Nesta quinta-feira (18/4), o Ministério da Saúde recomendou que os municípios com baixa taxa de imunização ampliem essa faixa etária para pessoas de 6 a 16 anos. A intenção é evitar que as doses com vencimento para 30 de abril sejam perdidas.
Caso a baixa adesão
persista, os municípios ainda poderão ampliar o público-alvo para pessoas de 4
a 59 anos. As pessoas que forem atendidas por esse plano emergencial terão a
segunda dose garantida.
Já as cidades que
não tiverem mais vacinas com vencimento para o dia 30 devem manter a aplicação
para pessoas entre 10 e 14 anos.
Secretarias de
Saúde de cinco Estados, além do Distrito Federal, já anunciaram que vão aderir
à ampliação da faixa etária para a aplicação da vacina: São Paulo, Bahia,
Goiás, Amazonas e Rio Grande do Norte. No entanto, a decisão será avaliada em
cada município.
No Estado de São
Paulo, por exemplo, a capital optou por não ampliar a faixa etária, pois
informou ter apenas 720 doses com vencimento até dia 30 de abril e todas elas
deverão ser aplicadas antes da data.
No entanto,
municípios paulistas como Poá, Guararema, Mogi das Cruzes, Ferraz de Vasconcelos,
Itaquaquecetuba e Santa Isabel têm doses a vencer até o fim do mês e poderão
ampliar a vacinação.
O imunizante é
considerado seguro e eficaz para pessoas de quatro a 60 anos, mas quem tem
idade fora do grupo prioritário escolhido pelo Ministerio da Saúde neste
momento só consegue se vacinar em clínicas privadas.
A procura tem sido
tão alta que clínicas particulares em diferentes estão suspendendo a aplicação
por falta de doses — e a farmacêutica Takeda deve priorizar o SUS neste
momento.
O Brasil se tornou
o primeiro país do mundo a oferecer o imunizante no sistema público de saúde —
em países como Indonésia, Tailândia e Argentina, além daqueles na União Europeia, a
vacina está disponível em clínicas privadas.
A QDenga pode ser
tomada mesmo se a pessoa nunca teve dengue, o que é uma mudança importante em
relação à última vacina aprovada pela Anvisa no Brasil, a Dengvaxia, que tinha
como pré-requisito uma infecção prévia.
Aumento de casos de dengue
O Brasil vive um
aumento expressivo nos casos de dengue.
Do início do ano até 18 de abril, há mais de
3,5 milhões de possíveis infecções sob análise das autoridades e ao menos 1.544
mortes causadas por complicações da doença, de acordo com o Ministério da
Saúde.
O avanço da doença
também foi notado no ultimo ano.
Em dezembro, o
órgão divulgou um boletim mostrando um aumento de 15,8% nos casos de dengue no Brasil
em 2023, em comparação ao ano anterior.
As ocorrências saltaram de 1,3 milhão em 2022 para 1,6 milhão.
No mesmo ano, o Brasil registrou o maior número de mortes por dengue em um único ano, conforme aponta o painel de monitoramento das arboviroses do Ministério da Saúde.
"As alterações climáticas em curso impactam tanto as temperaturas quanto a quantidade de chuvas, e no Brasil, ambos os fatores aumentaram. Isso favorece a proliferação do mosquito Aedes aegypti e eleva a probabilidade de transmissão da dengue. Precisamos estar muito atentos à situação epidemiológica em 2024, há uma grande risco de aumento nos casos", diz Cláudia Codeço, pesquisadora da Fiocruz e coordenadora do InfoDengue.
Confira abaixo
respostas a perguntas sobre como vai funcionar a vacinação contra a dengue no
Brasil.
Qual é a proteção oferecida pela vacina
A vacina contém
vírus vivos atenuados da dengue, que foram enfraquecidos de forma controlada.
Essa técnica
permite desencadear uma resposta imunológica eficaz sem causar a doença
completa, possibilitando uma reação mais rápida do corpo em casos de exposição
real à doença.
A vacina deve ser
administrada em um esquema de duas doses, com intervalo de 3 meses.
