O documento final do Sínodo dos Bispos sobre a Amazônia, que terminou neste sábado (26), diz que
a defesa da Amazônia depende de uma verdadeira “conversão ecológica e
cultural”, passando pelo combate ao “pecado ecológico”.
Embora o Papa Francisco já tivesse mencionado a “conversão ecológica” em
sua encíclica “Laudato Si’”, de 2015, o conceito de “pecado ecológico” foi
elaborado durante o Sínodo: propõe-se que o desrespeito à natureza seja visto
como uma nova forma de pecado, por representar um desrespeito ao “Criador”, ou
seja, Deus, e à sua obra, que são o planeta Terra e todos seres.
Entre os temas mais polêmicos, o Sínodo também propõe a ordenação de
homens casados, em alguns casos, para suprir a falta de padres na Amazônia. Os
participantes do encontro pedem para participar da discussão sobre o diaconato
feminino na Igreja com suas experiências.
O diácono é um ministro dedicado ao serviço na Igreja e está um grau
abaixo de um padre (não pode celebrar missas, ouvir confissões nem ungir os
enfermos). Atualmente, só homens podem ser diáconos, mas há evidências de que
mulheres realizaram serviços parecidos no passado.
As resoluções do Sínodo não são definitivas, mas apenas propostas
entregues ao Papa após um debate que durou três semanas, no Vaticano.
Participaram cerca de 250 pessoas, entre bispos, padres, religiosas, líderes
indígenas, membros de outros grupos religiosos e especialistas nos temas da
Amazônia. Cabe, agora, ao Papa decidir o que fazer a partir daí.
O texto final do Sínodo sobre a Amazônia foi votado por 181
participantes que têm direito a voto, os chamados “padres sinodais”. Durante a
votação do documento, todos os parágrafos receberam maioria de dois terços de
aprovação. Os que causaram mais discórdia foram justamente os parágrafos que
tratam dos padres casados e das mulheres diaconisas.
Entre os pontos mais importantes do documento final estão:
- O conceito de “pecado ecológico” como uma “ação ou omissão contra Deus,
contra o próximo, a comunidade e o ambiente” e o chamado à conversão e o
cuidado da “casa comum”, isto é, o planeta Terra.
- Para isso, é preciso promover uma “ecologia integral como único caminho
possível”. A ideia é não separar as questões ecológicas dos problemas sociais.
- Proposta de criação de um observatório da Igreja para denunciar
problemas ambientais e sociais, promovendo a “defesa da vida” e “defendendo os
direitos dos mais vulneráveis”.
- Pedido de maior mobilização da comunidade internacional para destinar
recursos econômicos para a proteção da floresta e para a promoção de “um modelo
de desenvolvimento justo e solidário” na Amazônia.
- O texto faz fortes denúncias dos crimes contra os direitos humanos na
Amazônia, dizendo que há “impunidade na região com relação a violações” desses
direitos e “obstáculos para obter justiça”.
- Proposta de ordenação de homens casados nas zonas remotas da Amazônia
para suprir a falta de padres. O texto diz que algumas regiões passam meses e
anos sem a missa. Embora continuem “apreciando o celibato como dom de Deus”, os
bispos do Sínodo propõem “ordenar homens idôneos e reconhecidos da comunidade”
que já sejam diáconos permanentes, mesmo que tenham uma família.
- Há menção sobre o reconhecimento do “papel fundamental das mulheres” nas
comunidades da Amazônia e um pedido para que líderes da região possam
participar da discussão sobre a implantação do diaconato feminino.
O pecado ecológico - Segundo o cardeal Michael Czerny, um dos autores do documento, “as
queimadas na Amazônia fizeram muita gente perceber que as coisas precisam
mudar” na região. Por isso, “a palavra conversão é forte para falarmos de
mudanças necessárias”. Todo o texto é delineado com essa palavra, em quatro
eixos que apresentam “novos caminhos” para a Amazônia: pastoral, cultural,
ecológico e sinodal.
O texto final do Sínodo propõe a seguinte definição para o “pecado
ecológico”: “uma ação ou omissão contra Deus, contra o próximo, a comunidade e
o ambiente”. Diz, ainda, que se trata de um “pecado contra as futuras
gerações”. A forma de praticar esse pecado seria a contaminação e a destruição
do meio ambiente.
Nesse sentido, os participantes do Sínodo pedem a criação de “ministérios
especiais” para o cuidado do meio ambiente na Igreja. Seriam pessoas da Igreja
com funções como cuidar do território e da água numa determinada região, além
de promover a formação ecológica dos outros.
