Barbara Gattuso já tinha mais de 35 anos quando percebeu que estava
perdendo o interesse em fazer sexo com o marido, Gregg. Passou vários anos
usando desculpas e evitando-o, em vez de se abrir com ele. "Até que
comecei a me dar conta de que devia haver um grande problema comigo: eu amava
meu marido, tinha um casamento incrível e filhos maravilhosos. O que estava
acontecendo?", lembra ela, hoje com 66 anos.
O problema era o
desejo. Gattuso não sentia nenhuma vontade de se relacionar sexualmente – não
só com seu marido, mas com ninguém mais. Muitos sexólogos
acreditam que essas oscilações no desejo sexual são perfeitamente normais –
principalmente entre mulheres a partir de uma certa idade. Já outros
especialistas defendem que a falta de desejo é um distúrbio que resulta do
desequilíbrio de algumas substâncias químicas do cérebro e poderia ser tratado
com medicamentos específicos.
Esta semana, a
Food and Drug Administration (FDA), órgão dos Estados Unidos que regulamenta a
produção e a comercialização de remédios e alimentos no país, reúne um painel
de consultores para decidir sobre a aprovação do Flibanserin – medicamento que
já foi apelidado de "Viagra feminino".
A questão, no
entanto, é polêmica – com argumentos fortes dos dois lados. Apesar de não ser
uma exclusividade das mulheres – e o Viagra e seus similares estão aí para
provar que os homens também enfrentam distúrbios sexuais ao envelhecerem -, a
natureza do problema é bem diferente em cada caso.
"Nós,
médicos, costumamos dizer que existem três formas de disfunção sexual entre os
homens: ereção, ereção e ereção", afirma Stephen Stahl, psquiatra da
Universidade da Califórnia em San Diego. "Entre as mulheres, os problemas
também são três: desejo, desejo e desejo."
A causa precisa desse
declínio – e até as origens do desejo – é um mistério para os cientistas,
apesar de eles saberem que é algo relacionado ao circuito de compensação do
cérebro. Uma das teorias é
que o distúrbio, conhecido como frigidez ou anafrodisia, resulta de uma incapacidade
de "desligar" as partes frontais do cérebro responsáveis pelas
tarefas cotidianas. Como resultado, esse circuito, que lida com motivação e
prazer, é inibido.
Desde que o
Viagra comprovou ser eficiente do tratamento da disfunção erétil (sem falar nos
lucros gerados para a empresa que o desenvolveu), começou uma corrida para
encontrar um medicamento semelhante para as mulheres – mas um que tenha uma
ação no cérebro e não nos órgãos genitais.
O Flibanserin foi
um dos primeiros a largar nessa corrida. Inicialmente desenvolvido para ser um
antidepressivo, provou-se ineficaz na alteração do humor. Mas nos estudos
clínicos com a droga, as mulheres manifestavam um efeito colateral inesperado:
um maior interesse em sexo.
O remédio parece
agir regulando o equilíbrio dos neurotransmissores nos circuitos cerebrais,
principalmente a dopamina, a noradrenalina e a serotonina. "Acreditamos
que a droga normaliza ou compensa algo que não esteja ajudando a afinar esses
circuitos", afirma Stahl. "Ou ainda, ela pode permitir que as
mulheres se libertem da ação desses circuitos frontais que estão inibindo o
desejo sexual."
Detonador do desejo - Apesar de o Flibanserin ter sido descartado
como antidepressivo, ele foi logo reformulado para funcionar como um detonador
do desejo sexual para mulheres com frigidez. No entanto, os
primeiros testes não conseguiram provar um efeito significativo, mesmo com
algumas voluntárias relatando terem experimentado "eventos sexuais
satisfatórios". Por isso, o FDA reprovou o medicamento em 2010.
Outros estudos
realizados desde então, entretanto, sugeriram que a droga aumenta o desejo
sexual, mas com um efeito modesto. "O problema
é: como você mede a melhora?", pergunta Susan Scanlan, diretora da
campanha Even The Score, que defende uma solução medicinal para a frigidez.
Segundo ela, a
base de referência é baixa. "A mulher americana média faz sexo três vezes
por mês. Se uma paciente não tiver essa frequência, será que isso significa que
o medicamento não funciona?", questiona. De fato, as voluntárias que
tomaram Flibanserin relataram ter tido uma média de 2,5 eventos sexuais em um
período de 28 dias – mais do que as mulheres frígidas que não estavam usando o
remédio, cuja média foi de 1,5 evento.
Muitas das
voluntárias também acreditam ter sentido uma grande melhora. Entre elas está
Gattuso, que participou de um teste com o Flibanserin em 2011. "Depois de
duas semanas, eu era outra pessoa", conta. "Eu acordava no meio da
noite, acariciava meu marido. A intimidade, o desejo, a troca... Tudo estava
100% ali."
Efeitos colaterais - Uma das preocupações tem sido os efeitos
colaterais do medicamento, como sonolência, tontura e náusea. Scanlan argumenta
que esses sintomas são bem menos agressivos do que aqueles que decorrem do uso
do Viagra e de outros remédios para a disfunção erétil, como problemas
cardíacos, por exemplo.
Outros grupos
temem que a aprovação do Flibanserin incentive mulheres a buscar uma solução
química para um problema que poderia ser resolvido com aconselhamento
psicológico ou tratando de outros problemas, como estafa e depressão.
"No desejo,
as relações são importantes, o contexto é importante e fatores situacionais
como o humor e a privacidade são importantes", afirma Cynthia Graham,
professora de saúde psicológica na Universidade de Southampton, na
Grã-Bretanha.
Ela, no entanto,
concorda que uma solução farmacêutica poderia ajudar em determinadas situações,
"desde que se conheça bem os efeitos colaterais". Há ainda
especialistas que acreditam que a reprovação do Flibanserin atrapalhe outras
tentativas para se buscar alternativas mais eficazes para o problema.
Certamente,
ninguém está sugerindo uma solução rápida para a falta de desejo, sem se levar
em consideração fatores como cansaço, stress, outros medicamentos e questões do
relacionamento. "Uma pílula não vai salvar um casamento que está indo
mal", lembra Stahl. (BBC)
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