quinta-feira, 28 de julho de 2022

Quando a vacina contra a varíola dos macacos deve estar disponível no Brasil?

A vacinação contra o vírus monkeypox, o causador da doença conhecida popularmente como varíola dos macacos, já está acontecendo em alguns países do Hemisfério Norte, como Reino Unido e Espanha.

Por ora, não existe nenhuma previsão certeira de quando as primeiras doses devem chegar ao Brasil — o Ministério da Saúde diz que mantém conversas com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), entidade ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS), para adquirir o imunizante.

Existe uma expectativa de que o decreto de emergência de saúde pública de importância internacional, feito pela OMS em 23 de julho, possa agilizar as negociações ou os processos regulatórios e garantir a proteção a alguns grupos específicos.

Entenda a seguir que vacinas são utilizadas, quem são os primeiros a tomar as doses e como autoridades nacionais e internacionais estão trabalhando para ampliar a oferta do imunizante contra o monkeypox.

Há cerca de uma década, a farmacêutica dinamarquesa Bavarian Nordic desenvolveu um imunizante a partir do vírus vaccinia, que pertence à mesma família do smallpox (o causador da varíola humana) e do monkeypox.

Nos Estados Unidos, ela é conhecida como Jynneos. Já na Europa, o nome deste produto é Imvanex.

A virologista Clarissa Damaso, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), explica que os patógenos deste grupo (os orthopoxvirus) costumam conferir uma espécie de "proteção cruzada" — se você se infecta com um deles, o sistema imune gera uma resposta capaz de bloquear a invasão dos demais.

"Algumas cepas do vaccinia são pouco virulentas, o que as torna um alvo frequente de estudos para novas vacinas", diz a especialista.

O imunizante da Bavarian Nordic, que começou a ser utilizado há pouco para conter o monkeypox em algumas partes do mundo, se vale justamente dessa estratégia: ela traz o vírus vaccinia atenuado (mais "fraquinho"), que vai promover justamente essa imunidade cruzada.

"Trata-se de um vírus tão atenuado que ele nem consegue se replicar nas células humanas. Mesmo assim, ele gera uma resposta imune que protege contra o monkeypox", explica Damaso.

A Jynneos/Imvanex é aplicada num esquema de duas doses, com um intervalo de quatro semanas entre a primeira e a segunda.

Algumas autoridades locais estão optando por dar apenas uma dose por pessoa, dada a escassez desse imunizante no momento atual.

A própria Bavarian Nordic está ampliando sua capacidade produtiva e, segundo uma reportagem da agência de notícias financeiras Bloomberg no Reino Unido, está considerando iniciar uma operação emergencial, mantendo a fabricação por 24 horas ao dia, para atender o aumento da demanda por doses.

Além desta vacina, os Estados Unidos possuem uma segunda opção disponível, conhecida como ACAM2000. Ela, porém, não pode ser utilizada em alguns grupos com problemas no sistema imunológico.

Além desses dois recursos, há estudos demonstrando que pessoas vacinadas contra a varíola humana, causada pelo vírus smallpox, também estão mais protegidas do monkeypox.

Como o smallpox foi erradicado e não circula mais pelo mundo, a produção desses imunizantes em específico foi completamente paralisada e a campanha de vacinação não acontece desde o início dos anos 1980.

Mesmo assim, pessoas com mais de 40 anos que tomaram as doses contra a varíola humana durante a infância parecem manter um bom nível de proteção agora.

Que países já iniciaram a campanha e quais são os públicos-alvo?

Por ora, a vacinação contra o monkeypox começou apenas em partes da Europa e da América do Norte.

A União Europeia, por exemplo, fez um acordo com a Bavarian Nordic que prevê a entrega de 110 mil doses.

A distribuição delas ocorrerá de forma escalonada, de acordo com o número de casos registrados nos Estados-membros.

Os Estados Unidos já possuem um estoque de 800 mil unidades da Jynneos/Imvanex, de acordo com o jornal americano The New York Times.