A dengue possui
quatro sorotipos, e quando alguém é infectado por um deles, adquire imunidade
contra aquele tipo específico, mas ainda fica suscetível aos demais.
Embora a empresa
responsável pela vacina tenha divulgado uma eficácia global de 80%, esse
percentual engloba os resultados de todos os sorotipos.
Ao analisá-los
individualmente, a eficácia do imunizante variou para cada sorotipo.
Passados 18 meses
após a segunda dose, para o tipo 1, a taxa foi de 69,8%. Para a dengue 2, o
melhor resultado, de 95,1%, e para o subtipo 3, o menos satisfatório, de 48,9%.
Em relação ao
subtipo 4, a Takeda afirmou à BBC News Brasil que a quantidade de casos
testados não foi suficientemente alta para chegar a uma conclusão.
Felipe Naveca,
pesquisador em saúde pública da Fiocruz, destaca que a eficácia reduzida contra
o subtipo 3 e a ausência de dados para o subtipo 4 são desafios do imunizante
administrado em um número elevado de pessoas.
Como pano de fundo,
está a ressurgência de ambas as variantes da dengue no Brasil, após um período
prolongado sem novos casos no país — 15 anos sem casos de dengue 3 e 5 anos sem
casos de dengue 4.
"Temos uma
parcela significativa da população com até 15 anos que não teve exposição
principalmente à dengue 3, que apareceu pela última vez em 2008. Isso os torna
suscetíveis à infecção por esse vírus", diz Naveca, que coordena
laboratórios de arboviroses e viroses emergentes da Fiocruz.
Os sorotipos 3 e 4
não causam, necessariamente, quadros mais graves.
Na dengue, a
gravidade da doença está associada à infecção secundária — ou seja, uma pessoa
que teve dengue pela primeira vez, seja por qualquer sorotipo, corre um risco
maior de desenvolver uma forma mais severa ao ser infectada novamente.
Assim, para quem
for se vacinar, é importante considerar a proteção menor quando a infecção
secundária for por dengue 3 ou 4.
Apesar disso, o
pesquisador reforça que a boa eficácia da nova vacina contra a dengue 1 e 2, e
a possibilidade de ela reduzir os riscos de uma segunda infecção pela doença
são pontos positivos, especialmente para populações que vivem em áreas
endêmicas.
Quem pode se vacinar?
Embora os grupos
mais vulneráveis aos casos graves e mortes por dengue sejam crianças pequenas e
idosos, segundo a Anvisa, a Qdenga é indicada para quem tem mais de quatro anos
e para adultos com até 60 anos — não há estudos para avaliar a eficácia e a
segurança da vacina fora dessa faixa etária.
Pode receber o
imunizante quem já teve dengue e também quem nunca foi infectado.
No entanto,
gestantes, lactantes e pessoas com alergia a algum dos componentes presentes no
imunizante, quem tem o sistema imunológico comprometido ou alguma condição
imunossupressora não podem ser vacinadas com a Qdenga.
Processo de aprovação
O registro do
imunizante foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
em março de 2023.
Desde então, sua
aplicação está autorizada no país, e as doses passaram a ser comercializadas em
clínicas particulares, com o valor variando entre R$ 300 e R$ 800.
Em outubro, a OMS
(Organização Mundial da Saúde) passou a recomendar a vacina contra a dengue
desenvolvida pela Takeda.
Em nota, o órgão
destacou que a doença "representa um fardo significativo para a saúde
pública em países endêmicos" e alertou que esse impacto "deverá
aumentar ainda mais, tanto em termos de incidência como de expansão geográfica,
devido às alterações climáticas e à urbanização".
Além de receber o
registro sanitário, os imunizantes precisam ser avaliados pela Conitec
(Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde),
um órgão que assessora o Ministério da Saúde na incorporação, exclusão ou
alteração de medicamentos, procedimentos e equipamentos oferecidos no SUS.
A análise da Conitec
busca avaliar a eficácia (como a tecnologia em saúde age no contexto de um
estudo clínico), a efetividade (como ele age no contexto real) e a segurança do
produto em análise.
