Delações da Odebrecht, julgamento
de chapa Dilma-Temer no TSE, pressão das ruas, deterioração da economia e perda
de apoio político podem abreviar gestão do peemedebista - analistas acreditam,
porém, que hoje esse risco é baixo. Apesar
de ter pouco tempo de vida, o governo Michel Temer já passa por sua maior prova
de fogo.
O novo capítulo da crise que
atinge em cheio a gestão do peemedebista foi escrito na sexta-feira, com o
vazamento da delação de Cláudio Melo Filho, ex-vice-presidente de Relações
Institucionais da Odebrecht. Ele acusa Temer e vários de seus ministros de
envolvimento em um esquema de repasse de recursos em troca de favores à
empreiteira - o que os políticos negam.
Analistas sugerem ser prematuro
antecipar o fim do governo Temer. Contudo, segundo prevê a Constituição, se ele
deixasse o cargo antes do dia 31 de dezembro deste ano (por renúncia ou
cassação), haveria novas eleições. Depois disso, caberia ao Congresso eleger o
novo presidente indiretamente. Confira cinco ameaças que pairam
sobre a gestão.
1) Delações da Odebrecht
O vazamento do conteúdo do acordo
de delação premiada de Melo Filho caiu como uma bomba no governo Temer. Nele, o ex-executivo cita 51
políticos de 11 diferentes partidos. Sobre Temer, diz que o atual presidente
pediu pessoalmente R$ 10 milhões a Marcelo Odebrecht, dono da empreiteira, para
as campanhas do PMDB em 2014. O nome do peemedebista é mencionado 48 vezes na
delação.
Temer negou "com
veemência" as acusações. "O presidente Michel Temer
repudia com veemência as falsas acusações do senhor Cláudio Melo Filho. As
doações feitas pela Construtora Odebrecht ao PMDB foram todas por transferência
bancária e declaradas ao TSE. Não houve caixa 2, nem entrega em dinheiro a
pedido do presidente", diz o comunicado divulgado pelo Palácio do Planalto
também na sexta-feira.
Em carta enviada nesta
segunda-feira ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, Temer pediu
rapidez nas investigações e classificou como "ilegítima" a divulgação
de trechos vazados de acordos de delação.
"O fracionado ou porventura
lento desenrolar de referidos procedimentos pré-processuais, a supostamente
envolver múltiplos agentes políticos, funciona como elemento perturbador de uma
série de áreas de interesse da União", disse.
Melo Filho também citou dois
ministros da alta cúpula do governo e muito próximos ao presidente: Eliseu
Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco, secretário de Parcerias de
Investimentos. Ex-ministros, como o senador Romero Jucá (ex-Planejamento) e
Geddel Vieira Lima (ex-Secretaria de Governo) também são mencionados no material.
Nomes da alta cúpula do PMDB,
partido de Temer, também foram citados, como o presidente do Senado, Renan
Calheiros, e o líder do partido na casa, o senador Eunício Oliveira. Todos
negam irregularidades.
A delação de Melo Filho é apenas
uma de 77 envolvendo executivos da Odebrecht. O acordo de leniência foi
assinado pela empreiteira com os procuradores da Lava Jato no último dia 1º de
dezembro.
Mas para que as delações sejam
homologadas por Teori Zavascki, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e
relator dos processos relacionados à operação na corte, os executivos precisam
apresentar provas e prestar depoimentos para confirmar o que apresentaram de
forma resumida na negociação.
Nos bastidores, aliados do
governo Temer já discutem pedir a anulação da delação de Melo Filho, a exemplo
do que ocorreu com a do ex-presidente da construtora OAS, Leo Pinheiro, que
também vazou na imprensa.
Ao custo jurídico - se comprovada
a irregularidade, o presidente poderia perder o cargo em última análise -
soma-se, principalmente, o custo político, já que o governo pode não aguentar a
pressão das ruas ou a erosão de sua base de apoio no Congresso.
2) Julgamento da chapa
Dilma-Temer no TSE
O TSE deve julgar no começo do
ano que vem a ação contra a chapa formada por Dilma Rousseff e Michel Temer em
2014. A ação é de autoria do PSDB. O
partido defende que Dilma e Temer cometeram abuso de poder político e econômico
e tiveram a campanha à reeleição abastecida com recursos desviados da
Petrobras.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o ministro Herman Benjamin, do
TSE (Tribunal Superior Eleitoral), relator do processo, afirmou que a
apresentação do relatório-voto da ação deve acontecer em fevereiro.
A decisão sobre quando será
apresentado o relatório-voto será anunciada nesta terça-feira.
Se julgar a ação procedente, o
ministro também terá de decidir se cassa Dilma ou se cassa a chapa Dilma-Temer. Mas o voto de Benjamin terá ainda
de ser apreciado por seis outros ministros que compõem o plenário da corte,
presidida por Gilmar Mendes, ministro do STF.
3) Pressão das ruas
Outro risco que tem o potencial
de abreviar o governo Temer pode vir das ruas.Mas isso dependerá de uma adesão
mais ampla aos protestos contra o governo. Uma pesquisa do Datafolha
divulgada nesta segunda-feira revelou que a rejeição ao presidente disparou.
Segundo o levantamento, 51% dos
brasileiros consideram o governo de Temer "ruim" ou
"péssima", frente a 31% em julho. Já os que veem a gestão como
"regular" somam 34%, uma queda em relação aos 42% da pesquisa
anterior, quando o peemedebista ainda era presidente interino.
