O plenário do Senado aprovou, no começo da noite desta quarta-feira, um
aumento de 16,3% nos salários dos ministros do STF. Com o aumento, os salários
dos ministros passarão dos atuais R$ 33,7 mil para R$ 39,3 mil.
O aumento
foi pedido pelos próprios ministros do
Supremo Tribunal Federal(STF), que decidiram incluir no Orçamento de
2019 uma autorização para o reajuste
salarial em 2019. Em agosto, o presidente Michel Temer fechou
um acordo com os ministros em troca do fim do auxílio-moradia.
Os
salários do STF servem de parâmetro para os demais cargos do Judiciário. Por
isto, o aumento custará ao menos R$ 1,7 bilhão para a União no ano que vem,
segundo uma nota técnica divulgada nesta quarta-feira pela Consultoria de
Orçamento do Senado. Nos Estados, o impacto deve ser ainda maior.
O ministro
Ricardo Lewandowski, autor de um dos votos favoráveis à medida, chegou a dizer
que o reajuste era "modestíssimo". Se comparados com os vencimentos
de juízes em outros países, porém, os contracheques do Judiciário brasileiro
estão longe de ser modestos.
Um estudo de 2016 da Comissão Europeia para a Eficiência
da Justiça (Cepej, na sigla em francês) mostra que, em 2014, um juiz da Suprema
Corte dos países do bloco ganhava 4,5 vezes mais que a renda média de um
trabalhador europeu. No Brasil, a realidade do salário do STF é ainda mais
distante da média da população: o salário-base de R$ 33,7 mil do Supremo
Tribunal Federal corresponde a 16 vezes a renda média de um trabalhador do país
(que era de R$ 2.154 no fim de 2017).
Em 2014, um magistrado da Suprema Corte de um país da
União Europeia recebia, em média, 65,7 mil euros por ano. Ao câmbio de hoje, o
valor equivaleria a cerca de R$ 287 mil - ou R$ 23,9 mil mensais.
Segundo a
última edição do relatório Justiça em Números, produzido pelo Conselho Nacional
de Justiça (CNJ), o Brasil tem hoje cerca de 18 mil magistrados (juízes,
desembargadores, ministros). Eles custam cada um, em média, R$ 47,7 mil por mês
- incluindo salários, benefícios e auxílios.
Os ganhos dos demais magistrados (juízes e
desembargadores) em todo o país estão vinculados aos rendimentos dos ministros
do STF. No caso da magistratura, o aumento é automático - o reajuste para os
ministros é repassado para todos os demais.
Além disso, os salários dos ministros também estabelecem
o chamado Teto Constitucional, que é o valor máximo que pode ser recebido pelos
servidores dos três poderes (Judiciário, Legislativo e Executivo). Se o valor
do teto sobe, há a possibilidade de outras carreiras, fora do judiciário,
pedirem aumento também. Mas, neste caso, o aumento não é automático.
"O
efeito é chamado vinculativo, porque a Constituição determina que que o
subsídio dos ministros dos tribunais superiores (STM, STF, STJ, TSE etc) seja
de 95% do subsídio do STF, e o mesmo ocorre com outras categorias. Este aumento
é automático, e é a isto que se chama de 'efeito cascata'. Há uma hierarquia
clara", diz a advogada constitucionalista Vera Chemim.
Nos Tribunais de Justiça dos Estados, o vencimento dos
desembargadores é, teoricamente, de 90,2% daquele dos ministros do STF, ou R$
30,4 mil. Em alguns Estados, o aumento é automático. Em outros, depende de
autorização em lei local.
Há ainda uma outra forma pela qual o reajuste do STF
impacta as contas públicas: em várias carreiras, há servidores que ganham mais
que o teto constitucional. Seus salários sofrem o chamado "abate
teto". Se o teto aumentar, os salários também sobem.
