Enquanto a maioria dos colaboradores próximos do
presidente eleito, Jair Bolsonaro, tem pouca experiência
com a política tradicional, o deputado federal Onyx
Lorenzoni (DEM-RS) é a exceção que confirma a regra.
Nomeado
ontem como ministro extraordinário para coordenar o governo de transição do
presidente eleito e anunciado como futuro ministro-chefe da Casa Civil, o
parlamentar de 64 anos acumula uma bagagem de 22 anos de Legislativo, 15 deles
na Câmara dos Deputados.
O
porto-alegrense Onyx foi reeleito neste ano para um quinto mandato com a
segunda maior votação do Estado. Seus 183.518 votos foram superados apenas pelo
deputado eleito Marcel van Hattem, do Novo, com 349.855 votos. Em 2014, tinha
ficado em quinto, com 148.406 votos.
O incremento na performance deve-se sobretudo à
decisão de aderir à candidatura de Bolsonaro, de quem se tornou coordenador de
campanha antes de o DEM definir posição na sucessão presidencial.
Depois de ensaiar uma candidatura do deputado
Rodrigo Maia (RJ), o partido acabou integrando a coligação de Geraldo Alckmin
(PSDB). "Eu tenho uma leitura de que, depois de 30 anos de hegemonia
absoluta da esquerda no Brasil, quer através da centro-esquerda, que é o PSDB,
quer através da esquerda, que o PT representou e que acabou numa quase
tragédia, agora há um movimento de endireitar o Brasil. É um movimento em que a
centro-direita chega ao poder. Não tenho nenhuma dúvida de que esta é uma
eleição da centro-direita brasileira e não consigo enxergar o DEM não estando,
direta ou indiretamente, apoiando Bolsonaro", afirmou durante a campanha.
Em maio de 2017, Onyx foi um dos políticos citados
por um dos diretores da empresa JBS como beneficiário de recursos em caixa 2.
Em entrevista à RBS TV, o deputado assumiu ter recebido o dinheiro em 2014, mas
afirmou que o valor teria sido inferior aos R$ 200 mil citados e que não tinha
como declarar os recursos à Justiça Eleitoral por conta do prazo. Até o
momento, não houve abertura de inquérito para investigar o caso.
Em
junho deste ano, a pedido da PGR (Procuradoria Geral da República), o STF
(Supremo Tribunal Federal) arquivou um inquérito que investigava o parlamentar
de acusação de caixa 2 na campanha de 2006 feita em delação da Odebrecht.
Atuação em Brasília - Diferentemente do presidente
eleito, que chegou à Câmara em 1990 após dois anos como vereador no Rio, Onyx
tinha experiência considerável ao chegar a Brasília, em 2003.
Ele despontou no cenário nacional em 2005, aos 49
anos, durante as sessões da CPI Mista dos Correios, criada para investigar um
escândalo de propina em uma diretoria da Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos (EBCT).
Na
primeira fase dos trabalhos, o então presidente nacional do PTB, deputado
federal Roberto Jefferson (RJ), denunciou a existência de pagamentos
intermediados pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a
parlamentares em troca de apoio, o chamado mensalão.
Um
dos dois únicos representantes do DEM (então denominado PFL) entre os 16
titulares da CPI, Onyx tornou-se desde o início um dos parlamentares mais
ativos da comissão. Costumava
ser um dos primeiros a chegar à sala de reuniões, no Senado, munido de
chimarrão e garrafa térmica de água quente. Comedido e afável no trato pessoal,
transformava-se durante os interrogatórios, ao microfone: a voz elevava-se e as
mãos moviam-se em gesticulação frenética, numa atitude de palanque.
Numa
época em que Lula ainda gozava de amplo apoio popular, Onyx passou a afirmar
diante das câmeras, aos gritos, que o PT, partido do então presidente, havia
formado uma "quadrilha" a partir do governo federal para assaltar os
cofres públicos.
Colegas
da oposição viam exagero na atitude, e governistas reagiam com fúria.
"Para o senhor (Lorenzoni) me acusar de formação de quadrilha, o senhor apresente
provas", vociferou o ministro-chefe do Núcleo de Estudos Estratégicos do
governo, Luiz Gushiken, durante uma das audiências.
Anos
depois do fim da CPI, Onyx manteria um curioso hábito testemunhado por quem o
encontrava no início do dia. Ao falar ao telefone, costumava interromper a
conversa e dizer: "E aí, galera? Bom dia! Vamos trabalhar?". A quem
se surpreendia, explicava que a saudação era dirigida a supostos responsáveis
por grampos em seu aparelho. "Desde a CPI dos Correios, sou grampeado 24 horas
por dia e seguido", afirmava.
