O que é vampirismo? Pela definição do dicionário, é
"a conduta de alguém que age como um vampiro".
No imaginário popular, pode significar ressuscitar
dos mortos para vagar à noite com uma capa preta, usando os caninos longos e
afiados para morder o pescoço de vítimas e sugar seu sangue.
Atualmente, os vampiros são encontrados apenas em
livros, filmes e séries de televisão. Mas, quando o termo apareceu pela
primeira vez, o cenário era bem diferente.
A origem do termo - Os vampiros sugiram no início do século 18 na
fronteira da Áustria com a Hungria.
Embora desde os tempos mais remotos, divindades,
bruxas, fantasmas e outras variedades de demônios que sugavam o sangue humano
tenham feito parte do imaginário de quase todas as culturas, várias fontes
afirmam que a palavra "vampiro" foi escrita pela primeira vez em
1725, no relatório de um médico do exército do Sacro Império Romano-Germânico.
Após a vitória contra o Império Otomano em
Petrovaradin (1716) e o Cerco de Belgrado (1717), que levaram à assinatura do
Tratado de Passarowitz, a Áustria anexou grandes extensões da Sérvia ao seu
território.
O príncipe Eugênio de Saboia (1663-1736) é considerado
o general mais importante da sua era
E, ao chegar às terras dos povos eslavos, os austríacos
se depararam com relatos sobre essas estranhas criaturas, das quais nunca
tinham ouvido falar antes.
O relatório - Em um período de oito dias, nove pessoas morreram
subitamente na cidade de Kisilova, após terem recebido supostamente a visita
noturna de um homem chamado Petar Blagojević, que teria mordido as vítimas e
chupado seu sangue.
O problema é que Blagojević estava morto e havia
sido enterrado 10 semanas antes.
Os moradores pediram permissão então para exumar
seu corpo e, no papel de nova autoridade local, o superintendente austríaco
Frombold acompanhou o procedimento.
No relatório que enviou para Viena – o mesmo em que
escreveu a palavra "vampiro" –, ele descreveu o que viu:
"O rosto, as mãos e os pés, e todo o corpo
estavam tão bem constituídos, que não poderiam ter estado mais completos em sua
vida. Com espanto, vi um pouco de sangue fresco em sua boca, que – de
acordo com os relatos – havia sido sugado das pessoas mortas por
ele... assim, ao ser perfurado, um monte de sangue, completamente fresco,
também jorrou de seus ouvidos e boca, e aconteceram outras manifestações que
não descrevo por respeito."
Como era costume na região, eles cravaram uma
estaca no coração do cadáver e cremaram o corpo.
Uma 'epidemia' - Um jornal em Viena publicou a notícia, e o fenômeno
se espalhou pela região.
Em poucos anos, o vampirismo parecia ter se tornado
uma epidemia na Europa Oriental.
O imperador enviou equipes de cirurgiões militares
para realizar autópsias e investigar o que estava acontecendo. Esses
especialistas constataram, por sua vez, que os casos eram notavelmente
consistentes.
Pesquisadores da área médica publicaram dezenas de artigos
e livros sobre o assunto.
O vampirismo se tornou então uma condição
reconhecida, testemunhada por um grande número de pessoas, que apresentava
sinais e sintomas característicos, como cadáveres com sangue fresco correndo em
suas veias e vísceras; sangue ao redor da boca, "por ter se
alimentado"; pele rosada; corpos volumosos, etc.
Tema quente - Ironicamente, o vampiro ocidental surgiu em plena
Era da Razão.
O século 18, conhecido como "Século das
Luzes", foi palco do Iluminismo, movimento que pregava o uso da luz da
razão contra as trevas da ignorância.
Neste contexto, os vampiros eram um tema que
despertava calorosos debates na Europa.
Teólogos argumentavam que os vampiros eram seres
físicos que demonstravam a existência de uma vida após a morte.
Filósofos, por outro lado, se preocupavam com o
fato de que as evidências disseminadas sustentando a existência de vampiros
lançassem dúvidas sobre o valor do testemunho e de testemunhas oculares.
Até mesmo o filósofo francês Voltaire se manifestou
sobre o assunto, quando em 1764, questionou:
"O quê?! Em pleno século 18 existem vampiros?
"São cadáveres que deixam seus túmulos à noite
para chupar o sangue dos vivos, seja em suas gargantas
ou seus estômagos, e depois retornam aos seus cemitérios."
"Enquanto as vítimas empalidecem e são
consumidas, os cadáveres que sugam o sangue ganham peso, ficam rosados e
desfrutam de um excelente apetite."
"É na Polônia, na Hungria, na Silésia, na
Morávia, na Áustria e na Lorena que os mortos se divertem tanto."
"Nunca ouvimos uma palavra sobre vampiros em
Londres, nem sequer em Paris."
"Admito que nas duas cidades há corretores da
bolsa e homens de negócios que sugam o sangue das pessoas em plena luz do dia;
mas, embora corrompidas, não estão mortas. Esses verdadeiros vampiros não vivem
em cemitérios, mas em palácios."
'O quê?! Em pleno século 18 existem vampiros?', questionou Voltaire
O que estava acontecendo? - Mas como explicar a epidemia de uma doença mortal
que não existe?
Alguns pesquisadores atribuem o fenômeno a grandes
traumas e decepções, outros à alimentação, ao uso acidental de drogas que
causam alucinações e a doenças altamente contagiosas.
Outras teorias fazem referência à presença de
substâncias químicas incomuns na terra que afetavam a decomposição dos corpos.
De fato, a origem de algumas características
descritas pelos médicos legistas da época poderia ser precisamente a
decomposição.
É importante lembrar que, no passado, não era comum
observar o processo de putrefação dos corpos, uma vez que eram fonte de
contaminação.
Hoje sabemos que o rigor mortis (rigidez
cadavérica) passa, por isso a flexibilidade de muitos "vampiros"
surpreendia a quem os desenterrava.
Em alguns cadáveres, o sangue coagula, mas se
liquefaz novamente. Os gases no abdômen aumentam a pressão à medida que o
estado de putrefação avança, forçando os pulmões para cima e, algumas vezes,
expulsando o tecido em decomposição da boca e das narinas.
O inchaço provocado pelos gases bacterianos após a
morte explica por que os corpos parecem roliços e saudáveis, e também os
"gemidos sonoros" que alguns mortos soltavam quando as estacas eram
encravadas em seu coração ou estômago.
Bram Stoker nos brindou com 'Drácula', um vampiro mais sofisticado
O vampiro aristocrata - Um século depois, um médico inglês chamado John
Polidori escreveu o primeiro romance sobre vampiros em inglês. Ele transformou
o vampiro em um aristocrata, abrindo caminho para o clássico de Bram
Stoker, Drácula, publicado 78 anos depois.
A imagem da criatura elegante que povoa hoje em dia
o imaginário popular se deve a Polidori, Stoker e a dezenas de contos sobre
vampiros vitorianos.
Mas vale lembrar que o tema foi analisado pela
primeira vez por médicos, políticos e filósofos.
(Fonte: BBC)
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