Alguns locais, como Washington, Chicago e Nova York, iniciaram a campanha de vacinação por lá.

Homens fazem fila na frente de centro de vacinação conra o monkeypox nos Estados Unidos

O Reino Unido, que também já oferece o imunizante, definiu três grupos como prioritários para receber as doses neste momento:

- Profissionais de saúde que estão lidando com pacientes diagnosticados com monkeypox. Nesse caso, são oferecidas duas doses.

- Gays, bissexuais e outros homens que fazem sexo com homens com alto risco de exposição ao vírus. O indivíduo deve conversar com o médico, que vai indicar a vacinação de acordo com alguns critérios. Nesse grupo, é aplicada apenas uma dose, com a possibilidade de dar uma segunda no futuro.

- Pessoas que tiveram contato próximo com um paciente infectado com o monkeypox. Nessa situação, as clínicas também estão dando apenas uma dose, que deve ser aplicada o quanto antes (idealmente, em até quatro dias após o contato).

A médica Isabella Ballalai, da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), explica que dar prioridade a alguns grupos faz sentido.

"Vacinação é estratégia. Precisamos pensar primeiro nos grupos de maior risco, como aqueles em que o vírus circula com mais intensidade, os indivíduos estão mais expostos ao patógeno ou podem ter efeitos mais graves da doença", explica.

No caso dos imunizantes contra o monkeypox, a boa notícia é que eles bloqueiam a transmissão do vírus e impedem que a pessoa se infecte.

"E nós sabemos que a resposta imune gerada é muito duradoura", complementa Damaso.

E o Brasil?

Por ora, não existe nenhuma previsão de quando as vacinas contra o monkeypox ficarão disponíveis no país.

Procurado pela BBC News Brasil, o Ministério da Saúde respondeu que "tem articulado com a Organização Pan-Americana de Saúde as tratativas para aquisição da vacina, de forma que o Programa Nacional de Imunizações possa definir a estratégia de vacinação".

Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, o médico David Uip, secretário de Ciência, Pesquisa e Desenvolvimento do Estado de São Paulo, estimou que o imunizante deve demorar até nove meses para chegar aos brasileiros.

O especialista também acredita que o decreto de emergência em saúde pública feito pela OMS permitirá o aparecimento de "soluções, inclusive a readequação e a distribuição de vacinas, recursos e a compatibilidade de programas públicos entre os países".

O Instituto Butantan, também na capital paulista, criou um comitê para estudar a possibilidade de produzir vacinas contra o monkeypox em território nacional.

Do ponto de vista técnico, criar imunizantes contra o monkeypox não é algo tão complexo — a tecnologia que permite manipular vírus vivos atenuados é dominada por muitos laboratórios e farmacêuticas.

"Mesmo assim, o processo não é tão simples assim. É preciso ter fábrica e cumprir uma série de exigências regulatórias para garantir as condições de fabricar as doses", pontua Ballalai.

"Precisamos ter em mente que, se vier a vacina, ela não será para todo mundo.

Precisamos proteger os grupos de maior risco primeiro", complementa a médica.

Enquanto a vacina não chega, a recomendação dos especialistas é ficar atento aos principais sintomas da doença, como o surgimento de feridas, manchas, irritações, pústulas ou espinhas na pele, especialmente na região dos genitais, do ânus, da face ou dos braços.

Caso esses sinais apareçam, vale procurar um médico para fazer o diagnóstico. Se os exames confirmarem a presença do monkeypox, a principal orientação é ficar em isolamento, com o mínimo de contato com outras pessoas, até que as feridas sumam completamente. Isso diminui a circulação do vírus e evita a criação de novas cadeias de transmissão na comunidade.

De acordo com a plataforma o portal Our World In Data, da Universidade de Oxford (Inglaterra), até o momento o mundo registra 18,8 mil casos de monkeypox em 78 países. Desses, 813 foram diagnosticados no Brasil.

(BBC)

 

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