O que acontece agora? - A proposta
orçamentária do Supremo Tribunal Federal será enviada pelo tribunal ao
Ministério do Planejamento (MPOG), a quem cabe reunir os estudos enviados pelos
diversos órgãos. No dia 30 de agosto, o Planejamento enviará o projeto para a
Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso Nacional, que analisará o tema e
o levará a votação. Se aprovado, os ministros do STF poderão se conceder o
aumento em 2019.
A reunião
desta quarta-feira aconteceu no gabinete da ministra Cármen Lúcia. Ela própria
era contrária à inclusão do reajuste, e votou contra o aumento. Também ficaram
contra os ministros Celso de Mello, Rosa Weber e Edson Fachin. Ficaram
favoráveis ao aumento os ministros Luís Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski,
Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Marco Aurélio, Luiz Fux e Alexandre de Moraes.
O
orçamento de 2019 será feito segundo a regra estabelecida pela chamada PEC do
Teto - ou seja, as despesas não podem crescer mais que a inflação do ano
anterior. No caso do STF, estima-se que os R$ 2,7 milhões a mais gastos com
salários poderão ser cortados de outras áreas - como a TV Justiça, por exemplo.
Mas ninguém sabe se o mesmo poderá ser feito nos demais tribunais.
"Para várias carreiras, o teto virou quase que o
piso. Haverá efeito cascata no judiciário estadual, em carreiras do Executivo,
e tudo isso deverá ser levado em consideração na peça orçamentária. Há que se
lembrar que o país está acumulando déficits e aumentando sua dívida há cinco
anos", diz à BBC News Brasil deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), que será
o relator da área de Judiciário no Orçamento de 2019.
O professor da UnB e especialista em administração
pública José Matias-Pereira lembra que não há mágica no Orçamento. "Para
conceder aumentos ou reajustes de salários, é preciso encontrar recursos para
garantir esse reajuste. E na verdade há dois caminhos (se não houver como
remanejar dentro do próprio órgão): ou retira-se dinheiro dos investimentos e
de outras áreas, ou aumenta-se imposto", diz ele.
"O
que causa preocupação é que estamos em ano eleitoral. O próximo presidente vai
encontrar um cenário fiscal difícil, que exigirá num primeiro momento medidas
de austeridade. Veremos o governo, ao mesmo em que exige que a sociedade aperte
o cinto de um lado, concedendo reajuste para servidores do outro", diz
ele.
No STF, porém, prevaleceu a argumentação de que os
magistrados estão sem reajuste há quatro anos - o último reajuste foi em 2014,
quando o teto constitucional passou de R$ 29,4 mil para os R$ 33,7 mil atuais.
Em fevereiro deste ano, várias entidades representativas
como a Associação dos Juízes Federais (Ajufe) e a Associação dos Magistrados
Brasileiros (AMB) formularam uma carta à presidente do STF, Cármen Lúcia,
pedindo o reajuste. A argumentação era de que a inflação acumulada desde o
último reajuste é de cerca de 40% - o que estaria corroendo os salários dos
profissionais.
Brasil gasta mais com Judiciário que países ricos - Os dados
mais recentes da Comissão Europeia para a Eficiência da Justiça (Cepej) mostram
que o Brasil não só paga a seus juízes mais que países europeus, mas o poder
judiciário brasileiro também é mais caro que o destes países, considerando o
tamanho das nossas economias.
De acordo
com um levantamento de 2017 da entidade, em nenhum país europeu o gasto com o
judiciário ultrapassou 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2015. No Brasil,
o relatório Justiça em Números informa que, em 2016, o Judiciário consumiu o
equivalente a 1,4% do PIB do país - ou R$ 84,8 bilhões, em valores da época.
Desses R$
84 bilhões, quase tudo (89%) foi de gastos com pessoal, inclusive pensões e
aposentadorias. Em termos de custo por pessoa, os magistrados mais caros são os
da Justiça Federal, com um custo de R$ 50,8 mil por mês. (BBC)


Nenhum comentário:
Postar um comentário