ano. Pouco mais de um terço (35%),
porém, diz acreditar que isso vai levar ainda mais tempo.
Em média, no mundo, 45% da população dos países
entrevistados espera voltar à normalidade neste ano, e 41% acham que vai ser
necessário mais tempo.
A pesquisa entrevistou 21 mil pessoas (sendo mil
delas no Brasil) de 16 a 74 anos, entre 19 de fevereiro e 5 de março.
As entrevistas foram feitas online, o que limita o
alcance da pesquisa à população mais urbana e conectada, mas o Ipsos informa
que a representatividade da amostra é de todo o território nacional. (BBC)
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