A
CPI dos Correios culminaria, sete anos depois, com a condenação, pelo Supremo
Tribunal Federal (STF), de 25 dos 37 réus do escândalo. Ao
concluir os trabalhos, porém, não chegou a inviabilizar o governo Lula, que
recompôs sua base de apoio no Congresso, com a inclusão do PMDB, então detentor
da maior bancada na Câmara. Em 2006, Lula foi reeleito com 60,83% dos votos,
marca ainda hoje não superada em pleitos presidenciais.
Para
Onyx, os dividendos políticos foram consideráveis. Depois da divulgação do
relatório final da CPI, ele publicou um livro-denúncia, A máfia da estrela, no
qual sistematizava os ataques ao PT. Na Câmara, envolveu-se em uma disputa pela
liderança da bancada com o ex-colega de CPI, Antonio Carlos Magalhães Neto,
hoje prefeito de Salvador.
Como
líder, teve Bolsonaro entre os companheiros de bancada (o presidente eleito
permaneceria por dois anos no DEM). Os dois haviam tido contato em 2003,
durante a campanha contra o desarmamento.
A relação com Paulo Afonso Feijó - O
lance mais audacioso de Onyx nos anos 2000 ocorreu em seu Estado natal, onde o
PFL, aliado ao PSDB, emplacou o vice-governador na chapa da tucana Yeda
Crusius, que acabou eleita.
Pela
primeira vez em mais de 20 anos de existência, o partido que surgira em 1984 de
uma dissidência do PDS voltava ao topo do Executivo no Rio Grande do Sul. O
eleito era um afilhado político de Onyx.
Ex-presidente
da Federação das Associações Comerciais do Rio Grande do Sul (Federasul), Paulo
Afonso Feijó era mais do que um empresário seduzido pela política. De família
tradicionalmente ligada ao comércio em Porto Alegre, havia sido um dos
animadores do Instituto de Estudos Empresariais (IEE), entidade classista
dedicada à divulgação do ideário liberal entre o empresariado local.
O primeiro encontro de Feijó e Onyx havia ocorrido
nos eventos do IEE, na década de 1980. "Conheço Onyx da época em que ele
era veterinário. Sempre gostou muito de política, leu muito. Tinha participação
destacada em nossas atividades", relembra Feijó.
As dificuldades na aliança PSDB-DEM começaram antes
da posse de Yeda. Em entrevista durante a campanha, Feijó defendeu a
privatização do Banco do Estado do Rio Grande do Sul (Banrisul), considerado
por ele um "cabide de empregos".
Impopular,
a tese desagradou ao comando da campanha. A crise agravou-se quando, já no
governo, Feijó gravou clandestinamente uma conversa com o então
secretário-chefe da Casa Civil, Cézar Busatto (PPS), no qual o colega admitia o
uso de estatais como fonte de financiamento ilegal de campanhas políticas. Além
de marcar o rompimento definitivo entre Feijó e a governadora, o caso paralisou
o governo.
Pressionado
pela cúpula do DEM (denominação adotada pelo antigo PFL em 2007) a expulsar
Feijó, Onyx ficou ao lado do pupilo. Em 2008, concorreu pela segunda vez à
prefeitura de Porto Alegre, esperando pelo menos repetir o resultado de 2004,
quando ficara em terceiro lugar, com 80.633 votos (9,97%). Acabou colhendo 38.803
votos (4,91%).
A
amizade com o ex-vice-governador perdurou. Em agosto, durante a Expointer,
maior feira agropecuária do país, em Esteio (RS), Feijó organizou um almoço
para recepcionar Bolsonaro no Country Club, em Porto Alegre. Compareceram cerca
de 200 empresários, além do candidato e de Onyx.
Da atividade sindical para a política - Filho do
veterinário Rheno Júlio Lorenzoni e da dona de casa Dalva Lorenzoni, Onyx
nasceu em 3 de outubro de 1954. No ano anterior, seu pai havia instalado uma
clínica para animais de todos os portes no porão de sua casa, no Menino Deus,
bairro de classe média de Porto Alegre.
Hoje, o Hospital Veterinário Lorenzoni é mantido
por Rodrigo Lorenzoni, filho de Onyx e da terceira geração de veterinários da
família. Formado
em Medicina Veterinária pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Onyx
presidiu o sindicato da categoria entre 1984 e 1990. Da atividade sindical,
passou à política.