“A crise ecológica é tão profunda que se não mudarmos, não vamos
conseguir sobreviver”, comentou o cardeal Czerny, na apresentação do documento.
“Na Amazônia, se as coisas não mudarem, será um lugar amaldiçoado. As pessoas
vão vir, levar tudo o que tem valor, e deixar só destruição. Vamos olhar para a
Amazônia e não deixá-la se tornar uma maldição”, afirmou o arcebispo canadense.
Padres casados - Durante as três semanas do Sínodo ficou evidente que a falta de padres é
uma grande preocupação da maioria dos bispos da Amazônia. Eles divergiram, no
entanto, sobre as ideias de como suprir essa carência.
A proposta de ordenar homens casados de boa reputação, os chamados “viri
probati”, ganhou força ao longo dos dias. Mesmo sendo um dos parágrafos que
receberam menos votos de aprovação (128 a favor e 41 conta), o número 111 do
texto acabou passando. Eram precisos 120 votos.
Nessa redação final, fala-se mais precisamente da elevação dos diáconos
permanentes ao nível de padres. Os diáconos são homens já ordenados, mas apenas
em primeiro grau. Sua função é realizar serviços nas comunidades. Podem
presidir celebrações, mas não missas. Não podem ouvir confissões nem ungir os
enfermos.
Como já existem padres casados no Oriente – e também os padres
anglicanos que se convertem ao Catolicismo podem continuar casados – os bispos
propuseram isso para a Amazônia.
O documento afirma que não se trata de extinguir o celibato dos padres –
a regra que prevalece no Ocidente – mas, ainda assim, abrir a Igreja para a
“ordenação de homens idôneos e reconhecidos da comunidade”, com formação
adequada.
O texto sinaliza, também, que não houve acordo sobre propor essa mudança
para toda a Igreja, além da Amazônia. Alguns participantes do Sínodo pedem que
essa abertura mais ampla.
Diaconato feminino - A pedido de um grupo de freiras, em 2016, o Papa Francisco chegou a
criar uma comissão no Vaticano para estudar o diaconato feminino na história da
Igreja. A ideia era compreender como isso funcionava no passado, pois mesmo que
usassem o nome “diaconisas”, nem sempre eram o equivalente aos diáconos homens.
A palavra “diakonia” quer dizer serviço, em grego.
Essa comissão terminou seu trabalho em dezembro de 2018 sem chegar a um
consenso sobre o que foi o diaconato feminino no passado. Desde então, o tema
ficou sem conclusão e o Papa deixou que os teólogos trabalhassem de forma
independente, sem a comissão.
Agora, os bispos da Amazônia pedem que esse debate seja retomado e, além
disso, querem fazer parte dele. O documento final aponta para consultas
realizadas antes do Sínodo em que “se reconheceu o papel fundamental das
mulheres religiosas e leigas na Igreja”. Nessas consultas, muitos pediram que
as mulheres possam ser diaconisas católicas.
“Por essa razão, o tema também esteve muito presente no Sínodo”, diz o
texto. Ainda que de forma sutil, o documento pede que essa possibilidade seja
levada a sério. “Gostaríamos de compartilhar nossas experiências e reflexões
com a Comissão e esperamos os seus resultados”, diz o texto.
No discurso de encerramento do Sínodo, Francisco prometeu reabrir a
comissão sobre as mulheres diaconisas.
Questão indígena e direitos humanos - O documento fala em ampliar a defesa dos povos indígenas da Amazônia,
“mediante a garantia legal e inviolável dos territórios que ocupam de forma
tradicional”. O Sínodo pede mais mecanismos de cooperação entre os estados,
especialmente nas fronteiras.
“Em todo momento, deve-se garantir o respeito a sua autodeterminação e à
sua livre decisão sobre o tipo de relações que queiram estabelecer com outros
grupos”, diz o texto, acrescentando que a ameaça está especialmente na
“ampliação das fronteiras extrativas de recursos naturais e no desenvolvimento
de megaprojetos de infraestrutura”.
Para fazer frente a essas ameaças, os padres sinodais propõem que a
Igreja crie uma nova instituição, um “observatório socioambiental pastoral”. A
ideia é fazer um “diagnóstico do território e de seus conflitos
socioambientais”, para que a Igreja saiba como se posicionar diante deles.
(Fonte: G1)
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