Os portugueses foram às
urnas pela terceira vez em três anos para escolher um novo Parlamento e um novo
governo.
A coalizão de centro-direita Alternativa Democrática (AD), do atual primeiro-ministro Luís Montenegro, foi a mais votada nas eleições gerais de Portugal neste domingo (18/5), com 32,7% dos votos, alcançando 89 deputados no Parlamento português.
O Chega (CH), da
direita radical, cresceu em relação à última votação e disputou cabeça a cabeça
o segundo lugar com o Partido Socialista (PS), de centro-esquerda.
As duas forças
políticas obtiveram o mesmo número de cadeiras no Parlamento: 58 deputados, mas
os socialistas receberam 23,4% dos votos e o Chega, 22,6%.
A votação ocorre
depois que o premiê Luis Montenegro, da Aliança Democrática, de
centro-direita, perdeu um voto de confiança em março devido a
denúncias envolvendo seus negócios familiares — provocando a dissolução do
Parlamento e a convocação de nova eleição.
Montenegro nega
qualquer irregularidade e está liderando a Aliança Democrática nas eleições.
A economia foi um
dos temas centrais da eleição — já que a média salarial de Portugal é de cerca
de 2 mil euros (R$ 12 mil) por mês, bastante abaixo da média de 3.155 euros (R$
20 mil) da União Europeia. Isso tem provocado o fenômeno de "fuga de cérebros"
— com muitos portugueses com boa formação técnica deixando o país em busca de
melhores oportunidades no exterior.
Mas ao mesmo tempo,
Portugal vem enfrentando um aumento enorme no fluxo de imigrantes para o país —
o que gera conflitos culturais e ondas de resistência à imigração, inclusive
com episódios de xenofobia.
Cerca de 1,5 milhão
de estrangeiros residem em Portugal, aproximadamente o triplo do número de uma
década atrás e representando cerca de 14% da população total.
Entre 2015 e 2023,
sob o Partido Socialista, de esquerda — que nesta eleição é liderado pelo
economista Pedro Nuno Santos — Portugal teve um dos regimes migratórios mais
abertos da Europa.
O aumento de
chegada de imigrantes — do Brasil, mas também de países asiáticos — gerou um
sentimento anti-imigração e reforçou o partido Chega, que foi criado em 2019
defendendo ideais conservadores.
O partido já havia
recebido grande apoio nas eleições do ano passado e se consolidou como terceira
força eleitoral. Agora, passa a dividir o segundo lugar em tamanho no
Legislativo com o Partido Socialista.
Salto no número de brasileiros
Nos últimos anos,
Portugal viu saltar o número de brasileiros que residem no país.
Segundo dados da
pesquisa do Itamaraty com comunidades brasileiras no exterior, hoje há mais de
meio milhão de brasileiros morando em Portugal.
Isso faz de
Portugal o segundo país com a maior comunidade brasileira no mundo, atrás só
dos Estados Unidos, que têm mais de 2 milhões de brasileiros. Ainda assim,
Portugal possui quase o dobro da quantidade de brasileiros do Reino Unido, o
segundo país europeu com mais brasileiros.
O que chama a
atenção é que apenas em quatro anos — entre 2020 e 2023 — o número de
brasileiros em Portugal cresceu 85%. O número de brasileiros em Portugal foi de
276 mil em 2020, no começo da pandemia, para 513 mil em 2023.
Em outros países
com grandes comunidades de brasileiros — como Espanha e Reino Unido —, houve um
crescimento inferior a 10% no tamanho da comunidade brasileira.
Portugal atrai brasileiros pelo clima,
maior segurança, uma moeda mais forte (o euro), o idioma em comum e a também
facilidade burocrática — já que existem muitos protocolos para validação de
diplomas brasileiros, por exemplo.
Uma pesquisa do
site LinkedIn do ano passado mostrou que Portugal é o segundo destino mais
escolhido por brasileiros que procuram trabalho fora do país, atrás apenas dos
EUA.
Especialistas apontam
que essa migração acontece em várias camadas sociais: desde entre quem busca de
empregos de mais baixa renda — como na construção civil — até profissionais
especializados — em setores de tecnologia, medicina ou advocacia.
