Depois de uma semana marcada por protestos
contra o bloqueio de recursos na área de educação, indicadores ruins na
economia e a revelação da quebra de sigilo de Flávio Bolsonaro, o governo do
presidente Jair Bolsonaro terá de enfrentar questões decisivas nos próximos
dias.
Os testes para o Planalto acontecem enquanto ainda ecoa, nas
discussões de aliados e de opositores, a informação de que o presidente
distribuiu em grupos de WhatsApp um texto dizendo que o Brasil é
"ingovernável" e que o país "está disfuncional".
A mensagem repassada
por Bolsonaro, divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo na sexta-feira, 17,
também atinge o Congresso - onde estão os principais desafios do governo.
"Se não negocia
com o Congresso, é amador e não sabe fazer política. Se negocia, sucumbiu à velha
política", diz o texto. "A continuar tudo como está, as corporações
vão comandar o governo Bolsonaro na marra e aprovar o mínimo para que o Brasil
não quebre, apenas para continuarem mantendo seus privilégios."
Nesse contexto, a BBC News Brasil explica, em três pontos, os
principais desafios de Bolsonaro nos próximos dias.
1 - Negociações sobre a reforma da Previdência
Com a expectativa de que o relator da proposta de reforma da
Previdência na comissão especial da Câmara, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP),
apresente seu relatório na primeira quinzena de junho, a equipe econômica do
governo trabalha, nos últimos dias de maio, para evitar mudanças muito
profundas no texto original.
Moreira tem dito que
pretende encontrar alternativas para as regras de transição contidas na
proposta para aposentadorias e pensões. Ele se reuniu no domingo, 19, com o
secretário especial da Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, e técnicos da
área para discutir o tema.
Como uma eventual
mudança na transição pode reduzir a economia de mais de R$ 1 trilhão prevista
com a reforma, o relator pretende encontrar outras formas de compensar essa
redução. Ou seja, aumentar a arrecadação do governo nos próximos anos ou
diminuir as despesas previstas.
Nesta semana, a agenda
da comissão especial prevê audiências públicas para discutir pontos específicos
da proposta. Enquanto isso, integrantes do Executivo e da equipe do relator
seguem negociando as mudanças.
Como a reforma da
Previdência é considerada o grande desafio de Bolsonaro no Congresso e uma
medida necessária para colocar as contas públicas em dia, todos os passos têm
sido acompanhados de perto pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Há um grande receio de
que problemas na relação de Bolsonaro com o Congresso afetem a disposição dos
parlamentares de votar um tema tão impopular quanto a proposta que torna mais
rígidas as regras de aposentadoria e pensão.
A primeira manifestação
de Bolsonaro no Twitter nesta segunda-feira foi sobre o tema. "A Nova
Previdência é a porta de entrada para o progresso do Brasil. É com sua
aprovação que se viabilizam diversas outras ações econômicas benéficas para o
país, como a Reforma Tributária, que pretendemos apresentar logo após,
compreendendo ser um desejo urgente dos brasileiros", escreveu.
Bolsonaro depende de articulação no Congresso para conseguir aprovar a reforma da Previdência
2 - Medidas Provisórias no Congresso Nacional
Bem antes de a reforma da Previdência eventualmente chegar ao
plenário da Câmara, os deputados já têm em mãos outras medidas importantes para
o Executivo, o que desafia o governo Bolsonaro a organizar sua base de apoio no
Congresso.
Só nesta semana, a
Câmara tem oito medidas provisórias para analisar. A mais polêmica delas é a MP
870, que reorganiza a estrutura do governo e que diminuiu de 29 para 22 a
quantidade de ministérios. O ponto dela que gera discussão é, na verdade, o
Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
Originalmente, o texto
estabelecia que o Coaf estaria na estrutura do Ministério da Justiça e
Segurança Pública, mas durante a tramitação no Congresso foi feita alteração
para que órgão fique vinculado ao Ministério da Economia. Essa mudança foi uma
reação de parlamentares que avaliam que o ex-juiz Sergio Moro, ministro da
Justiça, teria ganhado poder excessivo com as alterações na Esplanada feitas
por Bolsonaro.
As medidas provisórias
entram em vigor quando são publicadas - por isso já foi possível diminuir a
quantidade de ministérios -, mas precisam de aprovação do Congresso para
continuar em vigor. Essa MP, por exemplo, perde a validade no início de junho e
precisa ser aprovada tanto pelo deputados quanto pelos senadores nas próximas
duas semanas para não caducar.
Entre as MPs a serem analisadas pela Câmara também está a que
autoriza até 100% de capital estrangeiro em companhias aéreas com sede no
Brasil, que perde a vigência já em 27 de maio e ainda é herança do governo
Michel Temer, mas considerada importante pela atual equipe econômica.
Tradicionalmente, os parlamentares usam as votações para dar recados
ao governo. Muitas vezes podem derrubar uma proposta ou emperrar a votação para
dar sinais de insatisfação com o Palácio do Planalto.
No Congresso, o governo
também corre o risco de ver o decreto que flexibiliza o porte de armas no
Brasil ser suspenso. Um parecer da Câmara aponta que a ampliação do porte de
armas feita por decreto de Bolsonaro é ilegal e, no Senado, outro parecer diz
que o presidente extrapolou seus poderes no decreto.
3 - Efeito das manifestações pró-Bolsonaro
A convocação de
apoiadores de Bolsonaro para atos em defesa do governo no próximo domingo, 26,
também deixa dúvidas sobre os possíveis efeitos dessas manifestações, além de
uma apreensão em relação ao tamanho da adesão e do tom das mensagens que serão
transmitidas nas ruas.
Depois dos protestos
contra os cortes na Educação, ainda não está claro como esses atos favoráveis
ao presidente poderiam ser explorados pelo Planalto e até que ponto podem ser
interpretadas de uma forma ruim pelos parlamentares.
O que torna o cenário
mais delicado no que diz respeito à relação com outros políticos é exatamente a
mensagem repassada pelo próprio presidente na semana passada, que diz que os
interesses de corporações estão por trás do que acontece no país e que afirma
que o Brasil nunca foi "governado de acordo com o interesse dos eleitores".
Em entrevista à BBC
News Brasil, a deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP), uma das autoras do
pedido de impeachment de Dilma Rousseff (PT), disse que "Bolsonaro ainda não
entendeu que seus atos são considerados importantes".
"Ele precisa,
urgentemente, trocar seus assessores diretos. As pessoas que o cercam alimentam
a visão conspiratória que o está afundando", afirmou a deputada.
(Fonte. BBC)
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