O índice dos que avaliam o
governo como "ótimo" ou "bom" caiu de 14% para os atuais
10%. Não souberam opinar 5% dos entrevistados. De acordo com o Datafolha, metade
dos brasileiros veem Temer como autoritário e 58%, desonesto. Já 65% julgam o
presidente como falso (65%), muito inteligente (63%) e defensor dos mais ricos
(73%).
Em uma escala que vai de zero a
dez, a nota média dada ao governo é de 3,6. Além disso, 63% da população
afirma querer que Temer renuncie imediatamente para que eleições diretas sejam
realizadas.
A pesquisa foi feita antes dos
novos detalhes da delação da Odebrecht envolvendo o peemedebista. Em setembro, logo após o impeachment
da ex-presidente Dilma Rousseff, milhares foram às ruas contra Temer e pediram
novas eleições. Já no fim do mês passado, as
principais capitais do país registraram protestos contra a PEC do teto dos
gastos, a anistia para o caixa dois eleitoral e o atual governo.
4) Deterioração da economia
A recessão prolongada também vem
testando a paciência dos brasileiros com Temer. Segundo a mesma pesquisa do
Datafolha, a população avalia negativamente as perspectivas da economia.
Nos últimos meses, a situação
econômica do país piorou na opinião de 65% dos brasileiros e se manteve estável
para 25%. Somente 9% disseram que houve melhora. Para 66%, a inflação vai
aumentar; 19% acreditam que ficará como está e 11% preveem queda.
Já 67% esperam por um crescimento
do desemprego, enquanto 16% afirmaram que o índice vai diminuir e 14% que
ficará estável. Em relação ao poder de compra,
59% acreditam que vai cair, 20% que não vai mudar e 15% que aumentará.
O pessimismo é compartilhado pelo
mercado. Segundo um comunicado do banco
Itaú Unibanco, "as reformas fiscais continuam a avançar, mas a incerteza
política cresceu".
"A atividade econômica
decepcionou negativamente, por isso reduzimos nossa expectativa do PIB para
2017. A inflação continua a cair, a taxa de câmbio permanece próxima ao
equilíbrio e esperamos que o Banco Central acelere o ritmo de corte dos juros
em janeiro", informou o banco em nota enviada à imprensa nesta
segunda-feira.
No trimestre encerrado em
setembro, o PIB (Produto Interno Bruto, ou a soma de riquezas produzidas pelo
país) recuou 0,8% em relação aos três meses anteriores, a sétima queda
consecutiva nessa comparação.
Já de acordo com o último boletim
Focus, mediana das estimativas do PIB feita com base nas opiniões das
instituições financeiras e divulgada toda semana pelo BC (Banco Central), a
economia vai crescer apenas 0,7% no ano que vem, ante a 0,8% previsto
anteriormente. Foi a oitava queda consecutiva.
Além disso, o desemprego subiu
para 11,8% no terceiro trimestre (julho a setembro). Trata-se da maior taxa de
toda a série histórica da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios),
do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Atualmente, o Brasil
soma 12 milhões de desocupados.
Com o objetivo de neutralizar o
impacto das delações da Odebrecht, Temer decidiu acelerar o anúncio de um
minipacote econômico, com a previsão de criar 200 mil postos de trabalho nos
próximos quatro anos.
As medidas giram em torno da
facilitação de crédito e devem ser anunciadas ainda nesta semana. Paralelamente, o governo quer
aprovar nesta terça-feira - ou seja, antes do recesso do Congresso, em 16 de
dezembro - a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2017 e a admissibilidade
da Reforma da Previdência pela Constituição de Constituição e Justiça da Casa. Outro foco de Temer é votar ainda
nesta semana a PEC do teto dos gastos em segundo turno no Senado.
5) Perda de apoio político
Ainda que conte com o Congresso a
seu favor - cenário diferente do de Dilma, por exemplo -, Temer precisa evitar
a todo custo a debandada dos partidos aliados, sobretudo do
"centrão".
Formado por representantes de 12
siglas (PP, PR, PSD, PTB, PROS, PSC, SD, PRB, PEN, PTN, PHS e PSL), o
"centrão" consiste em um bloco informal de cerca de 200 deputados
governistas do chamado "baixo clero" e vem sendo o fiel da balança de
governabilidade do peemedebista.
Recentemente, porém, houve
atritos entre o grupo e o Palácio do Planalto. Um deles foi a indicação do
deputado Antonio Imbassahy, do PSDB, líder do partido na Câmara, para ocupar o
cargo de Secretaria do Governo no lugar deixado por Geddel Vieira Lima.
O "centrão" também está
de olho na eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, atualmente
ocupada por Rodrigo Maia (DEM-RJ), em fevereiro do ano que vem. Maia é
candidato à reeleição.
"Aumentamos de 10% para 20%
o risco de Temer cair, mas, apesar desse risco ter aumentado, ele ainda
permanece baixo. A variável-chave para saber se isso deve acontecer vai
depender se haverá protestos significativos nas ruas pedindo sua saída ou se
ele perderá apoio no Congresso. Mas ambas as hipóteses permanecem pouco prováveis",
informou um comunicado divulgado pela consultoria de risco político Eurasia
Group.
"Com a economia não dando
sinais claros de uma recuperação robusta, os congressistas sabem que se Temer
cair (...), a recessão pode se arrastar para 2017. Isso pode se provar
desastroso para quem está tentando se eleger em 2018 em um contexto no qual os
eleitores estão irritados com a classe política e as fontes tradicionais de
financiamento para as campanhas das construtoras secaram."
"Com menos de dois anos para
as eleições de 2018, o principal ativo de Temer no Congresso é de o que a
maioria dos legisladores veem no sucesso de sua gestão a única forma de evitar
um cenário de 'terra arrasada'", finalizou a nota. (BBC)
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