E não são só os
brasileiros. Nesta década, também cresceu muito em Portugal o número de
imigrantes da Ásia — como Índia, Paquistão, Bangladesh e Nepal. Para eles, a
integração vem sendo ainda mais difícil — por não falarem português.
Os brasileiros
também tiveram impacto na eleição na condição de eleitores. Não é preciso ser
cidadão português para votar. Brasileiros que têm residência legal em Portugal
há mais de 2 anos podem votar nas eleições.
Atritos
A principal voz
contra imigração no país é a de André Ventura, líder do partido da direita
radical Chega. Em apenas seis anos de existência, o Chega virou uma força
política levantando a bandeira do conservadorismo.
Em 2022, foi o
terceiro partido mais votado de Portugal. Agora, passa a ser a segunda maior
força no Parlamento, junto com o Partido Socialista. Recentemente, André
Ventura postou uma imagem dele próprio vestido de piloto de avião junto com um
bilhete que dizia querer mandar imigrantes pra um destino: "Longe".
Mas apesar da
retórica anti-imigração, Ventura não costuma falar diretamente sobre
brasileiros. Pois na base de eleitores do Chega estão muitos brasileiros que
fazem campanha pelo partido.
Ventura é apoiado pelo ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro, com quem fez até uma live. E já liderou protestos contra o presidente Lula no Parlamento português. A principal mensagem do Chega é contra imigrantes irregulares, sobretudo asiáticos que não falam a língua portuguesa.
A imigração também
virou tema importante na campanha de Luis Montenegro, o primeiro-ministro que
renunciou ao cargo.
Em visita ao
Brasil, Montenegro disse que queria recrutar professores brasileiros para
trabalharem no ensino básico português, em uma aparente sinalização de simpatia
à imigração. Mas em maio, o governo de Portugal anunciou que notificaria 18 mil
imigrantes em situação ilegal para que deixem o país.
Esses são
imigrantes que tiveram seus pedidos de residência negados pelo governo
português. Acredita-se que a maioria sejam brasileiros. E isso provocou uma
reação política. Montenegro foi acusado pela oposição de populismo eleitoral —
ou seja, de anunciar deportações em um momento em que o seu partido disputa
votos com a direita radical.
O governo de
Portugal negou que tenha tomado a decisão de olho na eleição.
Já o candidato do
Partido Socialista, Pedro Nuno Santos, fez uma campanha pregando o fim do
discurso de ódio contra imigrantes, e também defendendo que imigrantes façam
mais para se adaptar à cultura portuguesa. Mas também reconheceu que seu
partido não conseguiu criar um sistema de imigração eficiente quando esteve no
poder.
'Guiana brasileira'
Uma pesquisa
recente apontou que 68% dos portugueses considera "muito permissiva"
a política migratória do país. E 75% defendem uma entrada, entre aspas,
"mais regulada" de migrantes. Só que, num país que envelhece a ritmo
acelerado, os imigrantes têm tido um papel importante em renovar a população:
quase um em cada quatro nascimentos em Portugal em 2022 foi de bebês de mães
estrangeiras.
Em paralelo, a
grande presença de brasileiros em Portugal provoca debates sociais.
Alguns são
encaradas como brincadeiras entre portugueses e brasileiros — que dividem um
passado e uma história em comum. Um exemplo é que o português de Portugal tem
cada vez mais palavras tipicamente brasileiras, como "dica",
"grama" ou "geladeira".
É o que os portugueses chamam de "brasileirismo".
Mas nem tudo é tão
ameno.
No final de 2024,
pelas redes sociais, alguns brasileiros começaram a chamar Portugal de
"Guiana Brasileira" — uma sugestão jocosa de que Portugal estaria se
tornando uma espécie de território brasileiro , assim como a Guiana Francesa é
um território da França. Alguns portugueses encararam isso como uma ofensa.
No TikTok,
brasileiros fizeram vídeos satíricos tratando Portugal como o mais novo Estado
brasileiro.
Recentemente uma
foto viralizou em Portugal e no Brasil de um supermercado português que convida
os clientes brasileiros a pagarem com PIX.
O jornal português
O Público noticiou que o PIX já se popularizou como meio de pagamento em lojas
portuguesas, aceito por grandes redes de varejo — basta que o cliente tenha uma
conta de banco no Brasil.
(Fonte: BBC)
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