No
início, militava no Partido Liberal (PL), pelo qual concorreu a uma vaga de
deputado estadual em 1994, numa coligação com o PFL. Obteve uma primeira
suplência, mas, quando o veterano pefelista Germano Bonow foi convidado pelo
então governador Antonio Britto (PMDB) a comandar a Secretaria Estadual de
Saúde, assumiu a vaga.
A
partir de 1999, Onyx passou a compor a bancada oposicionista ao governo do
petista Olívio Dutra. A experiência marcaria sua atividade para sempre.
"Cheguei à Câmara em 2003, vindo da Assembleia Legislativa do Rio Grande
do Sul, onde vivenciei como oposição a primeira experiência petista de um
governo estadual", afirmou em discurso na Câmara em fevereiro. Em
2016, Onyx foi um dos 367 deputados a votar favoravelmente ao relatório que
propunha o impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Caixa 2 - Onyx
foi um dos parlamentares mencionados na delação premiada do ex-diretor da
Odebrecht Alexandrino Alencar, no âmbito das investigações da Operação Lava
Jato, como destinatário de contribuições de campanha em caixa 2. Segundo
Alexandrino, Onyx teria recebido R$ 175 mil por meio de doação ilegal.
"Eu
percebi que, dentro do escopo político, o senhor Onyx Lorenzoni era uma pessoa
importante, era um jovem impulsivo, lutador, que precisávamos mantê-lo
próximo", disse Alexandrino. A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu
abertura de inquérito para apurar falsidade ideológica eleitoral por parte de
Onyx.
Uma
perícia apresentada pela defesa do deputado ao Supremo Tribunal Federal (STF)
sustentou que a principal prova contra ele - uma planilha na qual era
identificado pelo codinome "inimigo" - teria sido fraudada.
A
procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu o arquivamento do inquérito
em razão do fato de que "diligências realizadas não foram suficientes para
elucidar a materialidade do suposto crime". A solicitação foi acolhida
pelo ministro do STF Luiz Fux em junho deste ano.
Em
maio de 2017, Onyx foi um dos políticos citados em delação premiada pelo
diretor da empresa JBS Ricardo Saud como beneficiário de recursos em caixa 2.
De acordo com o executivo, o parlamentar teria recebido R$ 200 mil da empresa
em setembro de 2014, por intermédio do presidente da Associação Brasileira das
Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), Antônio Jorge Camardelli, ligado a
Onyx por uma amizade de 30 anos.
Em
entrevista à RBS TV, o deputado assumiu ter recebido o dinheiro, mas afirmou
que o valor teria sido inferior aos R$ 200 mil citados por Saud - na versão de
Onyx, foram R$ 100 mil - e argumentou que não teria como declarar a
contribuição à Justiça Eleitoral.
A
Procuradoria-Geral da República pediu ao STF que a parte da delação premiada da
JBS referente a caixa 2 de campanha, incluindo os recursos destinados a Onyx,
sejam desmembradas do processo. Não há inquérito aberto sobre o caso.
"Entre
carregar uma mancha que me macularia pela vida toda, eu resolvi ter uma
cicatriz. E a melhor forma é trabalhar com a verdade. Tanto é que eu tenho
tatuado aqui (mostra uma citação bíblica no braço direito): 'João, 8:32,
Conhecerás a verdade e a verdade vos libertará'", disse o deputado durante
a campanha eleitoral.
A
sentença do Novo Testamento costuma ser repetida por Bolsonaro como lema contra
a corrupção. Ao lado da frase, Onyx exibe outras duas tatuagens: um brasão do
Internacional e uma bandeira do Rio Grande do Sul.
Futuro político - A vitória de Bolsonaro deu margem
a especulações sobre o futuro político de Onyx, como uma eventual (e terceira)
candidatura à prefeitura de Porto Alegre em 2020. Apontado como um dos homens
fortes do governo Bolsonaro, Onyx chocou-se na última terça-feira (30) com Paulo
Guedes, guru econômico do presidente eleito.
Na véspera, o deputado havia descartado aceitar a
oferta do presidente Michel Temer de aprovar o projeto de reforma da
Previdência em tramitação no Congresso, qualificando-o de "remendo".
Questionado
sobre a declaração de Onyx, Guedes disse: "É um político falando de coisa
de economia. É a mesma coisa que eu sair falando coisa de política. Não dá
certo, né?". Depois
de reunião com Bolsonaro, Guedes recuou e concordou que haverá dificuldades
políticas para aprovar a reforma este ano. (BBC)


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