Para a Qdenga, a
consulta pública começou no dia 6 de dezembro de 2023 e a vacina teve aprovação
para ser incluída no PNI (Programa Nacional de Imunizações) em 21 de dezembro.
O virologista
Flavio Fonseca afirma que a aprovação foi rápida, possivelmente pela
experiência que os órgãos regulatórios adquiriram durante a pandemia da
covid-19.
"Eles estão
realmente mais ágeis no recebimento e avaliação de dados preliminares,
pré-clínicos e clínicos, dada a experiência que vivemos", afirma ele, que
é professor no CTVacinas (centro de pesquisas em biotecnologia) e no
departamento de Microbiologia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
Como será vacinação
Por enquanto, só
serão vacinadas crianças de 10 a 14 anos, em 521 cidades do país. As exceções
são as cidades que ampliaram a imunização por conta das vacinas em vencimento
até o fim de abril.
As cidades
escolhidas pelo Ministério da Saúde englobam centros urbanos grandes com alta
taxa de transmissão da dengue, em 16 Estados e no Distrito Federal.
Você pode checar se
sua cidade e região vai oferecer a vacina neste primeiro momento no site do Ministério da Saúde.
Diferença entre QDenga e Dengvaxia
A Dengvaxia, uma
vacina contra a dengue desenvolvida pela farmacêutica Sanofi, foi aprovada em
2015 por várias agências regulatórias globais, incluindo a Anvisa.
Os dados eram
suficientemente bons para a aprovação.
Mas, com o passar
do tempo, e a aplicação da vacina em larga escala, com grupos muito maiores do
que o que foi usado no estudo, descobriu-se que esse imunizante poderia
aumentar o risco de dengue grave em indivíduos sem histórico prévio de
exposição ao patógeno antes da vacinação.
Consequentemente,
as doses passaram a ser recomendadas apenas para aqueles com histórico da
doença, visando proporcionar proteção contra a infecção, que causa quadros mais
graves.
Antes da
administração das doses, era necessário realizar um exame de sangue para
verificar a presença de anticorpos contra qualquer sorotipo da dengue.
Na prática, as
restrições acabaram eliminando a vacina como uma candidata para implementação
na rede pública de saúde.
"Essa vacina,
aprovada anteriormente, apresenta diversas limitações. Além do pré-requisito de
teste, exige a aplicação de três doses, com intervalos de seis meses, para
conferir proteção. Diante dessas considerações, nunca houve uma perspectiva
realista de sua aplicação em larga escala na saúde pública", afirmou o
médico Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações
(SBIm), em entrevista à BBC News Brasil em março de 2023.
Na avaliação do
virologista Flavio Fonseca, a vacina da Sanofi tinha uma série de limitações
que a Qdenga não apresentou.
"É claro que a
Quedenga é nova e pode ser que problemas surjam no futuro, como todo novo
medicamento. Apenas quando uma vacina é licenciada é que você tem um uso
internacional grande o suficiente para que você comece a detectar problemas que
normalmente nos testes não surgem."
Ainda assim, o
especialista considera a aprovação um passo importante.
"Mesmo
considerando possibilidades de efeitos adversos, que todos os medicamentos,
incluindo os simples como aspirina e dipirona, têm, em termos individuais, eles
são muito menos frequentes ou graves do que a infecção pelo vírus da dengue
pode causar."
Vacina nacional?
O governo
brasileiro também aposta na produção nacional de imunizantes para o combate à
dengue.
Atualmente, o
Instituto Butantan tem uma vacina em fase de testes. O pedido para aprovação do
medicamento na Anvisa deve ser feito no ano que vem.
Em nota, o instituto
diz que a vacina, que é tetravalente, está na fase 3 dos ensaios clínicos.
"A previsão
para o término do estudo é 2024, quando o último participante completar 5 anos
de acompanhamento. Em dezembro de 2022, o instituto divulgou os resultados
preliminares do estudo, que mostram 79,6% de eficácia geral para prevenir casos
de dengue sintomática."
(Fonte: BBC/Colaborou Simone Machado)
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